Trilha de obstáculos
Fundos imobiliários saem em busca de ajustes na regulamentação, de um sistema mais eficiente de distribuição e de um investidor disposto a ousar

, Trilha de obstáculos, Capital AbertoOs administradores de fundos de investimentos imobiliários encontram barreiras de proporções razoáveis para se desenvolver e ganhar mercado. Precisam arregaçar as mangas e ir à luta para mudar a regulamentação a seu favor, ganhar o apoio dos bancos para formação de uma rede mais ampla de distribuição das cotas e ainda vencer a falta de conhecimento e de interesse por parte de investidores institucionais, ainda pouco entusiasmados com fundos imobiliários.

Parte desse trabalho começou no início deste ano, quando uma comissão formada por 12 membros da Soma (administradora de mercado de balcão organizado), Bovespa, Associação Nacional dos Bancos de Investimento e Desenvolvimento (Anbid) e gestores de fundos encaminhou à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) um conjunto de propostas para reformulação das normas aplicáveis aos fundos imobiliários. Segundo Rodrigo Machado, relator da comissão e diretor do Banco Ourinvest, o pleito visa tirar amarras que limitam o funcionamento do mercado para esses fundos.

Uma das propostas apresentadas é a criação de FAQs para fundos imobiliários – fundos de aplicações em cotas de outros fundos. Da forma como está regulamentado hoje, esse tipo de fundo só pode aplicar recursos diretamente em empreendimentos imobiliários. Para os participantes do mercado, a mudança proporcionaria a diversificação esperada pelo investidor de imóveis e atrairia o interesse de administradores de recursos de bancos privados, principalmente os estrangeiros.

A comissão pediu também mais flexibilidade para as emissões primárias de cotas. Como os prazos de avaliação na CVM são demorados, eles sugerem a dispensa do registro de oferta pública para emissões de até 10% do capital do fundo e que tenham por objetivo melhorias nos empreendimentos da carteira. A mudança, defende Machado, traria mais agilidade e menos custos para o fundo. Hoje, para emitir novas cotas, eles gastam 3% do valor da operação com taxa de fiscalização e ainda têm custo de publicação da convocação de assembléia em jornais e de elaboração do prospecto.

Algumas propostas de aprimoramento da instrução foram enviadas à CVM já em 2001. Chegaram a passar pelo corpo técnico da autarquia e depois pelo colegiado, mas não foram adiante. Este ano o esforço foi reforçado e o mercado aguarda ansioso uma resposta da comissão. Uma parte do que os fundos pediam já foi atendida. Há cerca de três de meses, a autarquia publicou a Instrução 389, que agiliza a ida de fundos imobiliários para o mercado de balcão organizado. Antes da alteração na instrução, os fundos precisavam da aprovação de cotistas representantes de mais de 50% das cotas do fundo para listarem cotas na Soma. Agora, com a mudança, passa a ser necessária apenas a aprovação por maioria simples de cotistas.

O superintendente de registros da CVM, Carlos Alberto Rebello, reconhece que a atual instrução, criada em 1994, engessou a atuação dos fundos nos últimos anos. Mas afirma que a autarquia preferiu ter cautela a fim de preservar a integridade dos investimentos. Rebello lembra da tentativa fracassada de criação do fundo do Centro de Convenções Anhembi, em que, apesar do final indesejado, os direitos dos investidores foram respeitados. Estruturado para captar R$ 180 milhões em uma emissão única, o fundo conseguiu obter apenas R$ 55 milhões. Pelo regulamento dos fundos imobiliários, se a captação não ocorrer no prazo determinado, o dinheiro deve ser devolvido com as correções devidas ao investidor. No caso do Anhembi, os recursos renderam CDI mais 3%.

Soma terá fundo de direitos creditórios voltado a projetos sociais


Está prevista para janeiro de 2004 a primeira listagem de cotas de um fundo de direitos creditórios na Sociedade Operadora do Mercado de Acesso (Soma). O fundo é parte de um projeto inédito da Caixa Econômica Federal (CEF) para financiar um empreendimento de caráter social composto de imóveis habitacionais, lojas, supermercado, escola e posto de saúde. Com o nome provisório de Projeto Itaquera, o empreendimento estará situado em uma área de 110 mil metros quadrados, ao lado do metrô Itaquera, na capital paulista.

O projeto e o fundo que irá financiá-lo fazem parte do Programa de Incentivo à Implementação de Projetos Sociais (Pips), lançado em junho pelo Governo Federal. O programa prevê a construção de sistemas habitacionais completos com infra-estrutura de moradia, lazer e prestação de serviços dedicada à população de classe média e baixa e financiada por recursos obtidos com o lançamento de cotas de fundos imobiliários ou fundos de recebíveis.

O lançamento da carteira de recebíveis que financiará o Projeto Itaquera está previsto para outubro. As cotas do fundo serão lastreadas nas 240 pres-tações mensais (20 anos) a serem pagas pelos mutuários que adquirirem unidades habitacionais e comerciais. Aos mutuários que adquirirem imóveis residenciais, o modelo de fundo de recebíveis permite o pagamento das parcelas apenas após a entrega das chaves. “Essa facilidade diminui o risco do empreendimento“, explica Wilson Risolia, vice-presidente da área de administração de recursos da CEF.

Para desenvolver um projeto no âmbito do Pips, como fez a Caixa Econômica, os bancos interessados devem participar de um leilão. Ao vencedor, é conce-dido um empréstimo do Tesouro Nacional, equivalente a 30% do valor do fundo, para que o banco possa também ser um cotista do fundo. A prefeitura do município em que for realizado o empreendimento também pode investir, integralizando cotas com a cessão de terrenos. A CEF planeja repetir com o fundo de recebíveis do Projeto Itaquera o sucesso de vendas obtido com as cotas do fundo imobiliário Almirante Barroso. A venda foi uma das maiores ações de pulverização de um fundo já feita no Brasil. Com patrimônio de quase R$ 100 milhões, o imóvel comercial situado no Rio de Janeiro foi vendido em cotas de R$ 1 mil, para 5,2 mil pessoas. Para viabilizar a distribuição pulverizada do fundo do Projeto Itaquera, contudo, a CEF precisa de uma mudança na Instrução 356 da CVM, que hoje autoriza a colocação de cotas de fundos de recebíveis apenas entre investidores qualificados.


INVESTIDOR INDIVIDUAL AINDA É RETICENTE
– A falta de educação e cultura do investidor brasileiro para substituir a aplicação que faria na compra de um imóvel pelo investimento em cotas de um fundo de imóveis é outro obstáculo a ser superado pelos fundos imobiliários. Hoje, praticamente só o Estado de São Paulo tem investidores de fundos imobiliários. A memória também não ajuda. Há quem tenha se traumatizado com a superoferta de investimentos em flats e com a amarga baixa de rendimentos que a sucedeu. Rebello aposta, contudo, que o interesse do brasileiro pelas cotas de fundos é uma questão de tempo. “É só imaginar que os investimentos da população de classe média e alta em imóveis para alugar chegam a R$ 200 bilhões”, afirma.

O fundos imobiliários enfrentam ainda, além da concorrência com as taxas de juros, a falta de apoio para uma distribuição mais eficiente. Para Fábio Nogueira, da Brazilian Mortgages, a liquidez poderia ser resolvida, de certa forma, se os bancos entrassem no negócio. Bom exemplo é o da Caixa Econômica Federal, que apostou na venda das cotas do Edifício Almirante Barroso e atraiu cerca de 5,2 mil cotistas, praticamente a metade do total de cotistas de fundos imobiliários de varejo. Apesar de não ter engrenado, há quem acene sinais otimistas para o futuro. “Estamos de olho nos fundos imobiliários. Esse é um mercado em progresso”, afirma Renato Ventura, superintendente de negócios imobiliários do Unibanco.

SEM ESPAÇO NA CARTEIRA DE OUTROS FUNDOS – A má distribuição e seus efeitos negativos sobre a liquidez no mercado secundário acabam por afastar os gestores de fundos de investimentos. Mesmo a entrada de fundos na Soma e na Bovespa não foi suficiente para convencê-los a deixar o porto seguro dos títulos públicos. “O investidor de um FIF (Fundo de Investimento Financeiro) procura liquidez diária, enquanto o cotista de um fundo imobiliário busca segurança em imóveis. Estar na Bolsa ou na Soma não significa que o produto terá liquidez. Falta ainda volume para garantir agilidade e facilidade na negociação das cotas”, avalia o diretor da área institucional da Fator Administradora de Recursos, José Carlos Borja. “Para atrair o investidor acostumado aos fundos financeiros, as cotas dos FIIs deveriam pagar um prêmio em relação aos títulos públicos”, completa. Ricardo Machado, responsável pela área de vendas da Perimeter Asset Management, avalia que o fundo imobiliário interessa para investimentos de longo prazo e que, justamente por isso, prefere não os ter no portfólio. “O reduzido volume negociado prejudica o resgate das cotas quando necessário”, explica.

IMÓVEL SEM A PREOCUPAÇÃO DE ADMINISTRAR – Para alguns investidores individuais mais ousados, os fundos imobiliários inspiram a oportunidade de incrementar o retorno de seus investimentos sem a preocupação de administrar um imóvel. “O fundo monitora o aluguel dos imóveis e o investidor ganha ao passar a dedicar seu tempo para outras atividades”, afirma Nilton Fontoura, especialista em pesquisa de mercado e investidor de fundos imobiliários. Cerca de 7% da sua poupança está alocada em cotas de fundos imobiliários. O primeiro investimento foi o Fundo Hospital da Criança, em São Paulo. Hoje Fontoura tem frações dos fundos Europar, Água Branca (SP) e Rio Atlântica Hotel (RJ).

Embora os volumes negociados ainda sejam reduzidos, o mercado de fundos imobiliários vem em constante evolução nos últimos anos. Foram registradas emissões de cotas de R$ 145 milhões em 2000, R$ 682 milhões em 2001 e, no ano seguinte, R$ 1,1 bilhão. Existem 61 fundos imobiliários no País, com patrimônio líquido total de R$ 2 bilhões.


Para continuar lendo, cadastre-se!
E ganhe acesso gratuito
a 3 conteúdos mensalmente.


Ou assine a partir de R$ 34,40/mês!
Você terá acesso permanente
e ilimitado ao portal, além de descontos
especiais em cursos e webinars.


Você está lendo {{count_online}} de {{limit_online}} matérias gratuitas por mês

Você atingiu o limite de {{limit_online}} matérias gratuitas por mês.

Faça agora uma assinatura e tenha acesso ao melhor conteúdo sobre mercado de capitais


Ja é assinante? Clique aqui

mais
conteúdos

APROVEITE!

Adquira a Assinatura Superior por apenas R$ 0,90 no primeiro mês e tenha acesso ilimitado aos conteúdos no portal e no App.

Use o cupom 90centavos no carrinho.

A partir do 2º mês a parcela será de R$ 48,00.
Você pode cancelar a sua assinatura a qualquer momento.