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Solução à inglesa
O código de governança para investidores lançado no Reino Unido pode ser uma fonte de inspiração para o Brasil?

, Solução à inglesa, Capital Aberto

O Reino Unido se consagrou como um centro de referência em governança corporativa. Seus reguladores, responsáveis pelo mais respeitado código de melhores práticas do mundo, o Combined Code, são reconhecidos por tratar o tema com um viés moderno e inovador. Agora, a principal preocupação dos britânicos não parece ser tanto a governança das empresas, mas sim a dos investidores. No início de julho, logo após o lançamento da mais nova versão do Combined Code, batizada de UK Corporate Governance Code, o Financial Reporting Council (FRC) divulgou o Stewardship Code, um código voltado a tornar mais diligente e transparente a gestão de recursos de terceiros.

Norteado por princípios, o Stewardship Code segue o modelo do pratique ou explique (comply or explain). Ou seja, aqueles que adotarem o código não precisarão seguir todas as suas práticas, desde que justifiquem o não cumprimento. A meta é incentivar os investidores institucionais a darem mais ênfase a questões qualitativas das companhias investidas, em detrimento das métricas quantitativas que podem privilegiar o retorno de curto prazo.

Uma das principais recomendações do código diz respeito à elaboração e à divulgação de uma política sobre voto. O incentivo é para que os investidores institucionais sempre participem das assembleias das companhias em que alocam recursos, em vez de apoiar automaticamente as propostas da administração. O código sugere que os gestores deem orientações claras de como e quando irão intervir mais fortemente na empresa investida para proteger e criar valor aos acionistas.

Caso a administração da companhia não escute com a devida atenção os pedidos dos investidores, devem ser tomadas medidas mais severas. Por exemplo, requisitar uma reunião com o presidente da empresa e todos os diretores e, se necessário, solicitar a realização de uma assembleia extraordinária, propondo a mudança dos membros do conselho, diz o código. A tese do FRC é a de que ter uma pequena participação acionária não é razão suficiente para deixar de questionar uma companhia. Sua pretensão é tornar o Stewardship Code um modelo de conduta para gestores de recursos em todo o mundo.

QUESTÃO ESTRUTURAL — No trabalho intitulado Why Stewardship is proving elusive for institutional investors, publicado no mês passado, Simon Wong, professor-adjunto da Northwesterns University School of Law, analisa o perfil atual dos investidores institucionais e explica por que é tão difícil estimular a participação ativa desses profissionais. Além do uso constante de métricas que promovem o giro rápido das carteiras e a busca por retornos de curto prazo, Wong aponta o uso excessivo de intermediários — numa ponta a companhia investida; na outra, um fundo de pensão; e no meio, consultores de investimentos, fundos de fundos e gestores de recursos. Assim, o investidor se distancia não apenas da empresa, mas também da noção de que é um de seus proprietários.

Em alguns pontos, o código da Anbima é mais restritivo que o inglês. O voto, por exemplo, é obrigatório nas matérias relevantes

Boa parte da análise de Wong baseia-se no fato de investidores institucionais, especialmente os fundos de pensão, manterem carteiras de ações extremamente diversificadas. Segundo o autor, um grande fundo norte-americano possui ações de cerca de 5 mil companhias. Um fundo britânico, mais de 700 empresas. No estudo, ele faz algumas sugestões para estimular a participação dos investidores nas assembleias. Começa pela eliminação da intermediação, passa pelo uso de métricas de retorno baseadas no longo prazo (inclusive para cálculos da taxa de performance) e recomenda ainda a diminuição dos ativos em carteira e a valorização das equipes internas de gestão. “Embora nem todos tenham de ser engajados, a redução de barreiras estruturais tornará mais fácil e natural o exercício de um papel ativo por parte de acionistas e gestores”, assegura o professor.

SOLUÇÕES EFICAZES? — Consultados pela CAPITAL ABERTO, gestores brasileiros discordaram de alguns princípios do código. Eles não viram sentido, por exemplo, em atribuir ao investidor o papel de intervir na empresa sempre que discordar de uma proposta da administração. Afinal, um acionista insatisfeito tem a opção de reduzir a exposição ao ativo, se desfazer da aplicação ou, simplesmente, votar contra. Além disso, em alguns casos essa intervenção poderia não ser benéfica para a empresa como um todo — mas apenas para a estratégia do fundo.

“O compromisso da companhia é de longo prazo e com toda a sua base de acionistas. Já o interesse do investidor, mesmo que com uma participação relevante, nem sempre é o melhor para a empresa”, observa Elsen Carvalho, sócio da gestora Investidor Profissional. Ele também levanta dúvidas sobre até que ponto o aumento do volume de informações reportadas ao cliente, conforme sugestão do código, criará um mercado mais transparente. “Informação boa é informação útil”, garante. Para ele, há boa intenção em se elevar a prestação de contas e se padronizar a forma como ela é apresentada, mas o excesso pode acabar sendo prejudicial. “No limite, informação demais pode ser um artifício para desviar a atenção do que realmente interessa.”

VOTO OBRIGATÓRIO — No Brasil, os gestores seguem as diretrizes do código de melhores práticas para fundos de investimentos da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), cuja versão atualizada também foi lançada no mês passado. Em alguns pontos, ele é até mais restritivo que o inglês. Requer, por exemplo, que os gestores votem em todas as matérias relevantes obrigatórias, tais como: situações que envolvam alterações nos direitos das ações e desdobramentos do papel; eleição de representantes de minoritários para o conselho de administração; aprovação de planos de opções para remuneração de administradores; e operações de aquisição, reorganização societária ou alteração de controle. “Mesmo que a estratégia do fundo seja passiva, o gestor com posição relevante deve participar de certas decisões”, defende Pedro Rudge, sócio da gestora Leblon Equities.

Isabella Saboya, sócia da gestora Jardim Botânico Investimentos, gostou do viés “pratique ou explique” do código inglês. “Achei interessante por ser flexível e não obrigar o investidor a ser ativista”, comenta. Em sua opinião, o modelo do “pratique ou explique” é mais adequado do que a imposição de regras pela autorregulação, como existe por aqui. “Voto obrigatório não é coisa de mercado desenvolvido”, afirma. A Anbima dá a prerrogativa de o gestor decidir se quer votar ou não em apenas quatro situações: quando há conflito de interesse; a informação disponibilizada pela companhia é insuficiente; o custo do exercício do voto é incompatível com a posição acionária; e a participação dos fundos sob gestão na companhia é inferior a 5% do capital (e nenhum fundo possui mais que 10%).

Questionada pela CAPITAL ABERTO, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) informou que não tem registros de falhas estruturais na governança dos investidores institucionais brasileiros. Os processos sancionadores julgados pela autarquia têm motivações distintas e não recorrentes, como atuação de gestores sem registro e eventuais desenquadramentos de carteira. Além disso, argumenta que parte dos problemas enfrentados por outras jurisdições já é evitada no Brasil com medidas como a regulação dos hedge funds e a obrigatoriedade de registro de todos os ativos negociados.


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