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Paradoxo de risco
Venture Capital enfrenta o vício da análise cartesiana aplicada a novos negócios

Dentre os diversos segmentos de produtos financeiros, a parte relacionada a investimento em empresas de capital fechado, ou Venture Capital, é a que se mostra mais arriscada e, ao mesmo tempo, mais cercada de oportunidades. Apesar de em países de primeiro mundo este mercado ser parte integrante da vida cotidiana de pessoas comuns, que dedicam parte de suas economias a investir em novas empresas, por aqui a crônica falta de conhecimento dos investidores inibe um crescimento mais acelerado do Venture Capital.

As dificuldades para se desenvolver um mercado ao mesmo tempo vasto e não explorado são enormes. Além do ciclo econômico complicado, marcado por inflação sem crescimento, taxas de juros reais altíssimas e a 6ª maior carga tributária do mundo, existem os aspectos culturais que envolvem empreendedores e investidores.

Do lado dos investidores, muitos deles profissionais do mercado financeiro, as discrepâncias na hora de analisar empresas e novos projetos são enormes. O viés analítico com que se costuma olhar para novas empresas é o primeiro paradoxo desta indústria. A história nos mostra que novas empresas não podem ser estudadas somente através de critérios parametrizados de produto, mercado, marketing e capacidade de vendas. Aí não se incluem questões básicas como a necessidade dos consumidores e a forma de suprí-las. Se o negócio é novo e não existe ainda um mercado sedimentado para ele, como decompor a análise e encontrar o mercado para estes produtos? Se dependesse de resposta para esta simples pergunta, o mercado de computadores pessoais nunca teria recebido investidores. Afinal, o que havia antes deles?

Clayton Christensen, de Harvard, coloca um desafio importante na análise de negócios inovadores: a empresa tem que responder de forma clara e direta às necessidades básicas dos seus clientes. Isto é, antes de entrar no mérito de mercado, marketing e vendas, deve-se identificar que problema o produto ou serviço oferecido resolverá para o cliente. Neste caso, a indústria dos computadores pessoais já teria uma chance. Mesmo toscos, os primeiros produtos tinham funcionalidades relativamente simples de serem descritas.

Entretanto, este tipo de flexibilidade não é normal. Ao contrário, foca-se no tamanho do mercado que a empresa irá atuar, no fato de ela ter ou não receitas recorrentes ou de existirem outras companhias exercendo atividade semelhante. Não tenho dúvidas em afirmar que, quando o investimento é feito visando o longo prazo, nenhuma destas questões é mais importante do que a sugerida por Christensen. Entretanto, acredito que a discussão acima dá mais ênfase ao efeito do que à causa.

Eu explico. Empresas bem geridas e com empreendedores preparados passam por estas questões da mesma forma que os investidores. Suas respostas, contudo, carregam uma variável de “timing” que muitos investidores, por terem um prazo fixo para rentabilizar seus investimentos, não consideram. Investidores costumam analisar de forma cartesiana e, por isto, não se preocupam se a empresa já está preparada para ter receita recorrente, por exemplo, ou se a equipe formada ao longo do tempo, independente dos concorrentes, fará o negócio se rentabilizar.

Quando existem concorrentes, o desajuste de visão fica ainda mais evidente. Em 1910, quase oito anos após Henry Ford ter criado sua linha de fabricação, havia mais de 10.000 montadoras de carros em sua cidade. Nem por isto a Ford foi eliminada. A genialidade de Henry suplantou os concorrentes um a um, transformando sua empresa na maior montadora de automóveis do planeta. Pode-se argumentar que, naquela época, era diferente. Concordo. Era muito pior do que hoje, porque empresários não tinham acesso à quantidade de informações disponíveis hoje sobre mercado, concorrentes e modelos de gestão.

Apesar das adequações ainda necessárias, penso que os profissionais do mercado financeiro sejam os mais indicados para montarem um produto de Venture Capital. Eles estão ligados aos investidores e aos órgãos reguladores e, por isto, são os mais próximos e preparados para fazer esta ponte. Entretanto, após a capitalização do produto, outros problemas entram em cena.

Historicamente, os fundos americanos de Venture Capital são geridos por profissionais que estão no ramo há muitos anos, mas não necessariamente no mercado financeiro. Muitas vezes as empresas de gestão de recursos focadas neste tipo de operação foram fundadas por empresários que ganharam fortunas em seus setores de atuação ou mesmo por consultorias especializadas que, por entenderem o ciclo de alguns tipos particulares de empresas, ficaram aptas a reconhecer bons negócios e fazer investimentos. Não existe dúvida sobre as grandes oportunidades de crescimento que existem quando o mix correto de produto, mercado e empreendedor é encontrado.

Não podemos, entretanto, confundir metodologias de investimento de curto prazo (tipicamente a que os investidores brasileiros sabem usar) com as de longo prazo. A primeira medida para eliminar este vício é ter na equipe analistas vindos do mercado corporativo relacionado ao setor em que o fundo irá atuar. Estas pessoas são treinadas a não pensar somente em dinheiro em um primeiro contato.

Há grandes oportunidades de crescimento quando o mix correto de produto, mercado e empreendedor é encontrado

Apesar de parecer ingênuo e simplista, a forma direta e demasiadamente objetiva de os investidores financeiros atuarem assusta empreendedores que passaram a vida construindo suas empresas. Não que isto seja errado, mas certamente é um ajuste fino que faz enorme diferença na escolha dos bons projetos. Isto sem contar a negociação para aporte dos recursos. Muitos empreendedores que nos procuram hoje têm a idéia errada de que os investidores vão achatar a empresa, eliminando seu valor de mercado e exigindo garantias impossíveis de serem cumpridas.

Não estamos ainda na fase madura e desenvolvida que os americanos estão. O lado ruim disto é que o processo de captação dos fundos é lento e requer uma explicação detalhada ao investidor sobre o mercado e o produto de investimento. Além, é claro, dos potenciais ganhos. Acredito, entretanto, que existem mais partes boas do que ruins. Por lá, fundos competem de igual para igual por bons projetos e equipes de empreendedores. Chega-se ao ponto de haver leilão entre os fundos para fechar um bom investimento. Devido ao excesso de oferta, os cotistas desses fundos têm vantagens significativas no retorno sobre os seus investimentos e na cobrança das taxas de administração.

Por enquanto, estamos longe desse estágio no Brasil. Existe tanto espaço para todos que os integrantes deste mercado precisam que existam mais fundos investindo em empresas. A troca de experiências sobre o mercado e a possibilidade de se fazer co-investimentos, compartilhando riscos, ainda são muito pouco exploradas por aqui.

A troca de experiências entre gestores e as possibilidades de co-investimento ainda são pouco exploradas

Estamos, por enquanto, na fase em que investidores tratam empreendedores com desdém. E que empreendedores, por não terem opções viáveis de financiamento, ficam sem opção e se sujeitam a extensos prazos de análise e a exigências de investimento impossíveis de serem cumpridas. São também obrigados a passar por uma batelada de entrevistas com analistas juniores, do tipo recém-saídos da faculdade, e a ouvir conselhos de pessoas que nunca tiveram seu próprio negócio. Mas estes ajustes serão feitos com o tempo e com conhecimento que vem dele.


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