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O senhor das pílulas
Martin Lipton

, O senhor das pílulas, Capital AbertoAos 79 anos de idade, Martin Lipton, advogado norte-americano, sócio do escritório Wachtell, Lipton, Rosen & Katz, continua no topo. Uma pesquisa do site Who’s Who Legal, divulgada em abril, colocou Lipton entre os dez indivíduos mais respeitados em matéria de fusões e aquisições (M&A), de uma lista de 585 advogados de 77 jurisdições. Já a sua mais famosa invenção, o mecanismo de defesa contra aquisições de controle hostis conhecido como poison pill, está em baixa. Lipton estima que, nos Estados Unidos, metade das companhias que tinham pílulas de veneno abdicou desse dispositivo nos últimos dez anos. Quando a primeira poison pill foi criada, em 1982, ela logo se espalhou por milhares de empresas norte-americanas.

Geralmente, as pílulas são bônus de subscrição emitidos para acionistas quando um adquirente não desejado pelo conselho de administração atinge determinada participação no capital da companhia. Como esse adquirente não recebe o mesmo direito de comprar ações com desconto, ele é potencialmente diluído. Nos Estados Unidos, os conselheiros da empresa-alvo têm total autonomia para usar essa arma, capaz de afastar tanto as ofertas com preços baixos como qualquer outra que seja contrária aos interesses do board. Presentes nos estatutos de várias companhias do Novo Mercado da BM&FBovespa, as ofertas públicas de aquisição obrigatórias (a partir da compra de determinada participação acionária) receberam o apelido de poison pills por sua semelhança à cria de Lipton — e também herdaram sua vocação para a polêmica. Em seu escritório em Nova York, o advogado recebeu a reportagem da CAPITAL ABERTO.

CAPITAL ABERTO: O senhor tinha ideia de que a poison pill se tornaria tão difundida?
martin lipton: Era evidente que seria amplamente difundida se, de fato, fosse aceita pela corte. Também imaginava que o mecanismo despertaria tantas reações contrárias?

Claro. Já esperávamos que a poison pill seria alvo de litígios, como foi. Até que, em 1985, um parecer da corte de Delaware (estado norte-americano) a considerou legal. Desde então, com exceção de um ou dois casos em estados que têm uma lei corporativa distinta da de Delaware, a poison pill é considerada legal. Esses estados que tinham legislação diferente rapidamente reformaram suas leis para também tornar a poison pill legal.

O senhor pensava nos efeitos colaterais das poison pills? Elas podem ser usadas por administradores para impedir uma aquisição de controle que, embora economicamente interessante, ameaçasse seus empregos.

“É essencial que as pílulas sejam severas. O ideal é que ninguém possa superá-las, a não ser o board. É como um portão trancado”

Cabe ao conselho decidir se a companhia deve fechar o negócio ou não. Se o board decidir pelo não, mas os acionistas acharem que a opção deveria ser o sim, eles poderão eleger um novo conselho de administração, que vai anular os efeitos da poison pill e permitir que o negócio prossiga.

O senhor não vê problemas em pílulas que são barreiras intransponíveis para adquirentes?

É essencial que elas sejam severas. O ideal é que ninguém possa superá-las, a não ser o board. É como um portão trancado. A única chave para destrancá-lo está nas mãos do conselho de administração. Se alguém quiser atravessar essa passagem, terá de convencer os conselheiros a liberar a entrada ou iniciar uma “proxy fight” (disputa por votos de acionistas nas decisões de assembleia) para remover os administradores em exercício e inserir membros no board. Esse novo conselho, então, poderá entregar a chave para abrir o portão.

“As empresas com poison pills conseguem preços melhores quando são adquiridas do que aquelas sem mecanismos de defesa”

Justamente por exigir uma mudança na composição do conselho, a remoção da pílula é considerada impossível pelos seus críticos. Sabemos que, nos Estados Unidos, eleger conselheiros que não sejam os apoiados pelos administração é um processo bastante árduo. Mudar o conselho não é um processo difícil. Acontece várias vezes. Geralmente, um ofertante hostil à administração inicia uma proxy fight para substituir os conselheiros. Quando o board não encontra outro negócio ou não fecha um acordo com o “agressor”, frequentemente um novo conselho ou alguns novos conselheiros são eleitos, e a operação é concluída. É muito raro, talvez tenha ocorrido uma meia dúzia de vezes, uma companhia com poison pill permanecer independente depois de um ofertante ter conduzido uma proxy fight bem-sucedida.

O senhor quer dizer que ser bem-sucedido em uma proxy fight é simples?

Em última instância, os acionistas determinam quem está no board. A Justiça nunca exige a retirada da pílula, mesmo diante de uma oferta de aquisição de controle, quando a companhia segue procedimentos razoáveis para fundamentar sua decisão de manter o dispositivo. Em outras palavras, se o conselho de administração verifica que o preço da oferta não é adequado, ou entende que os interesses de longo prazo dos investidores serão mais bem atendidos se a companhia permanecer independente, pode manter a poison pill.
Normalmente, os juízes creem que os administradores podem “just say no” (recusar a oferta e não desistir da pílula).

Quais fatores levaram ao declínio da adoção de poison pills nos últimos anos?

Os investidores institucionais não gostam delas. Eles dizem que não vão votar nos conselheiros se as poison pills não forem anuladas. Essa mensagem tem sido colocada ao longo da última década. Provavelmente, metade das companhias que mantinham poison pills retirou suas pílulas. Elas estavam pressionadas por investidores institucionais e pela RiskMetrics (consultoria que comprou a consultoria de recomendação de voto ISS e, recentemente, foi adquirida pela MSCI).

Alguns desses investidores querem que as poison pills sejam canceladas porque acreditam que elas tiram valor da companhia. O senhor concorda com isso?

Não, eles não acham isso. Equivocadamente, os investidores acreditam que a poison pill dissuade outras pessoas de tentarem adquirir o controle da companhia. Eles assumem que a ausência da poison pill vai estimular ofertas de aquisição.

E isso não é verdade?

Eu não concordo, porque não há estatísticas que comprovem esse efeito. Penso que, na verdade, as empresas com poison pills conseguem preços melhores quando são adquiridas do que aquelas sem mecanismos de defesa. A poison pill fortalece o poder de negociação da companhia-alvo. É impressionante o quanto os preços de uma oferta de aquisição ficam mais altos diante de uma pílula.

Aquisições são levadas a cabo mesmo quando os preços são inflados por poison pills?

Sim, o tempo todo. Os ofertantes aceitam pagar um prêmio pela companhia, desde que a pílula não seja acionada.

“Pergunte ao CalPERS e a outros investidores por que eles são idiotas. A melhor coisa para o acionista é uma poison pill”

Não seria benéfico se a decisão pelo uso da poison pill partisse dos próprios acionistas, reunidos em assembleia, como ocorre no Canadá e no Japão?

Nos Estados Unidos, os acionistas já têm o direito de decidir esse tema, por meio da troca do conselho.

O senhor não recomenda submeter a pílula à votação em assembleia?

Os investidores institucionais, que detêm a maioria do capital das companhias norte-americanas, não aprovariam a adoção da pílula. Eles não gostam de poison pills.

Apesar dos benefícios que as poison pills trazem às companhias, nos Estados Unidos, os investidores lutam pelo seu fim. O que aconteceu para que a pílula fosse tão mal compreendida?

Talvez você tenha de perguntar ao CalPERS (fundo de pensão dos funcionários públicos da Califórnia, o maior do mundo e conhecido por defender boas práticas de governança) e a outros investidores institucionais por que eles são idiotas. A melhor coisa para o acionista de uma companhia é uma poison pill. Quando o preço da oferta é apropriado, o conselho aceita o negócio. Nos casos em que a oferta é ruim, a poison pill impede que o adquirente hostil roube a companhia.

Alguma companhia já procurou seu escritório para retirar uma poison pill?

Não aconselhamos ninguém a cancelar poison pills. Se pressionada por um investidor institucional a abandonar a pílula, a companhia deve, ao menos, mantê-la na prateleira (“on the shelf”). Dessa maneira, a poison pill só entra em ação para confrontar uma oferta hostil.

No Brasil, os mecanismos de defesa apelidados de poison pills estão nos estatutos sociais. Geralmente, eles exigem a realização de uma oferta pública de aquisição obrigatória, inclusive a preços acima do valor de mercado, por quem atinge determinada participação no capital da companhia. O senhor acredita que essa é uma boa poison pill?

Alguns estados norte-americanos têm companhias com estatutos assim, em que você encontra ofertas públicas obrigatórias. Não sei dizer se esses instrumentos são bons ou não, pois depende do que você está tentando atingir. Se seu objetivo é alcançar um preço elevado para os acionistas, a oferta obrigatória com prêmio pode ser positiva.idiotas. A melhor coisa para o acionista de uma companhia é uma poison pill. Quando o preço da oferta é apropriado, o conselho aceita o negócio. Nos casos em que a oferta é ruim, a poison pill impede que o adquirente hostil roube a companhia.


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