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“Não existe economia sem política”
Milto Bardini

, “Não existe economia sem política”, Capital AbertoMilto Bardini não está atrás das respostas fáceis. Embora viva imerso no mundo dos números, típico de um executivo financeiro, não consegue evitar o interesse pelas análises mais subjetivas e complexas. Seu tema do momento é a irracionalidade das decisões dos investidores. “Há pouco de técnico e muito de elementos sociais e psicológicos”, observa. Ele é capaz de discorrer horas sobre o assunto, fazer citações e esbanjar erudição — a verdadeira, não aquela baseada no Google (que não utiliza) ou em autoajuda. “Devoro livros”, diz o vice-presidente e diretor de relações com investidores (RI) do Bicbanco, numa rara expressão mais coloquial dentro do discurso sempre sofisticado.

Foi depois de ouvir os discursos de Carlos Lacerda — líder da UDN reconhecido pela retórica primorosa — que o jovem Bardini decidiu tentar a carreira política. No conturbado cenário do fim dos anos 1960, optou por cursar a universidade de ciências políticas no exterior, na cidade belga de Louvain, com uma orientação mais alinhada à juventude udenista do que à esquerdista de Paris. “Em Louvain, éramos 2.850 estrangeiros: 125 brasileiros, 850 latino-americanos, 64 nacionalidades”, recorda-se o executivo, demonstrando que o fascínio pela política já convivia com a habilidade em lidar com números. “Foi uma vivência extremamente enriquecedora, sob todos os ângulos.” Terminado o curso (“os estudantes eram julgados por um exame oral”, ressalta), ele acabou recebendo um duplo convite da universidade. Poderia seguir uma carreira acadêmica ou ser imediatamente contratado pela área administrativa, na qual em pouco tempo assumiria o cargo de diretor financeiro que ocupou por sete anos.

Depois de casar com uma belga e ter três filhos, o executivo transferiu-se para o maior grupo bancário daquele país, atraído pela possibilidade de ingressar no Banco Europeu para a América Latina (Beal) e assim retornar ao Brasil, onde percorreria uma carreira sem desvios de rota, toda trilhada em instituições bancárias de prestígio. Foi diretor executivo do Sudameris, vice-presidente do BMC e diretor de varejo do Banco Bandeirantes, que pertencia à Caixa Geral de Depósitos, antes de chegar ao Bicbanco, há oito anos. A impressão de que o interesse pela política teria ficado no passado, no entanto, ele trata de rechaçar: “Política envolve tudo; é a gestão do ser humano. Ela ensina a avaliar, a ler o que não está escrito, a apreciar as entrelinhas, a entender os elementos motivadores de uma decisão ou evento. Não existe economia sem política.”

, “Não existe economia sem política”, Capital AbertoÉ de posse dessa visão abrangente que Bardini inquieta-se com os julgamentos superficiais que vieram a reboque das novas tecnologias nos últimos anos. “A facilidade vinculada à busca de informação faz com que percamos o viés, o rigor e a responsabilidade de nos aprofundar. No fim do dia, perde-se o gosto pelo desafio do raciocínio”, lamenta. “Decisões importantes como a de um investimento repousam, não raro, sobre informações originadas e transferidas de modo, no mínimo, frágil.”

Embora se inclua generosamente entre os que sofrem impactos da tendência, Bardini na realidade desafia a multidão e está sempre se aprofundando em novos temas — sejam eles a criação de uma governança corporativa sustentável na empresa ou o local das próximas férias com a esposa. As viagens à Europa costumam ser planejadas a partir de um interesse histórico, como os templários (“eles eram os grandes gestores das transferências de recursos”) ou a Espanha moura. Sem falar nos temas relacionados à França, grande paixão do casal, que tem uma das filhas morando no país. “Estudamos o assunto antes de viajar e tiramos o máximo de proveito”, conta.

Sempre atento às palavras (“a língua é uma das grandes expressões da nacionalidade; respeitá-la significa respeitar o seu país”), Bardini certifica-se de que seu pensamento em relação à fragilidade das análises de investimentos não seja mal interpretado. De forma alguma, ressalta, ele embute uma crítica ao trabalho dos analistas. “O conceito de coerção social, desenvolvido pelo grande sociólogo francês (Émile) Durkheim, mostra que o ser individual age influenciado por sua sociedade. Uma vez dentro da atividade de análise, não há como se desviar dos padrões.”

O questionamento e a inquietação intelectual, porém, não só são compatíveis com a dinâmica do mercado como desejáveis, acredita. Até mesmo no estressante setor bancário. “Aprendi a ter autocontrole em situações de estresse”, afirma, para novamente citar os livros. “Das biografias de personalidades da nossa história, o que parece emergir é a capacidade de jamais se deixar impressionar pela árvore sem ter a visão da floresta. É corriqueiro que uma pessoa muito próxima ao problema se deixe engolir por ele.”

Não é o caso do executivo, que dispensa o clipping de notícias para ele próprio “tomar a informação” para si, em jornais e revistas. “Tenho obsessão pela informação. Ela faz parte do negócio. O clipping obrigatoriamente restringe o universo. Acredito que o executivo financeiro tem que ser polivalente, ver e entender o que acontece em seu país e no exterior. O clipping é um desvio da obrigação de se informar.” Pelo visto, se alguém tem a visão total da floresta — e a coragem para acusar qualquer clareira suspeita —, esse alguém é Milto Bardini.


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