Missão de ensinar
Guilherme Benchimol

, Missão de ensinar, Capital AbertoO dinheiro da venda do carro — único patrimônio de Guilherme Benchimol em 2003 — estava acabando. Na salinha alugada em Porto Alegre, um dos quatro lugares ficara vago com a saída do estagiário, recém-formado. O mesmo aconteceria em breve com a outra estagiária: impossível cobrir os custos de sua contratação. Benchimol avisou então ao sócio Marcelo Maisonnave que voltaria a morar no Rio de Janeiro, na casa da mãe, se a empresa não se viabilizasse até o fim do ano. Enquanto atualizava o currículo, o jovem economista de 26 anos repassava mentalmente o seu esforço, para ter certeza de que não estava desistindo fácil do sonho de criar o próprio negócio.

Não, não lhe faltara persistência. Tinha feito quase 500 visitas, de porta em porta, tentando motivar pessoas indicadas por amigos a investir na bolsa de valores, sem muito sucesso. Preferiu então o caminho de atrair interessados para si, em vez de caçá-los em todo lugar, mas as palestras dadas na pequena sala da sua empresa não foram suficientes para rentabilizar a XP Investimentos antes de o dinheiro do carro se esgotar. A última chance seria um modelo de curso pago, com apostila e espaço reservado em hotel, que testariam no fim de semana seguinte. O curso acabou dando certo, com 40 inscrições. Os dois sócios, reanimados, tentaram convencer a estagiária a permanecer na empresa, oferecendo-lhe sociedade. Como ela ganharia menos que , Missão de ensinar, Capital Abertoa bolsa-estágio, lançaram mão de um argumento fantasioso: a XP ainda seria a maior corretora do Brasil.

Como nos contos de fadas, a profecia se realizou — e, de quebra, Benchimol acabou namorando, casando e tendo filhos com a estagiária que aceitou o risco da sociedade. “Foi por pouco que não desisti”, conta o fundador da XP, maior corretora independente do ranking da BM&F Bovespa em 2009 e líder no cômputo geral em janeiro deste ano. Como todo empreendedor que começa do zero — com um investimento inicial de R$ 10 mil em computadores usados de uma lan house e alguns poucos móveis —, Benchimol ressalta que o sucesso não veio com um toque de varinha de condão.

Mesmo depois de criar um formato de negócios vitorioso, baseado na educação para investimentos (“Ninguém fazia isso no Brasil”), a trajetória foi árdua. “Para o mercado financeiro, éramos os garotos malucos, que batiam perna na rua, faziam palestras, dispensavam a gravata”, conta. “Não precisávamos contratar um filhinho de papai para trazer contatos, porque bolamos um modelo impessoal, profissional: havia uma demanda reprimida (as pessoas que queriam aprender a investir em ações) e nós divulgávamos o nosso produto, o curso ‘Aprenda a investir na bolsa de valores’.”

Guilherme Benchimol, sócio-fundador da XP Investimentos: “Para o mercado financeiro, éramos os garotos malucos, que batiam perna na rua, faziam palestras, dispensavam a gravata”

Carioca de uma tradicional família de cardiologistas, Guilherme Benchimol poderia ter tido as facilidades de um “filhinho de papai”, mas a vocação para as finanças e para o empreendedorismo o levou a trilhar um caminho oposto. “Meu pai não me dava moleza”, acrescenta. Aos 15 anos, depois de assistir a uma difícil cirurgia cardíaca, na qual a paciente morreu, ele descartou a carreira na medicina. O mercado financeiro passou a exercer tal atração que, com 17 anos, no início da faculdade de economia na UFRJ, ele já estagiava na corretora Sênior. Ficou eufórico quando passou pela seleção para trainee na corretora Icatu e mais ainda com o convite para trabalhar na InvestShop, corretora virtual do grupo Bozano.

“Era um projeto inovador”, observa Benchimol. “A XP tornou-se o que a corretora InvestShop não conseguiu na época, por estar fora do timing”, analisa. Foi por causa daquele trabalho que ele conheceu o futuro sócio e descobriu um mercado a desbravar, em Porto Alegre, onde fora convencer uma corretora a adotar a solução de tecnologia da InvestShop. A corretora gaúcha convidou-o a implantar o projeto e, aos 23 anos, ele mudou-se para o Sul. “Apesar da idade, eu já tinha alguma experiência. Vi que ali o potencial para um negócio era maior do que no Rio.” Já no início da XP, o significado de “desbravar mercado” ficou mais claro para o jovem empresário, que ia às casas das pessoas pregar o mercado de ações e falava até para donas de casa, enquanto elas cozinhavam o feijão. “Percebi que para fazer o negócio de corretagem crescer no varejo era necessário trabalhar forte com educação. A nossa missão ficou sendo cada vez mais a de ensinar.”

O modelo baseado em cursos levou à rápida expansão, no interior e em outras capitais. Em 2005, já com uma gestora montada para administrar os recursos de alunos sem tempo de praticar os ensinamentos, eram 30 escritórios no País e 200 operadores. Em 2006, os sócios acertaram a compra da corretora carioca Americainvest. “Comecei a acreditar pra valer no sonho”, diz. Se havia alguma dúvida sobre o modelo implantado pela XP, ela se dissipou com a crise global de 2008: “Crescemos muito”, diz Benchimol. “O cliente mais educado é mais fiel e não se estressa tanto com uma queda na bolsa. Mais do que uma solução comercial, criamos uma solução de continuidade.”

Zanzando apressado pelos corredores da sede, na Barra da Tijuca, Guilherme Benchimol não parece “maluco”, mas um garoto vibrante, mais jovem que seus 33 anos de idade. Confessa o vício no trabalho (até 18 horas por dia, além de sábados e domingos), o ritmo acelerado e o gosto por aventuras, que o atrai às trilhas de motocross nos raros momentos de lazer (“me divirto trabalhando”). Transmitir toda essa energia para uma equipe que já ultrapassa mil operadores no País é o desafio ao qual se impõe, agora que o sonho vai além da consolidação como maior corretora. “Queremos ser um grande shopping center independente de produtos financeiros, como a americana Charles Schwab”, revela. Pelo retrospecto da empresa, ele pode brincar com a máxima: “Aqui precisamos ter cuidado com os sonhos; eles podem se tornar realidade.”


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