Meu IPO já era
Com o subprime no caminho, empresas mudam os planos, mas não jogam o trabalho fora. Departamentos de RI e conselhos de administração estão lá, funcionando

, Meu IPO já era, Capital AbertoAs mais de 100 ofertas públicas iniciais de ações (IPOs) realizadas de 2004 até o fim do ano passado foram reflexo de mudanças importantes para o País e o mercado de capitais. Ao mesmo tempo em que as empresas cresceram o suficiente para permitir a saída de sócios e a captação de recursos em bolsa, o mercado apostou nos planos de longo prazo dessas companhias e no cenário macroeconômico que os sustentaria. Colada nesses fatores, esteve a abundante liquidez internacional, absolutamente definitiva para que as ofertas de ações ocorressem na proporção observada. No que dependia só do Brasil, nada mudou. As duas primeiras constatações continuam valendo e não prometem cair por terra tão cedo. Mas diante do crédito enxuto, da crise internacional e das perdas bilionárias dos principais conglomerados financeiros, a liquidez abundante já era, e o cenário não é mais tão convidativo. Que o digam as 17 empresas que, somente neste ano, desistiram, ao menos momentaneamente, de ofertar ações na bolsa. Dessas, 11 fariam uma abertura de capital.

Os dados são da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e referem-se às empresas que chegaram a protocolar pedidos de registro de oferta pública, mas não a executaram dentro dos prazos previstos. São elas: Moura Dubeux Engenharia, Marítima Seguros, Imcopa Importação e Exportação Indústria de Óleos, Globex, Rossi Residencial, Banco Industrial, Vix Logística, Raia, GBarbosa Holding, Unidas, Abyara, Cyrela, Alliansce, LLX Logística e Ideiasnet, além de Brazilian Finance & Real State e Campos Verdes, que planejavam emitir certificados de ações. Somam-se a elas outros 12 IPOs, entre as ofertas de ações e de certificados de ações que estavam sob análise da CVM até 27 de março, interrompidos com base no artigo 10 da Instrução 400. O dispositivo, comumente usado por quem aguarda a melhora do mercado, confere 60 dias úteis para a empresa retomar o processo.

Ser obrigado a mudar os planos no caminho, como se vê, é uma possibilidade cada vez mais real. Resulta do descompasso entre o momento em que se decide fazer a oferta e o comportamento da liquidez do mercado. Mas depois de meses de trabalho para adequar a estrutura da empresa às exigências do Novo Mercado, destino de praticamente todas as interessadas em abrir o capital, o que fazer com todos os preparativos?

A Marítima Seguros tem a resposta na ponta da língua. Nos registros da CVM, consta que a empresa desistiu do IPO em março. Segundo a companhia, porém, trata-se apenas de um adiamento em razão das condições do mercado. A expectativa é retomar o projeto ainda no segundo semestre deste ano ou em 2009. “Todos os preparativos agregam valor à companhia, mesmo que a oferta de ações não tenha ocorrido. Hoje contamos com uma visão estratégica aprimorada”, conta Milton Bellizia, diretor executivo administrativo e de Relações com Investidores (RI).

A preparação da Marítima custou cerca de US$ 20 milhões. A cifra inclui gastos com bancos, auditoria, assistência jurídica, traduções, pesquisas de mercado, reuniões com equipes de research e reestruturações internas. Todo esse investimento, garante Bellizia, está sendo aproveitado. As diversas comissões criadas, entre elas a de auditoria e a de sinistros, seguem ativas, assim como o departamento de RI, que recebe até uma dezena de ligações por dia, todas de potenciais investidores.

Outra companhia que estava 100% pronta para o IPO é a Moura Dubeux Engenharia, construtora e incorporadora, que atua na Região Nordeste. Já tinha constituído a área de RI, elaborado o prospecto e incluído membros independentes no conselho de administração. “Atualmente, nosso departamento de RI atende os investidores interessados em conhecer a companhia. O restante da estrutura é indispensável, independentemente da realização ou não do IPO”, contam os diretores Marcos e Gustavo Dubeux. A oferta de ações continua nos planos. A expectativa é de que a nova tentativa seja, inclusive, mais robusta do que os US$ 300 milhões projetados inicialmente.

, Meu IPO já era, Capital AbertoMEIO CAMINHO ANDADO — A pausa nos IPOs atingiu setores variados. A Aliansce, do segmento de shopping centers, parou no meio do caminho, apesar de algumas de suas concorrentes terem chegado com sucesso à bolsa. Os administradores não têm previsão para a estréia da empresa na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), que não se desfez da estrutura desenvolvida ao longo dos seis meses de preparação. O conselho de administração, por exemplo, permanece ativo. “O investimento não foi perdido. Quando decidirmos retomar o IPO, será necessário atualizar o que já foi feito, trabalho que terá custo adicional marginal”, observa o diretor executivo da Aliansce, Henrique Cordeiro Guerra Neto. Enquanto este momento não chega, a empresa mantém suas metas de expansão através da injeção de recursos dos próprios sócios. Somente para o primeiro semestre foram aprovados R$ 600 milhões, capital que permitiu a ampliação de oito empreendimentos, além de dez aquisições nos últimos seis meses.

A Atmosfera, especializada na higienização de têxteis, recuou da abertura de capital no ano passado. Contribuiu para a fraca demanda dos papéis o fato de o principal executivo da companhia ser réu num processo penal sobre a quebra do Banco de Financiamento Internacional S.A., em 1996. Mas, segundo a empresa, as condições do mercado já não se mostravam totalmente favoráveis à emissão.

Para cumprir seus planos de crescimento, uma vez que a retomada do IPO não tinha mais prazo para acontecer, a Atmosfera optou pelo endividamento. Toda a reorganização administrativa, resultado de seis meses de preparação para a bolsa, está sendo aproveitada no dia-a-dia, segundo o diretor de RI, Gunther Schrappe. A protelação tampouco arrefeceu o interesse de potenciais acionistas pela companhia, segundo o diretor. Apesar de contar com cerca de 80% do capital nas mãos da gestora de recursos Advent, a Atmosfera recebeu investidores institucionais dispostos a comprar participação direta na companhia, mesmo com o adiamento do IPO. Os negócios, contudo, não se concretizaram. Schrappe reconhece que a empresa teria crescido mais rapidamente se a oferta inicial tivesse ocorrido. “Mas é preciso separar crescimento e valor para o acionista”, pondera.

Também em compasso de espera está a Vix Logística, do Grupo Águia Branca, que previa captar US$ 300 milhões na emissão de ações. A companhia, que se tornou uma sociedade anônima especialmente para o IPO, tem um mapeamento de possíveis aquisições e espera que as condições do mercado melhorem para efetivar a listagem na bolsa. A puxada no freio serviu de lição. “Ficou claro para nós que é assim que o mercado funciona”, diz Patrícia Chieppe, diretora administrativa-financeira da Vix.

Uma exceção é a BR Properties, que atua na aquisição, gestão e locação de imóveis. Ao contrário das demais empresas consultadas pela CAPITAL ABERTO, ela desistiu de vez do IPO. O motivo, também neste caso, era o preço: a aversão dos investidores ao risco de ações de novatas imporia descontos que os sócios — na época, oito fundos –– não estavam dispostos a aceitar. A saída foi levantar recursos através de uma oferta privada de ações, que compreendeu injeção de dinheiro por parte dos acionistas que já detinham uma parcela do capital e de mais três novos investidores (Temasek, Dynamo e Causeway Properties). No total, foram levantados aproximadamente US$ 163 milhões. A meta do IPO, que compreenderia somente a emissão primária de ações, era arrecadar US$ 330 milhões.
Por ser uma sociedade formada por grandes investidores, a BR Properties nasceu como uma companhia aberta, listada no Soma, mercado de balcão organizado da Bovespa. Seriam necessários menos de quatro meses para que as ações fossem distribuídas publicamente. No entanto, as dúvidas sobre o preço que os papéis alcançariam, em razão do cenário de instabilidade do segundo semestre do ano passado, fizeram com que alguns esforços relacionados ao IPO fossem poupados. A companhia não chegou a incluir membros independentes no conselho, por exemplo, nem a contratar um profissional específico para RI. “Foi a melhor decisão. Era difícil saber qual seria o tamanho do desconto”, conta Pedro Dalto, CFO da BR Properties.

E quanto à frustração? O executivo diz que ela passa em uma semana. Depois disso, surgem novos planos e a “vida segue”. Tanto na BR Properties quanto nas outras companhias que adiaram seus IPOs, o sentimento é de que a mudança de planos foi a atitude mais sensata a tomar. A julgar pelas perspectivas traçadas pelos economistas em relação à extensão da crise do subprime, a lista de espera promete se alongar.


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