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Lugar certo, hora certa
Luiz Leonardo Cantidiano

, Lugar certo, hora certa, Capital AbertoÀs vésperas do anúncio da reestruturação societária que criaria a maior empresa de celulose do mundo, 25 advogados e seus auxiliares trabalhavam dia e noite em três salas contíguas, em um movimentado prédio na avenida Almirante Barroso, no centro do Rio. Era janeiro e a temperatura subia, dentro e fora do escritório. Contratado pelo grupo Votorantim, o advogado Luiz Leonardo Cantidiano liderava o mutirão, fazia as refeições no prédio, acompanhava negociações paralelas pelo celular e, apesar de todo o estresse, jamais perdia a compostura, muito menos com algum subordinado. Essa é uma marca pessoal de Cantidiano: ele é sempre afável com quem está à sua volta, seja a pessoa um contínuo ou diretores de empresas envolvidas em grandes operações, como a reestruturação da Aracruz.

Não por acaso, quando perguntado sobre quem o inspirou na carreira, diz que seu grande exemplo é o professor Alfredo Lamy Filho, um dos autores da Lei das S.As., conhecido pela rara dobradinha de competência e simplicidade. O reconhecimento às qualidades similares de Cantidiano é visível na lista interminável de amigos, colecionados desde os tempos em que frequentou o curso ministrado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), em 1977, entre os 40 aprovados em concurso público promovido pela autarquia recém-criada. Cantidiano tinha tirado o primeiro lugar, Lamy era um dos professores e nenhum dos dois podia imaginar que o aluno número 1 se tornaria um dos presidentes da autarquia, 25 anos depois, por caminhos mais tortuosos do que é praxe no serviço público.

Isso porque Cantidiano, após o treinamento, recusou uma vaga na autarquia e acabou optando pelo setor privado. “Eu tinha prazer em negociar uma associação ou reorganização de empresa e via o mercado de capitais caminhando na direção de facilitar essa conjugação de interesses e o empreendedorismo. Queria focar nessa nova área.” Mas a vida é feita de felizes coincidências, diz ele, percebendo hoje, aos 60 anos — comemorados com grande festa junto à legião de amigos —, um sentido para cada passo dado ao longo da trajetória profissional. “Em várias ocasiões dei a sorte de estar no lugar certo, na hora certa”, afirma.

O êxito no concurso pode ser atribuído ao fato de ele ter levado por acaso, na bagagem, quando embarcou para um estágio de dez meses em Londres, o anteprojeto da Lei das S.As. e a Lei do Mercado de Capitais, de 1940. “Estava tão interessado que fiz um estudo comparativo das duas leis nas horas vagas”, conta Cantidiano, que já tinha dado aulas de direito comercial e atuado como advogado na empresa de leasing do Citibank. “Acreditava que haveria uma grande mudança no País com a nova lei.”

A experiência no setor privado mostrou-se valiosa quando ele aceitou ser conselheiro da Bolsa de Valores do Rio, em 1983, e depois diretor da CVM, em 1990, convidado pelo presidente Ary Oswaldo Mattos Filho. O mercado estava paralisado pelo Plano Collor, mas mesmo assim Cantidiano aceitou o desafio — talvez devido à vaga desprezada no passado, considera ele, ou por uma inconfessável atração pela administração pública herdada do pai, um sergipano que fundou a faculdade de direito do seu estado e foi secretário de Fazenda e Justiça.

Em 1998, já de volta ao escritório de advocacia, uma nova coincidência se armava em sua vida profissional ao ser contratado para fazer um roadshow no Reino Unido e nos Estados Unidos. Um total de 25 fundos estrangeiros, que já investiam nas privatizações brasileiras, queriam vislumbrar novas oportunidades no País. Naquela maratona, Cantidiano acabaria fazendo um levantamento dos motivos que geravam desconfiança e afastavam os investidores. “Eles diziam que não havia proteção, voto, dividendo; reclamavam que uma pessoa com minoria do capital gerenciava o negócio como se fosse próprio.” Alguns meses depois, Cantidiano era chamado para compor o grupo que criaria o Novo Mercado, a partir de um estudo encomendado pela Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa).

Figurar entre os artífices do Novo Mercado é um dos grandes orgulhos de Cantidiano, ao lado da modernização na regulamentação promovida por sua gestão à frente da CVM, entre 2002 e 2004. “Exercer esse cargo me deu muita alegria, porque consegui resolver questões importantes do mercado”, diz ele, referindo-se a avanços como a criação dos Fundos de Investimento em Participação (FIPs) e a mudança nos Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs). “Tudo que possa ter ocorrido de negativo foi dez vezes superado pelo que eu ajudei a construir.”

Cantidiano fica com os olhos marejados ao referir-se ao episódio que marcou seus últimos meses na autarquia: com a mudança de governo (foi empossado pelo ministro da Fazenda Pedro Malan e demorou sete meses para ser recebido pelo sucessor, Antonio Palocci), sofreu todo tipo de “fritura” política, incluindo insinuações de que estaria a serviço do empresário Daniel Dantas, em disputa com os fundos de pensão. “Meu drama era não haver uma acusação formal para rebater. Restava apenas a minha convicção de ter sido absolutamente correto em tudo o que fiz.” A convicção era também a do mercado, que chegou a promover um almoço em desagravo, com meia centena de adesões.

Rotina – Mora no Rio e passa a semana trabalhando em São Paulo. Procura intercalar os fins de semana entre Rio, São Paulo e Itaipava (RJ).
Como se informa – Folheia O Globo e Valor Econômico pela manhã e, às vezes, separa reportagens para ler à noite. No escritório, vasculha o site da CVM a cada dois dias.
Hobby – Gosta de jogar tênis, mas está parado por causa de uma lesão na perna. Adora ver jogos de futebol na TV, mesmo quando não são de seu time, Vasco da Gama.
Livros na cabeceira – Acabou de ler Ainda se morre de amor, de Miguel de Souza Tavares, e a biografia do advogado José Luiz Bulhões Pedreira, lançada em maio.
O que o tira do sério – Já teve momentos de explosão em assembleias gerais, mas hoje está mais “soft”. “Ainda fico impaciente quando alguém perde tempo com coisinhas miúdas, em vez de olhar as grandes questões. Aí eu saio da sala.”
Paixão – Família. Mais velho de nove irmãos, é casado desde 1975 e tem duas filhas, uma advogada e outra psicóloga.
Que outra profissão gostaria de ter – Quando era mais novo, pensou em ser diplomata.
Tecnologia – Festeja poder conciliar trabalho e lazer. “Advogado é como médico, temos que estar à disposição, mesmo que o problema do cliente seja mais emocional do que jurídico.” No ano passado, acompanhou passo a passo pelo BlackBerry um caso do escritório enquanto viajava pelas ilhas gregas.
Uma admiração – O pai, Renato, que o ajudou a ter disciplina; e Alfredo Lamy Filho, que considera um grande exemplo. “Uma pessoa sem afetação, muito competente e cordial.”
Ambição para o futuro – Atualizar e ampliar o livro sobre a reforma da Lei das S.As., que lançou em março de 2002. “Brinco com o editor que ele me pagou um livro de advogado e vendeu um de presidente da CVM, porque esgotou rapidamente.”
Uma vitória na iniciativa privada – A compra do grupo Ipiranga pelo consórcio formado por Petrobras, Ultra e Braskem, que ganhou o prêmio Latin Lawyer Deal of the Year de 2008. Ele atuou como advogado da Petrobras.
Uma vitória no setor público – Ter participado do grupo que criou o Novo Mercado e ajudado na reformulação do ambiente regulatório como presidente da CVM.
Saia-justa – Depois de um mês de negociação, a empresa estrangeira que ia se associar ao seu cliente brasileiro quis mudar toda a estrutura da operação. Cantidiano ameaçou ir embora e retomar a negociação do zero um mês depois, quando voltasse de férias. O dono da empresa voltou atrás e ainda o convidou para jogar tênis em sua casa em Cannes, durante as férias. Os dois ficaram amigos.
Daqui a dez anos – Espera trabalhar um pouco menos e ver o escritório se desenvolver de forma institucionalizada. “Imagino que ele possa se perpetuar e superar a minha existência.”
Dez anos atrás – Estava ajudando na formatação das regras do Novo Mercado, além de trabalhar nas últimas privatizações do País.
Conselho para quem está começando – Ser dedicado, focar no estudo e na percepção apurada. “Depois que as minhas filhas dormiam, eu ia estudar e preparar o trabalho.”
Mania – Jura que não é supersticioso, mas quando cai sal na mesa, joga um pouco para trás. “Não custa também evitar passar por baixo de escada”, brinca.
Otimismo x pessimismo – Sempre foi otimista. “Continuo sendo, mas estou um pouquinho mais cuidadoso”.

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