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Modelo europeu para OPAs pode engessar mercado brasileiro
Giovani Ceccon*

Giovani Ceccon*

Berço de práticas e regras comerciais que por séculos influenciaram o mundo, o velho continente continua servindo de modelo em regulamentação. Mesmo países que não pertencem à União Europeia reproduzem as legislações emanadas por seu legislativo — tendência que, no direito corporativo, não é diferente no Brasil. Por aqui, acompanhamos nos últimos anos o surgimento de segmentos de adesão voluntária no mercado de ações. O problema é que seguir à risca o exemplo europeu pode engessar o mercado brasileiro em algumas situações, principalmente em razão do alto custo que uma OPA (oferta pública de aquisição de ações) obrigatória pode representar.

Além dos níveis diferenciados da BM&FBovespa, foi criado o Comitê de Aquisições e Fusões (CAF), que promove a autorregulação do mercado de capitais. Essas iniciativas consagram a premissa de que o mercado deve ser livre para se regular e, assim, atingir grau máximo de eficiência com base em sua própria natureza, sem interferência do legislador. O que é tido como um passo evolutivo não está, todavia, isento de críticas e possíveis vieses.

A Bolsa promove, até 9 de setembro, audiência pública a respeito da reforma do Novo Mercado. Dentre as propostas de mudança (como hoje já é previsto no caso do CAF), a BM&FBovespa pretende adotar no regulamento sugerido o critério do controle presumido, com percentual de 30%, para a incidência obrigatória da OPA — o CAF define como posição relevante aquela com percentual entre 20% e 30% do capital social.

A inspiração para a nova regra vem do britânico Takeover Panel — que, por sua vez, influenciou a diretiva europeia relativa às OPAs. No caso, a regra europeia estipula o percentual presumido para se determinar a posição de controle de uma companhia, em geral fixado em 30% das ações com direito a voto. Uma tendência já amplamente difundida na Europa.

No Brasil, o artigo 254-A da Lei das S.As. adota o critério do controle de fato, segundo o qual ele é estabelecido pela posição do controlador que tem maioria das ações com direito a voto, sem um percentual predeterminado. O CAF, assim como agora sugere a BM&FBovespa, permite que companhias abertas adotem a OPA obrigatória com base no modelo europeu. Se implementada essa mudança e empresas igualmente aderirem ao regulamento do CAF, a consequência poderá ser um mercado menos competitivo nas negociações envolvendo o controle das companhias. A nova situação inibiria transações que poderiam aumentar eficiência, por causa do alto custo que a OPA representa — engessando, assim, o mercado.

Tanto no controle presumido como no controle de fato, em caso de transferência do controle societário, o adquirente deve lançar a OPA para aquisição das ações dos demais acionistas. Essa ferramenta é imposta por muitas outras jurisdições, visando à proteção do direito de saída dos acionistas minoritários quando se deparam com uma nova realidade de comando da companhia. A OPA estende também aos minoritários a participação no prêmio que o adquirente está disposto a pagar pela posição de controle (diferença entre o valor de mercado das ações e o valor pago pelo adquirente). Desse modo, os demais acionistas poderão deixar a companhia em condições paritárias às do controlador alienante. Para uns, a OPA estimula, assim, a participação dos acionistas minoritários no mercado de capitais; para outros, os custos da OPA impediriam que empresas passem a um controlador apto a torná-las mais eficientes.

Surge, ainda, uma outra questão: podem conviver os critérios de fato (já previstos na nossa legislação) e o presumido (adesão voluntária)? A resposta é sim. E, ressalte-se, não há conflito. No entanto, as companhias aderentes estarão sujeitas a mais uma modalidade de OPA além das previstas no nosso ordenamento jurídico.

No modelo europeu, pelo critério presumido, já se constatou que as transferências acionárias podem acontecer à margem do direito de saída dos minoritários. A fórmula da UE tem algumas brechas que permitem aquisição além do percentual presumido do capital social de uma companhia conforme previsto em lei, sem que isso dispare a incidência da OPA.

O Brasil tem uma jurisdição de capital concentrado, e o percentual presumido atende a essa realidade. Em muitos países europeus, o capital social das companhias é diluído, o que gera infindáveis debates. Há, portanto, que se estar atento e, se adotada a regra, buscar aperfeiçoamento dos critérios de incidência da OPA para, no futuro, não se atingir o oposto da finalidade pretendida — que, em última análise, é um mercado eficiente e dinâmico para a sustentabilidade e o crescimento da economia.

A grande vantagem de termos tais regras previstas apenas em segmentos especiais de adesão voluntária é permitir que o mercado siga suas leis naturais, incorporando ou não os dispositivos. Já no caso do CAF, que há alguns anos abre a oportunidade para que empresas brasileiras adotem o percentual presumido, verifica-se uma falta de interesse do mercado em razão da baixa adesão das companhias nacionais às regras por ele propostas.


*Giovani Zeilmann Ceccon ([email protected]), especialista em direito de M&A, integra a banca Silveiro Advogados e é advogado europeu atuando na Dinamarca


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