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Início do fim
Proposta da CVM de divulgar fato relevante em sites de notícias pode ser o primeiro passo rumo à desobrigação das publicações em jornal

, Início do fim, Capital AbertoO uso da internet na área de relações com investidores está prestes a ser significativamente ampliado. No fim de agosto, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) colocou em audiência pública uma minuta que altera a Instrução 358, de 2002, que trata da divulgação de ato e fato relevante. Pelas regras atuais, as companhias são obrigadas a publicar esses comunicados em jornais de grande circulação. Porém, se a minuta for aprovada, a empresa poderá substituir essa prática, ou complementá-la, pela reprodução de seus fatos relevantes em três portais de notícia on-line. O objetivo da proposta é reduzir os custos das companhias abertas e tornar mais ágil e fácil a difusão de informações relevantes — aquelas com potencial de influenciar a decisão do investidor de negociar ações ou de causar significativa oscilação nos preços.

Hoje, na prática, os fatos relevantes estão velhos quando saem no jornal. No dia anterior, eles já foram divulgados nos sites da companhia, da CVM, da BM&FBovespa e em agências de notícias especializadas em difundi-los assim que são publicados no portal do regulador. Muitas companhias também enviam esses comunicados diretamente aos investidores cadastrados em seu mailing. “A possibilidade de reproduzir os fatos relevantes apenas na internet é muito positiva, pois dá mais agilidade às informações, num mercado em que o timing é algo crucial para a tomada de decisões”, avalia Antonio Castro, presidente da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca).

Na minuta submetida a audiência pública, o regulador é bastante genérico ao falar dos portais. Não especifica quais características eles precisam ter para serem escolhidos e tampouco dá informações de como espera que os fatos relevantes sejam expostos. Diz, apenas, que eles devem ser publicados na íntegra e acessados gratuitamente pelo investidor. Para evitar falhas de comunicação, exige que as empresas informem, na política de divulgação e no formulário cadastral, quais sites irão usar. Gustavo Gonzalez, chefe do gabinete da presidência da CVM, afirma, porém, que a expectativa é que as empresas escolham os sites de maior audiência. “Os próprios jornais deverão explorar esse mercado, e novos players poderão aparecer”, diz Julia Ferretti, conselheira do Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (Ibri). Alguns portais deverão cobrar pela reprodução, mas há também a expectativa de que outros aceitem publicar os fatos relevantes de graça, para atrair tráfego.

Apesar de aprovar a iniciativa da CVM, Carlos Augusto Junqueira, sócio do escritório de advocacia Souza, Cescon, Barrieu & Flesch, acredita que apenas as novatas da bolsa devem optar por divulgar seus fatos relevantes exclusivamente na internet. “Nas antigas, a tendência é agregar os portais à publicação no jornal”, opina. Algumas companhias preferem manter a difusão em meio impresso como forma de se resguardar. Apesar de a internet ter se popularizado, ainda está longe de atingir todo o Brasil. Segundo um levantamento citado pela autarquia no edital de audiência pública, 46% da população brasileira (88,5 milhões de pessoas) tinha acesso à rede mundial em 30 de junho de 2012. Sabe-se, contudo, que a conexão aos dados ainda é bastante lenta para boa parte desses usuários. Outro aspecto é o da segurança da informação. O receio é que hackers invadam os portais e postem fatos relevantes falsos. Segundo Gonzalez, caberá às empresas checar se os sites reproduziram adequadamente o material enviado.

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Gasto necessário?

Apesar de possibilitar a redução de custos pelas companhias abertas, a proposta da CVM não agradou a todos. William Eid Jr., coordenador do Centro de Estudos em Finanças (GVcef) da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP), é contrário: “Quanto mais informações e transparência, mais confiança. Retirar canais de informação pode prejudicar o mercado”, afirma o professor. Ele cita um estudo da faculdade intitulado Custos de manter uma sociedade anônima no Brasil, de dezembro de 2012, segundo o qual as companhias de capital aberto do País gastaram R$ 77,5 milhões para divulgar 3.690 páginas de demonstrativos financeiros e outras publicações legais em jornais de grande circulação no primeiro semestre de 2011. Examinada isoladamente, a quantia assusta, mas representou, de acordo com o levantamento, 0,0043% da receita líquida total dessas companhias no período — R$ 1,8 trilhão.

Entre os que apoiam a medida, a expectativa é que ela pavimente o caminho para que outras publicações compulsórias em jornal caduquem. “Se a experiência com os fatos relevantes for positiva, esse pode ser um argumento para se discutir mudanças mais profundas”, acredita o advogado Gustavo Rugani do Couto, do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice. Gonzalez, da CVM, admite que os resultados devem servir de base para discussões similares, como permitir que as companhias divulguem o anúncio de início de distribuição de uma oferta pública, no âmbito da Instrução 400, pela internet. Hoje, segundo a norma, o anúncio deve ser feito no jornal em que a emissora normalmente difunde seus avisos.


, Início do fim, Capital AbertoPrivilégios mantidos

Enquanto a autarquia moderniza suas regras em favor das companhias, a Lei das Sociedades por Ações se mantém estática. Entre as obrigações que impõe, está a publicação das demonstrações financeiras e avisos aos acionistas em jornal de grande circulação do estado em que a companhia tem sede, ou onde está instalada a bolsa na qual as ações são negociadas, e, também, no Diário Oficial da União, do Distrito Federal ou do estado onde ela está sediada.

Em 2011, um artigo da Medida Provisória 517, aprovada pelo Congresso Nacional, tentou minimizar essa obrigatoriedade, mas acabou vetado pela presidente Dilma Rousseff. O dispositivo isentava as empresas com faturamento inferior a R$ 500 milhões de reproduzir demonstrações financeiras e atos societários no Diário Oficial, exigindo apenas que divulgassem uma versão resumida desses relatórios em jornais de grande circulação, juntamente com a íntegra na internet. Para as pequenas e médias empresas, o veto foi um balde de água fria: “Gastamos mais com publicidade legal do que com auditoria externa”, compara Ricardo Pansa, diretor da Nutriplant, empresa com ações negociadas no Bovespa Mais.

A difusão das demonstrações financeiras nos maiores jornais tem ainda muitos defensores. “Ao contrário dos fatos relevantes, que são facilmente acessíveis pela internet, as demonstrações financeiras precisam ser publicadas em jornais de grande circulação, já que ainda são poucos os brasileiros com acesso à banda larga”, defende Roberto Vertamatti, diretor de economia da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac). Como nossa conexão, mesmo por banda larga, é de baixa velocidade, consultar as demonstrações exclusivamente pela rede seria uma tarefa exaustiva para a maioria dos investidores, segundo o diretor.

Se a reprodução em jornal ainda tem apoiadores, a divulgação de balanços nos diários oficiais conta com o amparo de poucos. Não só porque raros leitores os utilizam — a tiragem do Diário Oficial de São Paulo é estimada em 2 mil exemplares —, mas também em razão dos altos preços desses veículos. Por deterem monopólios, eles cobram pelo menos o triplo do pedido pelos grandes jornais. O lobby dos diários oficiais, no entanto, é bastante forte. O projeto de lei 5.061, do deputado Anthony Garotinho, a propósito, prevê o fim da obrigatoriedade de publicação das demonstrações nos grandes jornais, mas não nos diários oficiais. Atualmente, o projeto tramita na Câmara.

Para o jurista e advogado Modesto Carvalhosa, do Carvalhosa e Eizirik Advogados, as iniciativas de eliminar a difusão das demonstrações nos diários oficiais evidenciam falta de cultura jurídica e a tentativa de importar o modelo americano: “A publicação no Diário Oficial dá fé pública e perpetuidade às demonstrações financeiras”, afirma. Segundo o advogado, o papel é uma prova permanente de que a empresa divulgou as demonstrações na época certa e cumprindo as exigências: “Publicar as demonstrações apenas na internet seria como deixar de registrar um imóvel no cartório e fazê-lo apenas pela internet”, compara. Para quem defende o outro lado, a iniciativa da CVM cria a chance de a experiência contrariar — ou não — essa tese.


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