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A realidade por trás da chinese wall
Ivo Bari*

Ivo Bari*

A barreira intransponível, com sua existência perene, é de fato uma bela inspiração. Não foi à toa que no período pós-crise de 1929 o mercado recorreu à imagem da maior muralha do mundo para nomear uma das ferramentas mais importantes na regulação econômica moderna. A chamada chinese wall representa a prática de segregação de atividades e a imposição de barreiras entre as várias áreas de uma instituição, de modo a impedir o fluxo de informações confidenciais de pessoas que as detêm para pessoas que não as podem deter. Um dos principais intuitos desse mecanismo é garantir que assessores de transações não contaminem gestoras de recursos e áreas de research com suas informações privilegiadas — e vice-versa —, preservando-se um mercado no qual decisões de investimento não são tomadas com vantagens competitivas ilegais.

O arcabouço normativo brasileiro relativo ao assunto se inicia nos deveres fiduciários dos administradores, segue com a obrigação de guarda de sigilo das informações relevantes — Instrução 358 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) — e culmina nas instruções específicas para as atividades de maior risco. A Instrução 558, por exemplo, determina que administradores de carteiras de valores mobiliários devem assegurar o controle de informações confidenciais a que seus colaboradores tenham acesso; a Instrução 483, aplicável às áreas de research, determina até que essas equipes fiquem segregadas fisicamente das demais áreas da instituição regulada.

Em resposta, os regulados adotam políticas e regimentos internos fortes, bem amarrados, e que dizem promover as melhores práticas de governança. São, muitas vezes, documentos extensos, complexos e sofisticados (até demais).

Agora, ter esses manuais perfeitamente redigidos e aprovados é suficiente para resolver o problema? A CVM diz que não.

No PAS CVM no RJ2009/13459, certas empresas de um grupo bancário foram investigadas por insider trading envolvendo units de uma companhia aberta. Funcionários do banco em questão detinham informações não públicas da companhia, por estarem trabalhando em uma operação dessa empresa; e, entre a obtenção da informação e sua divulgação ao mercado, outras entidades do conglomerado financeiro negociaram valores mobiliários da companhia. A defesa alegou que as operações foram feitas por uma pessoa específica, que não teria acesso à informação privilegiada. Ou seja, segundo a defesa, não houve vazamento de informações entre quem tinha o “insider” e quem fez o “trading”.

Na avaliação da CVM, o argumento é frágil, e a higidez da tese depende da efetiva comprovação da segregação das atividades. A simples existência de práticas e manuais internos de chinese wall e o cumprimento formal dos requisitos legais, sem comprovação de que estes são aplicados nos casos concretos, não protegem os acusados de responsabilização.

A CVM somente acatará o argumento se vier acompanhado de provas de que, na prática, a segregação de atividades e informações preveniu o uso indevido das informações privilegiadas. Recai-se no livre convencimento do julgador e no fato de que cabe ao interessado provar o que tiver alegado. Os acusados precisam montar conjunto probatório suficiente para comprovar que, apesar de seus funcionários terem obtido informações privilegiadas, as negociações não foram nelas fundamentadas. Ficou decidido pelo regulador que enviar um manual de normas internas do grupo não é suficiente e os acusados foram condenados ao pagamento de multa.

Já é claro que a substância e a realidade ganham da mera forma. Assim, só resta aos agentes de mercado tirar seus manuais do papel, implementar de fato os controles internos devidos e efetivamente construir as próprias muralhas intransponíveis.


*Ivo Bari ([email protected]), associado da prática de societário e M&A do Tauil & Chequer Advogados


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