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A bem-vinda regulamentação do lobby no Brasil
Criação de diretrizes para a atividade integra programa do futuro ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sérgio Moro
André Vasconcellos

André Vasconcellos* /Ilustração: Rodrigo Auada

O Brasil está hoje diante de um Estado assolado por anos de gestão pública ineficiente e de uma crise de representatividade sem precedentes, cenário que tende a causar uma certa confusão em relação às atividades dos profissionais de defesa de interesses, mais conhecidos como lobistas. Lamentavelmente, depois de anos acompanhando as descobertas estarrecedoras de operações da Polícia Federal e seus desdobramentos1, o cidadão muitas vezes associa o termo lobista a alguém com comportamento antiético e relacionado a práticas ilícitas. Mas, diferentemente dessa noção, trata-se de uma prática secular e importante, fruto de pluralismo político, ideológico e econômico das sociedades.

O lobby designa a influência, meramente consultiva e informativa, de indivíduos ou organizações, na condição de sujeitos ativos, sobre entes governamentais em ações específicas de interesse público. A intenção é fortalecer e expandir a participação popular nos trabalhos legislativos e na formulação de políticas. Ocorre que a atividade pode ser orientada tanto a favor do interesse da sociedade quanto em direção a benefícios particulares, sejam de empresas ou segmentos sociais — eis a linha tênue que separa o legítimo do ilegítimo e o ético do imoral. Dada essa sutileza, o lobby deve ser tutelado pelo Estado, em favor do combate à corrupção e da geração de emprego e renda. O trabalho, entretanto, não envolve apenas transparência, com publicidade das agendas de gestores públicos e parlamentares e das ações resultantes dessas relações: é preciso que se informe os interesses originários envolvidos.

A boa notícia é que a regulamentação do lobby no Brasil — necessária para se diferenciar as pressões de poderosos setores das representações de minorias que também precisam se fazer ouvir — faz parte do programa que o futuro ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, pretende implantar, ao lado do uso de novas tecnologias para tornar a Câmara dos Deputados mais transparente e acessível à população, da criação de uma política nacional de dados abertos, do aperfeiçoamento da Lei de Acesso à Informação e da exigência de compliance em grandes licitações.

O lobby deve ser tutelado pelo Estado, em favor do combate à corrupção e da geração de emprego e renda.

A atividade de lobby advém do ordenamento jurídico brasileiro. É a Constituição Federal que compatibiliza essa prática, ao assegurar os direitos de liberdade de manifestação de pensamento, de reunião e associação para fins lícitos e de petição aos poderes públicos. Mas a omissão do legislador em disciplinar parâmetros normativos — como cadastro de lobistas, elaboração de relatórios periódicos sobre gastos com a atividade de lobby, divulgação de lista de interesses e contatos realizados e pleno acesso público a essas informações — provoca equívocos e a frustração no exercício dessa atividade. Assim, é urgente uma regulamentação, acompanhada de instrumentos que garantam a eficácia da lei e de previsão de sanções para o não cumprimento de exigências relativas a transparência e integridade.

No cenário mundial, destacam-se as regulamentações federais de amplo alcance nos Estados Unidos e no Canadá. A legislação americana, por exemplo, atinge tamanho detalhamento que determina que indivíduos, empresas e demais organizações declarem trimestralmente informações como valores gastos, o assunto (objeto do lobby) e a área da administração pública alvo da ofensiva. A experiência internacional evidencia que não basta dar transparência ao lobby; é igualmente necessário garantir a integridade e a eficácia das atividades de pressão.

A regulamentação do lobby qualifica o debate técnico, atende aos anseios sociais, salvaguarda a confiança pública nas instituições e no processo democrático e fortalece, em prol da modernização legislativa, as relações entre Estado e cidadãos — sob a orientação de ideais republicanos e com a plena utilização dos instrumentos democráticos. O lobby é, de fato, importante para uma administração pública produtiva, pois corrige distorções de conhecimento técnico e notifica o agente público sobre demandas de ampla sensibilidade política, jurídica e empresarial. A atividade pode promover, dessa forma, maior higidez e eficiência na tomada de decisões governamentais.


*André Vasconcellos ([email protected]), especialista em direito societário e mercado de capitais, membro da comissão de compliance e governança do Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (Ibri)

1Satiagraha (8/7/2008), Castelo de Areia (25/3/2009), Caixa de Pandora (27/11/2009), Lava Jato (17/3/2014), Zelotes (26/3/2015), Acrônimo (29/5/2015) e Calicute (17/11/2016) são os destaques.

 


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