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Operações anticorrupção reavivam contrato de indenidade
Nair Veras Janson*

Nair Veras Janson*

A empreitada do Ministério Público Federal, do Judiciário e da Polícia Federal para combate a corrupção e lavagem de dinheiro deflagrada com a Operação Lava Jato teve forte impacto sobre as companhias envolvidas e seus administradores. Milhões já foram bloqueados judicialmente. A situação expõe a vulnerabilidade dos executivos — que, se não for neutralizada por seguros D&O (directors and officers liability insurance) ou mecanismos equivalentes, pode afastar do mercado os melhores profissionais.

Em reação ao aumento da sinistralidade e dos sucessivos episódios de corrupção, as seguradoras ou descontinuaram a oferta do D&O no Brasil ou elevaram os valores de prêmios e reduziram as coberturas. Há casos de exclusão, por exemplo, da cobertura dos elevados custos das investigações — ainda mais quando conduzidas por autoridades estrangeiras. Cumpre também mencionar o maior desastre ambiental do País, causado pelo rompimento de barragem da Samarco, que ilustra as dimensões colossais que o risco ambiental pode ter.

Esse cenário nos leva a revisitar a figura do contrato de indenidade. Trata-se de contrato de indenização firmado entre a companhia e seus administradores, em caráter complementar e subsidiário ao seguro D&O. Ele pode se apresentar como uma alternativa, mas deve ser usado de forma bastante criteriosa, com respeito ao interesse social da companhia.

O instrumento foi analisado pela CVM em duas oportunidades¹. As decisões admitem a existência dos contratos, mas não deixam claro que características assegurariam sua legalidade.

No caso da Kepler Weber, o relator Otávio Yazbek destacou o conflito de interesses como a principal preocupação, lembrando que, nesse tipo de contrato, são os próprios administradores que definem as indenizações e julgam seu mérito. Eles também são os beneficiários do ressarcimento — poderiam, por isso, agir de forma corporativista, acreditando ser possível estarem na mesma situação no futuro.

Apesar do potencial conflito de interesses, o contrato de indenidade não é, em si, ilegal. Mas ainda faltam orientações, conforme expôs a relatora Luciana Dias no caso Banestes. Ela demonstrou que a CVM, ao solicitar no item 12.11 do formulário de referência que a companhia descreva acordos dessa natureza, admite a existência do instrumento. Portanto, a relatora entendeu ser razoável presumir que os arranjos são legítimos.

Vale mencionar que o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), em seu guia de orientação para melhores práticas de comitês de auditoria, recomenda a celebração de contrato de indenidade como instrumento complementar ao seguro D&O para a proteção de administradores².

Certas medidas, no entanto, podem mitigar a chance de conflito de interesses:

• Inclusão de previsão estatutária da possibilidade de indenização dos diretores, membros do conselho de administração e de comitês estatutários pela companhia, em caráter complementar e subsidiário à proteção do seguro D&O, por perdas financeiras decorrentes de atos regulares de gestão praticados de forma diligente, de acordo com a boa fé e visando ao interesse social (isso se os atos tiverem sido praticados em conformidade com a lei e o estatuto social e sem a configuração de culpa grave ou dolo);
• aprovação prévia por assembleia geral de minuta padrão do contrato de indenidade e de um valor máximo de reembolso, que poderá ser revisto anualmente e em situações extraordinárias;
• vedação da participação de administrador ou membro de comitê estatutário que estiver pleiteando a indenidade na reunião do órgão que deliberar sobre o pagamento dos valores e também de qualquer outro administrador envolvido na mesma demanda;
• contratação de um terceiro independente para emitir parecer sobre o reembolso quando o valor da indenização superar certa quantia.

O contrato de indenidade, em caráter complementar e subsidiário ao D&O, desde que elaborado, aprovado e implementado de forma a afastar as situações de conflito de interesses, é um instrumento útil às companhias para a captação de bons profissionais no mercado e também um indicativo de boas práticas de governança corporativa.

Deve-se destacar ainda que há um pedido da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), submetido à CVM em junho passado, para a edição de ato normativo ou de orientação sobre aspectos que entende necessários à legalidade dos contratos de indenidade. O mercado aguarda a manifestação da CVM e acompanha o desenvolvimento da adoção desses instrumentos.


1 PAS CVM RJ 2009/8316 e PAS CVM RJ2011/2595
2 Ver item 7.6 do referido Guia, intitulado “Indenidade e Seguro de Responsabilidade Civil para Riscos de Gestão”.


*Nair Veras Saldanha Janson ([email protected]), sócia de Bocater, Camargo, Costa e Silva, Rodrigues Advogados e vice-presidente da comissão jurídica da Abrasca. Colaborou Enrico Lemes Benedet, advogado associado do mesmo escritório


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