Análise distorcida
Informação trimestral prejudica avaliação das companhias e afasta novos emissores da bolsa

, Análise distorcida, Capital AbertoÉ no mínimo inadequado medir o desempenho de uma empresa pelos resultados obtidos em três meses, quando não um equívoco. Ao converter-se em guia para o acompanhamento de analistas e investidores, o informe trimestral (ITR) acaba por esvaziar o conteúdo dos relatórios anuais, causando distorções na análise que, feita trimestre a trimestre, obscurece a visão mais ampla. Avaliar um ano, definitivamente, não é o mesmo que avaliar quatro trimestres separadamente.

O desempenho das empresas deve ser mensurado por períodos compatíveis com seu ciclo de operação. Na atividade agrícola, por exemplo, esse tempo é de um ano. Em setores com ciclo de operação maior, como construção ou infraestrutura, o prazo pode ser mais longo. Em raras situações, como no caso de companhias com projetos em andamento, a informação trimestral pode ser útil, por permitir o acompanhamento da execução dos investimentos. Mas é a apreciação global do exercício que possibilitará uma melhor base para a tomada de decisões.

Essa impropriedade da análise trimestral beira o ridículo quando se avalia o desempenho de países. Uma queda de preços das ações em nossa bolsa em 2012 foi atribuída, por alguns analistas, à frustração do mercado com os resultados do primeiro trimestre do ano na economia chinesa. Esperava-se uma taxa anualizada de crescimento do PIB de 8,4% e veio “só” 8,1%. Ora, a China existe desde 2.200 a.C. — há 4.200 anos ou 16.800 trimestres. Como tomar decisões razoáveis com base em apenas um desses 16.800 trimestres?

Um bom exemplo nos é dado pelo fundo soberano de Abu Dhabi, o Adia, talvez o maior do mundo, com ativos totais de US$ 600 bilhões. Em entrevista recente, seu diretor-geral declarou: “Curto prazo para nós são três ou cinco anos. Mudanças de estratégia não devem acontecer em prazos menores do que dez anos”. O Adia está investindo no Brasil nos setores de educação, bens de capital e infraestrutura, nos quais a unidade de tempo “trimestre” tem relevância mínima.

Não é de se estranhar, portanto, que muitas empresas considerem uma das grandes desvantagens da condição de capital aberto o exagero de informações exigidas pelo mercado. Em resposta, estão fechando o capital ou simplesmente abandonando a ideia de abertura. Segundo Lynn Stout, autor do livro The Shareholder Value Myth, entre 1997 e 2008, o número de companhias listadas em bolsa nos Estados Unidos caiu de 8.823 para 5.401. Em relação à recusa em ofertar ações, dispomos de depoimentos como o de um executivo da Cargill à revista Exame, em outubro último: “Temos mais facilidade em lidar com a volatilidade própria do mercado agrícola. Não precisamos justificar nossos resultados todos os trimestres nem explicar por que um ano ruim não coloca em risco o nosso planejamento de longo prazo”.

O “curto-prazismo” induzido pelo ITR está roubando sentido econômico das bolsas de valores, originariamente concebidas como mecanismo de liquidez e não como cassinos de abrangência mundial. Na Nyse, 60% das operações já são do tipo HFT — realizadas em milissegundos por robôs via algoritmos. No Brasil, essa proporção é de cerca de 10%, com tendência de expansão. Os algoritmos, observa o jornalista norte-americano Christopher Steiner em obra recente, vão acabar substituindo profissionais brilhantes e criativos. Maravilha! Estamos ajudando também a criar o “desemprego qualificado”.


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