Relatórios em forma
Padrões obrigatórios e voluntários deverão tornar mais transparentes a divulgação e a comparação dos desempenhos dos fundos de investimento

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Os gestores de recursos brasileiros podem se aprontar para ingressar num mundo de mais transparência e maior competição. Nesse novo ambiente, a expectativa é que eles sejam mais cobrados pelos investidores, que terão condições propícias para comparar os resultados dos diversos fundos de investimento. Estão em curso ao menos dois movimentos nesse sentido: a revisão da regulamentação vigente no Brasil sobre administração de carteiras; e o início de uma adesão voluntária ao Global Investment Performance Standards (GIPS), um padrão de divulgação de desempenho de fundos de investimento criado pelo CFA Institute, organização de origem norte–americana conhecida pela famosa certificação internacional de analista de investimento.

Algumas gestoras de recursos (asset managers) de instituições brasileiras estão se preparando para seguir o GIPS. A asset do Itaú Unibanco nos Estados Unidos tende a ser uma das primeiras a adotar o padrão, e a HSBC Asset Management e a Bradesco Asset Management (Bram) também avaliam essa possibilidade. O HSBC usa o modelo do CFA Institute no Reino Unido e em Hong Kong, mas ainda discute a adesão da administradora de recursos brasileira aos padrões. Na Bram, o tema está em análise. “A conformidade com o GIPS seria interessante para estrangeiros, mas não é um fator crítico de atração desse tipo de investidor”, pondera Denise Pavarina, diretora do braço de gestão de recursos do Bradesco.

LÍNGUA COMUM — A adesão ao GIPS amplia o acesso potencial a investidores estrangeiros, mais familiarizados com os relatórios adaptados a esses princípios. Em dezembro, o padrão era difundido em 34 países. O CFA Institute sempre procura ter um patrocinador do GIPS em cada mercado, cujo papel é promover o modelo localmente, ajudar na interpretação das regras e fazer a interlocução com o comitê executivo do GIPS. Esse agente pode ser uma associação de administradores de recursos, de fundos de pensão, ou uma entidade que congregue analistas de investimento. O último país a definir um patrocinador foi o Peru. O plano do CFA Institute é conseguir novas adesões nos países emergentes, chegando a Índia, China e Brasil — a Rússia já tem um patrocinador doméstico. “Estamos ansiosos para expandir nossa rede de patrocinadores pela América Latina”, diz Jonathan Boersma, diretor executivo do CFA Institute responsável pelo GIPS.

Tudo se encaminha para que o patrocinador brasileiro seja a Associação Nacional de Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). A instituição discutiu a questão nas reuniões do comitê de renda fixa, mas ainda precisa aprovar a matéria em sua diretoria. É ponto pacífico no CFA Institute a boa reputação da indústria de fundos de investimento brasileira. “O mercado é bem regulado e não há questões estruturais que possam impedir a conformidade com o GIPS”, afirma Boersma.

O diretor do CFA estima que centenas de gestores mundo afora estejam alinhados ao padrão. Nos Estados Unidos e na Grã–Bretanha, eles representariam 85% a 95% das assets. “Numa concorrência internacional, ter o GIPS não é garantia de vitória, mas não tê–lo é sair um passo atrás”, observa João Santos, sócio da PwC. Num primeiro momento, portanto, a adoção desse regime interessa principalmente aos gestores de recursos que estão em processo de internacionalização. Mas não é só o investidor de fora que ganha com isso. Os locais também podem ser beneficiados.

RETRATO FIEL — Para o investidor, a vantagem é o GIPS ter se tornado uma espécie de garantia da acurácia da rentabilidade do fundo de investimento, pois indica que o gestor se comprometeu a seguir um comportamento ético e transparente. Além disso, a padronização trazida pelo GIPS proporciona a comparação do desempenho de fundos de diversas nacionalidades. Outro benefício é a prevenção de uma artimanha conhecida como “cherry–picking”, isto é, a escolha do melhor ângulo para a apresentação de uma imagem parcial e conveniente da realidade. O GIPS estabelece os períodos em que a rentabilidade deve ser reportada e procura dar uma visão geral da atuação do gestor. A instituição aderente ao padrão não pode incluir somente os fundos mais rentáveis no sistema. Deve divulgar informações padronizadas sobre seu cardápio completo de produtos.

“A ideia é mostrar como o gestor se comportou em todos os tipos de mandatos que tem, tanto nos anos bons como nos ruins”, explica Santos. Uma das regras básicas é o agrupamento dos fundos com mandatos de gestão parecidos, formando os chamados “composites”. Um gestor com três fundos de ações ativos, três passivos no Ibovespa e três no índice IBX, por exemplo, teria três composites, um de cada tipo de fundo. O objetivo é evitar que a escolha de um produto pouco representativo do todo distorça a leitura. Os relatórios com os desempenhos dos composites são divulgados anualmente, com históricos dos últimos cincos anos. O resultado é calculado por meio de uma metodologia específica para avaliação de ativos.

Para que as informações espelhem o desempenho real do gestor, são cortados do relatório os fundos com patrimônio muito baixo — menos representativos, já que a gestão tende a ser mais fácil — e aqueles sem gestão discricionária, ou seja, em que o gestor só cumpre ordens de um terceiro, geralmente um investidor institucional. O relatório considera também o desempenho de fundos extintos, para que não sejam contadas somente as histórias de sucesso. Embora o usuário não tenha obrigatoriamente de passar por uma auditoria, a validação por um terceiro é recomendada pelo comitê executivo do GIPS.

A adesão ao GIPS amplia o acesso a investidores estrangeiros, pois o padrão é usado em mais de 30 países

ADESÃO OBRIGATÓRIA — Mesmo que os gestores brasileiros não queiram receber esse selo, uma padronização compulsória dos relatórios de desempenho está prestes a entrar em cena. Ela faz parte da reforma da Instrução 409 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que disciplina a constituição, a administração, o funcionamento e a divulgação de informações dos fundos de investimento. Uma parte da revisão das normas foi concluída em dezembro, com a edição da Instrução 512. A mudança permite a compra de Brazilian depositary receipts (BDRs) Nível 1 não patrocinados a fundos de investimento dirigidos a investidores qualificados e modifica o conteúdo dos chamados “informe diário” e “perfil mensal”, publicados pelos administradores. A CVM quer elevar o grau de transparência desses documentos, pedindo a simulação de cenários de estresse e o nível de liquidez das carteiras, por exemplo.

A expectativa é que a outra parte da atualização da Instrução 409 seja apresentada no primeiro trimestre deste ano. As regras que virão têm como finalidade permitir que investidores não qualificados — ou seja, os de varejo — tenham mais insumos para fazer escolhas conscientes. Para isso, pensa–se em facilitar a confrontação dos dados por meio da padronização das informações contidas na lâmina de informações essenciais, já usada por grande parte do mercado; e da criação de um novo informe, a demonstração de desempenho. “A lâmina padronizada e a demonstração de desempenho serão ferramentas importantes para o investidor comparar os resultados”, diz Flávia Mouta Fernandes, superintendente de desenvolvimento de mercado da CVM.

A lâmina é o material publicitário que traz as informações básicas sobre o fundo. Ela passará a apresentar obrigatoriamente uma tabela com os retornos anuais da carteira. A proposta é elevar o histórico dos dados sobre o desempenho (track record), dos atuais três para cinco anos, e ressaltar os períodos em que houve rentabilidade negativa. As lâminas poderão ser consultadas por todos na internet.

Já a demonstração de desempenho deverá ser enviada anualmente pelos administradores para os cotistas do fundo até o último dia útil de fevereiro. A intenção por trás desse informe é que os clientes consigam enxergar os custos de investir em determinado fundo. Para isso, terão acesso a uma lista de despesas como as taxas de administração e de performance, além dos gastos com auditoria e custódia. Tanto a lâmina como a demonstração trarão um exemplo que permitirá uma comparação clara com outros fundos: quanto um investidor que houvesse aplicado R$ 1 mil no início do ano teria no fim, sem nenhum outro aporte ou resgate. Dessa forma, ficará mais fácil enxergar os impactos do pagamento de impostos, taxas e despesas no montante aplicado.

A CVM se apoiou em diretrizes criadas pela International Organization of Securities Commissions (Iosco), instituição que reúne as agências reguladoras de mercados de capitais do mundo, para a divulgação de taxas e despesas de fundos de investimento.Esses princípios são baseados em conceitos similares aos do GIPS. Com adesão voluntária ou obrigatória, a padronização, ao que parece, veio para ficar.

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