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O boom das assets independentes
Combinação de juro baixo com plataformas abertas faz surgirem 71 novas casas de investimento em apenas nove meses
O boom das assets independentes

Ilustração: Rodrigo Auada

O cenário não poderia ser mais favorável e o resultado não poderia ser diferente. A combinação de juros baixos — circunstância que leva os investidores a procurar ajuda especializada para obter retornos maiores que os garantidos pelos títulos públicos — com a abertura das plataformas de investimento deu um grande impulso aos gestores de recursos independentes. Hoje eles têm demanda por seus serviços e podem mostrar o que oferecem em vitrines antes reservadas a grandes players. Não à toa, o ritmo de surgimento de casas novatas é vertiginoso: a quantidade de gestores e administradores registrados na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) aumentou 73% nos nove primeiros meses de 2018 na comparação com igual período do ano anterior. No total, 71 novas casas foram autorizadas a operar nesse intervalo, de acordo com números levantados pela CAPITAL ABERTO, quase todas desvinculadas de instituições financeiras tradicionais. A configuração é de um boom, que deve persistir desde que a situação econômica do País não sofra mais um revertério.

Aos poucos, os independentes abocanham um percentual maior do patrimônio de 4,5 trilhões de reais que compõe a indústria brasileira de fundos de investimento. Gustavo Pires, responsável pela plataforma de fundos da XP Investimentos, estima que os gestores ligados a instituições financeiras representavam 75% do patrimônio dos fundos mútuos em 2016; no último trimestre de 2017, eles estariam com 68%. Sob sua perspectiva, gestoras como BTG Pactual Asset Management e Safra Asset Management, embora carreguem as placas de instituições tradicionais, são consideradas independentes por causa de seu portfólio de produtos e, no caso do BTG, porque o banco não tem operação de varejo.

“Os gestores estão se desbancarizando”, afirma Pires. Profissionais que trabalhavam em bancos gerindo os recursos das próprias instituições financeiras (na tesouraria) ou de terceiros hoje olham para o sucesso dos independentes e sentem-se motivados a montar as próprias assets. Um dos casos inspiradores é o da Adam Capital, de Marcio Appel, ex-gestor do Safra Asset Management. Ele fundou uma casa de investimentos em 2016 e já conta com patrimônio de 29,2 bilhões de reais — dado relativo a outubro de 2018, segundo a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

Felipe Guerra, que era da tesouraria do Santander, obteve registro da CVM para a operação da Legacy Capital, em dezembro de 2017. Seu fundo multimercado foi lançado em junho passado, e a gestora já tem 1,9 bilhão de reais sob gestão. Marco Antonio Mecchi, que foi por anos da tesouraria do HSBC e posteriormente do Bradesco, foi para a MZK Investimentos em dezembro de 2017 e a casa amealhou 262 milhões de reais para gerir (dado da Anbima referente a novembro de 2018). Outras assets recém-abertas são a Vinland Capital, de André Laport Ribeiro (ex-Goldman Sachs) e James Oliveira (ex-BTG), e a Tork Capital, de Marcelo de Magalhães (ex-JGP).

O aumento do número de gestores de recursos também resulta da cisão de algumas casas independentes, como a Gap, ou da separação de sócios. Ivan Guetta, ex-Gap, montou a Gap Equities em 2017 e levou consigo os fundos de ações. José Alberto Tovar saiu da ARX Investimentos para fundar com Bruno Garcia e parte da antiga equipe a TRUXT Investimentos, que abriu à captação em 2017.

Ambiente favorável

Não há dúvidas de que os juros baixos e a necessidade dos investidores de buscar rendimentos adicionais por meio de aplicações mais arriscadas são condições sine qua non para que esse movimento se sustente e ganhe força. “Mas se o Brasil não avançar ou se houver um forte movimento de aversão a risco no exterior pode ocorrer o contrário: um desestímulo para a migração a produtos mais sofisticados”, avalia Marcelo Mello, vice-presidente da SulAmérica Investimentos. Por enquanto, o otimismo prevalece.

Um novo sistema de distribuição é a outra parte indispensável da equação. Neste início de 2019 múltiplas plataformas distribuem fundos de terceiros, com destaque para XP Investimentos, Guide, Órama, Easynvest, BTG Pactual Digital, Rico, Ativa, Genial, Modal Mais, Mirae, Banco Original, Banco Inter. E outras devem chegar ao mercado. “As plataformas deram escala para pequenos gestores e ajudaram a solucionar o principal desafio das casas de investimentos, que é a dificuldade de distribuição dos fundos”, afirma Rafael Mazzer, portfolio manager da área de gestão de fortunas do BTG Pactual.


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O mercado que as plataformas vêm desbravando não é nada desprezível. Tampouco poderia passar despercebido aos sempre atentos olhos de gestores de recursos treinados para buscar oportunidades. Em 2014, por exemplo, a XP Investimentos distribuiu 2 bilhões de reais em fundos de vários gestores, volume que catapultou para a marca de aproximadamente 70 bilhões de reais no fim de 2018. Uma simples conta de padaria pode mostrar que, tendo esses fundos uma hipotética taxa de administração de 1% ao ano, gera-se uma receita de 700 milhões de reais — montanha de dinheiro a ser partilhada pelos 100 gestores cujos fundos de investimento são distribuídos pela plataforma. “A XP e outras plataformas estão fomentando a desbancarização. É razoável supor que o número de gestores vai continuar crescendo”, acredita Pires.

O movimento se retroalimenta porque os próprios bancos estão sendo levados a oferecer produtos de outros gestores, numa estratégia para não perder mercado. Muitas estruturas até então fechadas, como a do Bradesco, estão passando a trabalhar com alguma abertura e oferecendo fundos mútuos geridos fora de casa.

Empurrão    

Uma força extra vem do incentivo dado por vários alocadores de recursos, como o BTG Pactual, que assessora e aporta capital nos fundos mútuos de gestores que têm bom desempenho e estratégias de investimento diversificadas. O BTG faz análises quantitativa e qualitativa dos gestores para ofertar seus produtos aos clientes e oferece às novas casas uma assessoria que envolve a conscientização sobre a importância de se ter um passivo saudável, com investidores diversificados, a formação da marca e a importância do histórico de desempenho. “A viabilidade das casas de gestão de recursos está ligada ao trabalho feito ex-ante”, considera Bruno Brito, que atua na área de gestão de fortunas do banco e é responsável pela seleção de fundos.

Em alguns casos, a instituição aporta recursos dos fundos exclusivos geridos pela BTG Pactual WM já no momento de lançamento dos portfólios das novas assets. Foi o que aconteceu com a Vinland Capital Management, a Legacy Capital e a Tork Capital, todas estreantes. Os valores dos aportes não são divulgados. Mas se antes era necessário que um gestor acumulasse um patrimônio de pelo menos 100 milhões de reais e até três anos de bons desempenhos para bater às portas das áreas de private banking e family offices, hoje alguns conseguem pular essa etapa e já nascem grandes. A Vinland possui 1,3 bilhão de reais sob gestão; a Legacy, fabulosos 1,9 bilhão de reais.


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Para o BTG Pactual, a atividade da assessoria e a proximidade a bons gestores são vistas desde o início como vantagens competitivas. “Buscamos novas histórias para acomodar o capital dos clientes”, diz Brito. A parceria precoce oferece vantagens comerciais na distribuição dos fundos e, ao mesmo tempo, maior acesso aos produtos e aos gestores. Como muitos dos bons fundos acabam fechando para captação por causa das possibilidades ainda restritas do mercado de capitais brasileiro, a parceria acaba facilitando o acesso dos clientes afortunados do banco a esses gestores cobiçados.

Mazzer ressalta outro fenômeno interessante, embora não necessariamente recente, mas que deve ganhar força: a atuação de gestoras fora do eixo Rio-São Paulo. Nesse rol, com sede em Belo Horizonte, estão a Butiá Investimentos, fundada em 2015 e com patrimônio sob gestão de 477 milhões de reais, e a DLM Invista, com 14 anos e 2,4 bilhões de reais. Há também a Quantitas, de Porto Alegre, atuante desde 2011 e com 1,8 bilhão de reais (dados da Anbima, referentes a novembro de 2018).

Ativos incomuns

Por enquanto, a maioria das novas casas privilegia as práticas mais comuns na indústria, como os fundos multimercado. Mas Brito espera que, caso os juros permaneçam baixos, gestoras com outras especializações encontrem espaço — caso da atuação com ativos “distressed”, por exemplo, que envolvem empresas em recuperação judicial ou compra de créditos vencidos, e daqueles “event driven”, que buscam ganhar com eventos corporativos, como fusões, incorporações. “A sensação é que os investidores estarão mais dispostos a escutar histórias de produtos não-correlacionados”, afirma.

Mas há espaço para todos os novos entrantes? A maioria considera que sim, e até para mais casas, se o bom cenário esperado para a economia se materializar e perenizar. “Quem está entrando no mercado vem com seriedade e visão de longo prazo”, observa Pires, da XP. Aos poucos, os profissionais consideram que as barreiras aos novos entrantes devem aumentar, à medida que os gestores independentes já em atuação tenham boas histórias de rentabilidade para contar. Enquanto isso, se as reformas necessárias ao país realmente forem à frente, 2019 tem tudo para testemunhar um crescimento sem precedentes no número de gestores independentes no Brasil.

A nova onda

Registros de gestores e administradores de recursos na CVM

 

Até setembro de cada ano No ano
2014 40 52
2015 46 69
2016 18 28
2017 41 53
2018 71

 

Fonte: CVM


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