Alexandre Póvoa*/ Ilustração: Julia Padula
Ao longo dos anos, profissionais ligados às ciências exatas — da engenharia à física — têm sido cada vez mais demandados no mercado financeiro. Por que a matemática está ganhando importância no estudo de economia e administração? Por que os engenheiros e estatísticos estão invadindo a nossa praia?
Inicialmente, o mundo está ficando muito mais complexo, e a primeira reação das pessoas na tentativa de controlar a situação é “apelar” para a modelagem. A reação natural do ser humano racional ao se ver assolado por uma avalanche de informações é tentar dominar essa complexidade, jogando as variáveis em modelos matemáticos para a geração de soluções hipoteticamente perfeitas. No entanto, a primeira grande dificuldade que qualquer modelo enfrenta hoje, no caso específico do mercado, é a oscilação do grau de importância atribuído a cada variável. Em outras palavras: para explicar o movimento da bolsa o mercado agora pode dar um peso ao fator petróleo, por exemplo, de 50%. Na semana que vem, dada a variação da condição psicológica dos investidores, a relevância desse fator pode ser radicalmente diminuída ou aumentada. Em linguagem estatística, os coeficientes de correlação e os interceptos da regressão (os famosos “betas”) são altamente mutantes ao longo do tempo. A globalização, pelo simples fato de trazer uma quantidade muito maior de variáveis à mesa, agrava essa limitação.
Modelos como o de Black & Scholes viraram praticamente commodities no mercado, que hoje já opera com ferramentas bem mais pesadas. É necessário lidar também com mudanças bruscas do patamar de volatilidade dos ativos, outro pesadelo para quem está à frente de carteiras de investimento. As histórias mais tristes que conheço no mercado financeiro ocorrem quando o gestor, animado com a aparente tranquilidade dos pregões, executa a famosa operação de “venda de volatilidade” (via opções e futuros), que em geral é fortemente impactada nos primeiros episódios de crise ou euforia.
Os chamados fundos quantitativos de qualidade, que usam diversos instrumentos estatísticos para a gestão de portfólios, podem servir como bom produto de diversificação. Os famosos “robozinhos”, que executam ordens a partir de conceitos preestabelecidos, já representam significativa proporção do volume negociado nas principais bolsas do mundo. O grande risco, porém, sempre virá com a quebra de paradigmas — situação que aciona, ao mesmo tempo, ordens de compra ou venda, tornando as tendências muito mais agudas.
É inegável que o mundo tornou-se bem mais arriscado, sobretudo com a velocidade de transmissão de informações e o crescimento do mercado de derivativos. Por isso, a utilização da estatística para se controlar riscos é fundamental para a sobrevivência de qualquer negócio. O uso de instrumentos de proteção virou prática comum também nas atividades empresariais. A escolha entre operações de “perda limitada”, de “travas” ou de alavancagem ajuda muito o gestor de recursos a montar suas estratégias de portfólio.
A tentativa de se estabelecer fórmulas matemáticas para modelagem do mundo financeiro é louvável, mas as chances de sucesso isolado e absoluto, sem um tratamento subjetivo, são baixas. Técnicas quantitativas desempenham um papel importante, principalmente se associadas à visão qualitativa. É sempre bom lembrar do velho ditado americano: “Trash in, trash out” (“lixo dentro, lixo fora”), que nos lembra que de nada adianta montar o melhor sistema do mundo se as premissas que vão alimentar o modelo estiverem erradas. O produto final será inexoravelmente ruim.
Não é incomum um gestor de recursos amargar prejuízos e colocar a culpa no modelo. Nunca será: a responsabilidade do gestor é intransferível. A preocupação central deve ser sempre com o conteúdo, até porque planilhas e sistemas normalmente estarão disponíveis, mas sempre com limitações. É sem volta o caminho da utilização da matemática no mercado financeiro. Sejam bem-vindos, portanto, matemáticos, engenheiros, físicos e afins. Só não se esqueçam de conversar com o pessoal da área econômica e da administração. Somente a sinergia vai garantir bons resultados.
*Alexandre Póvoa ([email protected]) é presidente da Canepa Asset Brasil e autor dos livros Valuation, Como Precificar Ações e Mundo Financeiro, o Olhar de um Gestor
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