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Assets em crise
Gestoras independentes de recursos sofrem com a lânguida economia brasileira

assets-em-criseEsta não é a primeira nem a maior crise que as gestoras independentes de recursos enfrentam, mas a falta de viço da economia brasileira tem preocupado além da conta. As assets dependem de clientes com recursos e ânimo para investir, uma combinação cada vez mais escassa. Prova disso é o desempenho da indústria de fundos. No ano passado, a captação dessas carteiras teve saldo positivo de R$ 2,17 bilhões, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), mas esse foi o pior resultado em seis anos. O detalhe é que agora, diferentemente de anos atrás, o problema é nosso, não um reflexo do panorama internacional.

Nos últimos 15 meses, a paulista GTI perdeu cerca de 80% do patrimônio que tinha sob gestão; hoje, restam cerca de R$ 50 milhões. Boa parte dos recursos, oriundos de investidores europeus e family offices locais, rumou para outros países emergentes após a disparada do dólar — a moeda americana valorizou-se 13% em relação ao real no ano passado. Para piorar, os investimentos em renda variável sofrem com a competição gerada pela alta de juros, indexador de produtos de baixo risco. A taxa Selic mantém-se em trajetória de alta desde 2012. Há ainda os estilhaços deixados pelo colapso de governança corporativa ocorrido nas estatais. “Isso afeta de forma catastrófica a percepção de risco do investidor. Somos o país do voo de galinha. As ondas boas não perduram”, afirma o sócio André Gordon.

Outro exemplo, mais dramático, é o da Duna Asset Management. Fundada em 2008, a gestora chegou a ter mais de R$ 1 bilhão sob gestão, segundo dados da Economatica. Os recursos foram atraídos, principalmente, pela presença de um sócio reconhecido por sua competência na gestão de recursos: Inácio Ponchet, que atuou no extinto Banco Garantia e depois no Credit Suisse. A performance de seus fundos, no entanto, ficou muito aquém do esperado, e os clientes foram embora. O Duna Premium FIC de FIA, cujo histórico de preço das cotas vai de junho de 2008 até novembro de 2014, perdeu mais de 50% de valor no período. No fim do ano passado, a Duna fechou as portas. Além do mau desempenho, houve um agravante, segundo gestores que acompanharam a gestora: Ponchet mudou-se para o Nordeste, deixando os clientes ressabiados.

Até as assets mais consagradas do mercado assistem à fuga de investidores. A Gávea, gestora fundada pelo ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, perdeu quase R$ 500 milhões nos 12 meses terminados em março, segundo a Anbima. O fraco desempenho pode estar por trás da possível recompra da gestora. De acordo com o jornal Valor Econômico, Fraga estaria negociando com o J.P. Morgan a retomada de seu negócio. Em 2010, a gestora foi vendida para a Highbridge, posteriormente incorporada pelo banco americano. A aquisição ocorreu em etapas: faltam 25%, a serem pagos neste ano. Como o valor está atrelado ao desempenho, a reversão do negócio passa a ser uma possibilidade atraente.

O dinheiro sumiu
O fraco desempenho das ações na bolsa de valores é um fator responsável pela crise das assets independentes. Mas há mais. Além da queda de 2,9% do Ibovespa em 2014 e da desvalorização de papéis que concentram boa parte da liquidez, como o da Petrobras, existe uma falta generalizada de recursos disponíveis para poupança. Em 2014, o PIB brasileiro cresceu apenas 0,1%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Foi o pior resultado em cinco anos. Em 2015, se as projeções se concretizarem, o cenário ficará ainda mais difícil. De acordo com o Relatório de mercado Focus, pesquisa semanal realizada pelo Banco Central (BC) entre as principais instituições financeiras, o ano terá retração de 1,03%.

A economia estagnada também fez as ofertas públicas de distribuição de ações sumirem do mapa. E, com elas, os recursos oriundos das vendas secundárias de ações, que abasteciam o bolso dos empresários e iam parar direto nos fundos das gestoras. Neste ano, nenhuma empresa atreveu-se a estrear no pregão; em 2014, a única a oferecer seus papéis foi a Ourofino, em uma transação de R$ 311 milhões. Nada que se aproxime dos R$ 16,5 bilhões arrecadados com as ofertas secundárias de ações em 2013.

A situação tornou-se mais inusitada com a alta dos juros — que chegaram a 13,25% em abril — e a consequente redução da atratividade dos investimentos de risco. Pior do que isso: os gestores de recursos passaram a perder clientes para títulos emitidos por bancos que usufruem de incentivo fiscal. As vilãs são as letras de crédito imobiliário e do agronegócio (LCI e LCA), isentas de imposto de renda (IR) sobre ganhos quando adquiridas por pessoas físicas. De acordo com a Anbima, o estoque de LCAs somava R$ 169,4 bilhões no fim de março; o de LCI, outros R$ 180,6 bilhões. Um total de R$ 350,1 bilhões, portanto, 48 vezes superior aos R$ 7,3 bilhões aplicados nesses papéis em 2006, ano seguinte à concessão do benefício tributário.

Em 2012, o estoque das letras ultrapassou a casa dos R$ 100 bilhões pela primeira vez. E explodiu no ano seguinte com a adição de uma cereja irresistível: a cobertura ampliada do Fundo Garantidor de Crédito (FGC). O risco desses títulos é o crédito do emissor — no caso, o banco —, que é em parte neutralizado pelo FGC. Em maio de 2013, o reembolso máximo em caso da insolvência foi estendido de R$ 70 mil por CPF para R$ 250 mil. Ao fim do ano, o estoque de LCIs e LCAs já era de R$ 215,9 bilhões.

Para os investidores, a combinação do benefício fiscal com um seguro para reparação de perdas tornou-se imbatível; os fundos dos gestores não gozam do incentivo fiscal e tampouco de qualquer cobertura. Em 2012, o total de recursos alocados em LCIs e LCAs representava 22% dos valores em fundos DI, renda fixa e multimercados; no fim de 2014, era 65%. A migração de investidores também fica evidente quando se coteja o crescimento do número de clientes das duas modalidades. O total de aplicadores das letras disparou 407% entre 2012 e 2014, para 974 mil; nos fundos, o crescimento foi bem mais modesto: 13%, para 3,58 milhões de cotistas. Para sanar a assimetria, a Anbima requereu formalmente ao Ministério da Fazenda a criação de uma categoria de fundo que desfrute os mesmos benefícios tributários concedidos aos investidores pessoa física que compram LCIs, LCAs e outros produtos, como ações de pequenas e médias empresas. No longo prazo, a associação pretende apresentar um estudo com o diagnóstico completo dos produtos incentivados e com sugestões para melhorar o arcabouço regulatório. “O importante é a questão fiscal não ser o principal motivo de uma decisão de investimento”, observa Carlos Takahashi, vice-presidente da Anbima.

Ainda um bom negócio
Ainda bem que nem todos os ventos sopram contra a indústria de fundos. No mês passado, uma fatia de 60% da Quest Investimentos, fundada pelo economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, foi vendida para a Azimut — em 2013, a gestora italiana já havia comprado metade da Legan Asset. A transação totalizará cerca de R$ 70 milhões, valor certamente robusto para os dias de hoje. A maior parte dos recursos dará saída aos sócios: além dos 35% de Mendonça de Barros, foram comprados os 15% do BTG Pactual e outros 10% de minoritários. Os 40% restantes ficarão nas mãos dos atuais administradores da gestora.

Outro exemplo de que a gestão de recursos ainda é vista como bom negócio é o lançamento do FIC Aceleradora de Gestoras, da XP Gestão. O fundo será o primeiro no Brasil dedicado exclusivamente à compra de participações em assets. O modelo já é tradicional no exterior e vem a calhar no cenário de escassez de recursos. O FIC agirá como alavanca para as gestoras em seus primeiros anos de funcionamento: comprará uma parcela do capital combinando desde o início suas condições de saída, que provavelmente ocorrerá com a recompra da fatia pelos sócios fundadores da gestora.

O plano da XP é captar R$ 400 milhões com o FIC e investir em cinco a oito gestoras. Patrícia Stille, sócia da XP, conta que está em busca de assets fundamentalistas, focadas na gestão de longo prazo e dirigidas por profissionais experientes. Estão no radar tanto gestoras novas, que dependem do aporte da XP para estrear no mercado, como aquelas já em operação. O importante é o potencial de crescimento. Se a economia e a política governamental ajudarem, os bons gestores têm tudo para voltar a atrair clientes.

Ilustração: Grau 180.com


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