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FIPs devem estar atentos a “armadilhas” das sociedades limitadas
Felipe Demori Claudino*

Felipe Demori Claudino*

A Instrução 578 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), de agosto de 2016, estabeleceu a permissão para fundos de investimento em participações investirem em sociedades limitadas. Essas sociedades são, de fato, adequadas para diversos arranjos societários, sobretudo por sua simplicidade e custo reduzido. No entanto, a maioria dos investidores, acostumados a lidar com as sociedades anônimas, certamente se surpreenderá com algumas características desse tipo societário. Assim, este artigo visa chamar a atenção para algumas “armadilhas”.

Uma das questões é o quórum especial de deliberação. O Novo Código Civil (já não tão novo assim) fixou um mínimo de três quartos do capital para aprovação de alterações no contrato social da sociedade limitada. A lei também exige esse quórum para a substituição de administrador nomeado no contrato social e incorporação ou cisão da sociedade. Importante ressaltar que não estamos falando da concordância de 75% dos presentes em reunião ou assembleia, mas de sócios que detenham essa participação no capital social. Ora, aqui não mais vale o velho e conhecido princípio majoritário, característico das sociedades anônimas. Esse quórum extravagante é inflexível e pode dificultar a aprovação de alterações em sociedades cujos contratos sociais não preveem a exclusão de sócio por justa causa.

Outra diferença diz respeito à responsabilidade pela integralização do capital social. Enquanto na sociedade anônima a responsabilidade é restrita ao preço de emissão das ações subscritas, nas limitadas os sócios são solidariamente obrigados a integralizar o capital social. Em termos práticos, qualquer sócio, tenha integralizado ou não suas cotas, pode se ver obrigado a pagar o valor das cotas de outro sócio se este não as integralizar, seja qual for esse valor. Em que pese o direito de regresso contra o sócio inadimplente, essa regra demonstra que é preciso conhecer, e muito bem, o risco de crédito daqueles que compõem a sociedade.

Mais um importante ponto está relacionado à impossibilidade de emissão de cotas com características semelhantes às das ações preferenciais nas sociedades limitadas, por força de expressa vedação do Departamento de Registro Empresarial e Integração (Drei). Nas anônimas, sobretudo nas de capital aberto, as ações preferenciais são frequentemente utilizadas. Uma vez que seus titulares, em geral, não possuem direito ao voto, elas se adequariam à diversas estruturas societárias envolvendo limitadas, principalmente as de investimento em private equity. Dessa forma, a restrição imposta pelo Drei diminui, de fato, as opções de estruturas societárias envolvendo FIPs e sociedades limitadas.

A denúncia imotivada do contrato social da sociedade por prazo indeterminado é também uma peculiaridade das limitadas. Um sócio pode, a qualquer momento, “pedir para sair” da sociedade e receber sua participação correspondente nos haveres sociais. Note-se que, dependendo do momento do exercício desse direito e da importância do sócio na sociedade, isso pode simplesmente representar seu fim. Nas anônimas, a retirada do sócio deve necessariamente ser motivada por uma deliberação de assembleia da qual ele não concorde. Sendo assim, para evitar a surpresa de uma denúncia imotivada, é prudente que os contratos sociais das limitadas estabeleçam um prazo determinado para a duração.

Existe ainda, nas limitadas, a possibilidade de exclusão de um sócio minoritário. A maioria dos demais sócios pode excluir aquele que estiver insolvente ou falido, não tenha integralizado suas cotas ou (desde que previsto no contrato social) pratique atos de inegável gravidade, que coloquem em risco a continuidade da sociedade. A exclusão segue um rito simples e é feita mediante o arquivamento de uma alteração contratual que formaliza a saída do sócio indesejado. Nas sociedades anônimas, o acionista, em regra, só pode ser excluído caso não integralize suas ações.

Por último, um aspecto importantíssimo — e, infelizmente, pouco debatido — das limitadas é a responsabilidade do sócio retirante pelo cumprimento das obrigações sociais. Até dois anos depois de averbada sua saída na Junta Comercial, o ex-sócio de uma limitada responde, solidariamente com o sócio que adquiriu suas cotas, pelas obrigações que tinha como sócio. Não delimita o texto legal, entretanto, quais seriam essas obrigações. Fica a interpretação a cargo do Judiciário, que vem alargando a responsabilidade do ex-sócio em casos concretos. Nas anônimas, por outro lado, a lei prevê expressamente que a responsabilidade do ex-sócio se restringe ao pagamento das prestações que faltarem para integralizar as ações do novo sócio.

Não obstante os aspectos apresentados, a sociedade limitada é, por um conjunto de fatores, o tipo societário mais utilizado no Brasil. Com a recém-editada norma da CVM, esse cenário tende a se manter. As limitadas, numa primeira análise, parecem ser menos onerosas e acessíveis, mas, quando observadas de perto, contêm toda sorte de inconvenientes, rigidez e insegurança jurídica. Portanto, é imprescindível que os FIPs e seus cotistas estejam informados e atentos ao lidar com essas sociedades.


*Felipe Demori Claudino ([email protected]) é sócio de Rolim de Mello Sociedade de Advogados


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