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Fase difícil
Fundos multimercados se esforçam para bater o DI, mas, enquanto não conseguem, os resgates crescem em suas carteiras. Quais os motivos para esse desempenho, afinal?

, Fase difícil, Capital AbertoNem tanto ao céu, nem tanto à terra. Os fundos multimercados são a alternativa para quem quer fugir dos altos riscos da renda variável e obter uma rentabilidade potencialmente maior que a dos títulos de renda fixa. Mas, ultimamente, os investidores desse tipo de fundo têm se visto perto demais do chão: de acordo com os dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), até 20 de junho deste ano, esses investimentos apresentavam rentabilidade média líquida (descontando a taxa de administração) semelhante ou inferior à taxa referencial de depósitos interbancários (DI). A captação líquida da categoria multimercado “macro”, por exemplo, está negativa em R$ 29,017 bilhões em 2011. Desses, R$ 28 bilhões se devem a uma reclassificação de um único fundo do Banco do Brasil, que migrou para a categoria renda fixa. Ainda assim, os resgates superaram as aplicações em R$ 1,017 bilhão no ano e em R$ 3,53 bilhões em 12 meses. Nos fundos de renda fixa, a captação está positiva no ano em mais de R$ 14 bilhões.

Entre os fundos do tipo macro (com operações de médio e longo prazo em vários tipos de ativo), o retorno médio nos últimos 12 meses foi de 9,94% contra 11,24% dos fundos do tipo “referenciados DI” e 12,47% dos fundos de renda fixa. Um resultado desestimulante para quem optou por se expor à renda variável — e desembolsou mais para remunerar os gestores em razão disso. Como consequência, esses fundos vêm perdendo participação na distribuição do patrimônio líquido da indústria. Em 2006, eles detinham 18% do total de recursos em suas carteiras. Agora, representam 9%. No mesmo período, os referenciados DI passaram de 54% para 72%. “No momento, não dá mais para concentrar a maior parte do dinheiro nos multimercados. Com opções pouco arriscadas como os títulos públicos do tipo NTN-B, que acompanham a inflação, a fatia de fundos de renda variável diminuiu, embora não tenha sumido”, comenta o sócio da alocadora de recursos Tag Investimentos, Marcelo Pereira.

Há um reflexo da má performance da Bolsa de Valores na queda de rentabilidade desses fundos. Conforme um levantamento feito pela Bawm Investments, a média de retorno de 281 fundos de ações analisados é de 3,34% negativos neste ano, até 31 de maio. Ainda assim, 198 deles ficaram acima de seu benchmark (nesse caso, o Ibovespa, com queda acumulada de 6,85%). Quando o assunto é multimercados macros, o lucro médio dos 203 fundos da categoria na amostra da Bawm ficou em 3,43%. Embora positivo, é uma marca inferior a sua referência, o CDI, que havia acumulado 4,52% no período. “Estratégias variáveis não estão indo bem, mas continuamos usando, pois sempre há produtos de destaque”, afirma George Wachsmann, sócio da Bawm. Na amostragem da alocadora, o campeão dos multimercados macros trouxe 19,55% de retorno no período analisado, e o de ações, 26,4%. Do outro lado, estão os lanternas, com 23% e 34,58% de queda nas duas categorias, respectivamente. Esses quatro fundos são pontos fora da curva e apresentam taxas impensáveis para quem está focado apenas no DI.

A referência usada para medir a eficiência dos multimercados desagrada: “o brasileiro não tira o DI da cabeça”

VARIÁVEL, MAS NECESSÁRIO — Não se pode, entretanto, culpar apenas a fatia das ações pelos resultados. Mesmo se compusesse a maior parte da carteira com títulos remunerados de acordo com a Selic (atualmente em 12,25%), o gestor precisaria fazer a aposta correta entre pré ou pós-fixados, por exemplo. “Certos multimercados quase não investem em renda variável, e a renda fixa não garantiu sucesso, mesmo com a taxa básica em alta. Quem se posicionou acreditando em uma baixa da Selic não está muito bem”, diz Euridson Sá, superintendente executivo da Anbima.

“Além de a renda fixa não ser tão simples assim, não dá para ficarmos apenas com ela. A renda variável pode ser a principal responsável pelas quedas, mas é também quem garante a superação do benchmark”, explica Cesare Rivetti, sócio da gestora Fram Capital. Ele observa que um fundo comprado apenas na taxa básica de juros já sairia com uma desvantagem em relação ao DI, pois nele incide taxa de administração (de 1,84%, em média, para o varejo, segundo a Anbima). “Não faz sentido para as gestoras não correrem riscos nesses produtos. O investidor pode comprar tesouro direto sozinho”, argumenta.

A Fram Capital tem cerca de R$ 450 milhões em ativos sob gestão. Desses, R$ 200 milhões estão distribuídos entre os dois fundos multimercados oferecidos. A maior parte está investida no Amundsen, que rendeu 3,56% no ano até 30 de junho (65% do CDI). A rentabilidade acumulada desde o início da captação, em março de 2008, é de 152% do CDI. Apesar de o retorno atual não ser o desejado, a gestora não pretende diminuir os investimentos nessas carteiras ou migrar recursos para outros produtos. “Notamos entre nossos clientes uma atração pelos fundos de crédito, mas mantemos a estratégia porque acreditamos no multimercado.”

Reinaldo Le Grazie, diretor de renda fixa e multimercados da Bradesco Asset Management (Bram), lembra que os multimercados têm a característica de trabalhar pouco com giro rápido e mais com posições assumidas estrategicamente, sendo normal uma retração em um cenário nebuloso do mercado financeiro. “Não há uma decadência desses fundos, o movimento é temporário”, avalia. Para turbinar essas carteiras, a asset está aumentando suas participações em commodities no mercado futuro. Em maio, a captação líquida do Bradesco nos multimercados foi superior a R$ 1,2 bilhão, enquanto os referenciados DI e as carteiras de renda fixa tiveram resgates de mais de R$ 500 milhões — ambos, uma exceção no mercado. A atratividade dos primeiros não é refletida, porém, na rentabilidade. O rendimento dos cinco fundos multimercados voltados para o varejo varia entre -2,53% e 1,14% no ano. Já no segmento private, o menor rendimento entre oito produtos é de -2,16%; o maior é de 4,9%.

Embora o curto prazo não seja o tipo de expressão mais frequente no vocabulário dos gestores de multimercados, as operações de alto giro e elevada liquidez aparecem como uma alternativa. “O mercado não tem tendência, está estagnado. Diante disso, os fundos têm de agilizar as negociações para tentar aumentar o retorno”, esclarece Ennio Moraes, superintendente executivo de investimentos discricionários do Citi Brasil. O banco também se destacou por causa da captação líquida na categoria multimercado, de R$ 672 milhões em maio; porém, os retornos variaram entre 0,17% e 5,79%. Moraes atribui a captação elevada na comparação com os concorrentes à capilaridade e à variedade da plataforma aberta — o banco trabalha com fundos administrados por diversos gestores, como BNP Paribas e Franklin Templeton.

Organizações de grande porte, como o Citibank, investem em parcerias para incrementar os retornos dos fundos

COMPARAÇÃO CRUEL — A impressão geral dos gestores ouvidos pela reportagem é que a fuga da renda variável para a fixa é um hábito no Brasil. Há uma cantilena no mercado de capitais nacional: nosso investidor não gosta de riscos e não está muito disposto a aguentar a instabilidade de fundos mais expostos. Dentre os motivos para isso está a memória inflacionária das décadas de 1980 e 1990 e os altos retornos propiciados pelos juros básicos do Brasil, a mais alta taxa real do planeta, quase sem riscos. O vilão é, invariavelmente, o mesmo: o CDI. “Em países desenvolvidos, as taxas de comparação, como prime e libor, não são tão elevadas”, analisa Sá.

A taxa de referência usada para medir a eficiência dos fundos multimercados desagrada os gestores. É um parâmetro alto, fortemente ligado aos títulos do governo, com cotação diária. A fim de suavizar as comparações, a Anbima também usa outros índices para verificar o rendimento da indústria. Se relacionados com um benchmark composto de 80% de IMA-S (atrelado a Letras Financeiras do Tesouro) e 20% de Ibovespa, 85% dos 4.188 fundos analisados têm resultados superiores nos últimos 12 meses; considerando 60 meses, 51% excedem o referencial. Essa comparação favorece carteiras variadas como os multimercados, mas não deve ser eleita pela maioria dos investidores. Como bem define Pereira, sem rodeios: “o brasileiro não tira o DI da cabeça”.

QUEM QUER OUSADIA? — O fantasma do DI não atrapalha os multimercados apenas na aparência. Ele também influencia negativamente na forma como essas carteiras são constituídas. Já virou senso comum a impressão de que os retornos medianos dos nossos multimercados são também resultado de pouca ousadia na hora de aplicar. “Os títulos atrelados ao CDI drenam muitos dos recursos destinados aos multimercados”, pondera Laura Tostes, sócia da asset Leblon Equities. A história é velha conhecida: demandas conservadoras, ofertas conservadoras. Diante dessa mesmice, uma tendência é que os investidores com mais tempo e recursos se afastem dos grandes bancos. Pereira, da Tag, segue esse caminho, embora não tire o olho dos lançamentos das maiores instituições. “Family offices e alocadores de recursos estão cada vez mais apostando em gestoras pequenas, qualificadas e com produtos customizados.”

Atentas a isso, as organizações de grande porte investem em parcerias para incrementar os retornos dos seus fundos no médio e no longo prazo. A asset do Citibank é um exemplo. Acreditando nas vantagens de unir a capilaridade de um com a expertise de outro, ela dispõe de uma plataforma aberta para distribuir produtos de gestoras menores. Mas esse modelo não está no radar de todos os bancos. A Bram, por exemplo, tende a criar produtos com características mais ousadas dentro de sua própria estrutura. “Se os fundos não se diversificarem, podem perder muitos recursos. Terceirizar carteiras é um jeito de variar, embora também exija um perfil de investidor mais disposto a correr risco”, reconhece Marcelo Pimentel Mello, vice-presidente da SulAmérica Investimentos. Segundo Mello, 60 bancos de médio e grande porte são parceiros da gestora.

Alternativas existem, mas os gestores dos multimercados não podem fugir da realidade. Os investidores entendem que o mercado não está nos seus melhores dias, mas não parecem muito dispostos a tolerar comodismos. “Quanto mais a taxa de juros sobe, mais o fundo tem de se esforçar para fazer diferente e superá-la”, aconselha Wachsmann. Eis o destino doloroso dos incompreendidos multimercados.


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