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Fardo injusto?
Diretores de RI discutem até que ponto devem ser responsabilizados por falhas na divulgação de informações

, Fardo injusto?, Capital AbertoSe você perguntar ao profissional de relações com investidores (RI) no Brasil qual a sua principal queixa em relação à situação legal da profissão, provavelmente ele citará a questão da responsabilidade sobre a divulgação de fato relevante. O problema para esses profissionais é que muitas vezes eles são considerados culpados por atos sobre os quais não têm ingerência. Responsáveis legalmente por apresentar e discutir os números financeiros e operacionais com o mercado, além de zelar pela conformidade legal perante o regulador e a BM&FBovespa, o diretor de RI não é capaz de controlar o processo de formação de informações dentro da companhia.

“Com o desenvolvimento do mercado de capitais brasileiro, que aumentou o número de situações propensas a desigualdades de informação, como operações de fusões e aquisições, o diretor de RI se viu, de um lado, despreparado e desequipado para essa mudança; e, de outro, pressionado pelo regulador”, diz João Pinheiro Nogueira Batista, conselheiro de administração e ex-presidente do conselho do Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (Ibri).

“A responsabilidade solidária entre todos os diretores daria ao profissional maior possibilidade de cobrar seus pares”

Para minimizar esse problema, algumas empresas optam por ter o mesmo profissional ocupando os cargos de diretor de RI e diretor presidente. O acúmulo do mais alto posto executivo da companhia com a função de comandar os trabalhos de comunicação com o investidor se explica pelo fato de o primeiro dominar as ferramentas que faltam ao segundo. “O CEO possui visão do todo, acesso às informações e autoridade para corrigir distorções em quaisquer departamentos”, observa Batista.

Esse acúmulo de postos — que era comum antes do reflorescimento do mercado de capitais brasileiro e interpretado como um sinal de desprezo pela função de RI, já que a ela não era designado um executivo específico — começou a ganhar espaço novamente a partir de 2010. Drogasil, HRT Participações em Petróleo, Ideiasnet, Log In, MPX e MMX são alguns exemplos de companhias que passaram a sobrepor essas duas posições. Mas seria essa uma boa ideia? O CEO, com todas as suas responsabilidades, teria tempo para exercer adequadamente as atribuições de RI? “Ele poderia se ocupar somente do dever de divulgar os fatos relevantes. Outras atividades, como a divulgação de informações periódicas e os roadshows, por exemplo, poderiam ser desempenhadas por gerentes do departamento de relações com investidores”, sugere Batista.

A atribuição da atividade de RI a um diretor estatutário que exerça ou não outras funções executivas foi exigida, em 1999, pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) na sua norma 309, atualmente revogada pela Instrução 480. A regra dispõe sobre o registro de emissores de valores mobiliários admitidos à negociação em mercados regulamentados. Apesar de nova, a 480 não mudou em nada a 309 no que diz respeito à liberdade dada às companhias de escolher se o diretor de relações com investidores ocupará somente essa função ou se será também o CFO ou CEO. “Mas isso deveria ser modificado. A 480 poderia passar a atribuir ao presidente a função de diretor de RI”, opina Batista.

“Não precisa mudar as regras para resolver as falhas das empresas. Os RIs devem arregaçaras mangas”

Na época em que a 309 foi promulgada, grande parte das empresas direcionou o cargo ao diretor financeiro. “Foi um movimento natural. Na época, as atribuições mais importantes para o RI residiam nos números financeiros e na apresentação de resultados, que são processos bem alinhados com a função do CFO”, afirma Diego Barreto, professor de
pós-graduação da Fundação Getulio Vargas (FGV).

DIVIDINDO O PESO — Uma alternativa de tirar o fardo das costas do diretor de RI seria a responsabilização solidária de todos os diretores. De acordo com o artigo 3º da Instrução 358, a responsabilidade primária de divulgar ato ou fato relevante é do diretor de RI. Em uma análise casuística, outros envolvidos (controladores, diretores, conselheiros de administração, conselheiros fiscais e membros de quaisquer órgãos com funções técnicas ou consultivas) também podem ser responsabilizados. Mas isso nem sempre acontece. A responsabilidade primária nas costas do diretor de RI, na visão de Barreto, acaba desestimulando a proatividade na circulação das informações dentro da companhia. “Se o diretor de uma área qualquer comete um deslize e tenta esconder a informação, como o diretor de RI vai descobrir? A responsabilidade solidária entre todos os diretores daria ao profissional maior possibilidade de cobrar seus pares”, declara.

A CVM analisa se a companhia tem uma dinâmica que permite ao RI cumprir sua função

Para a CVM, a responsabilidade solidária já está subentendida no regramento brasileiro. “Não obstante a responsabilidade primária atribuída pela Instrução 358 ao diretor de RI, todos os administradores e demais pessoas indicadas na norma que tenham acesso a informações relevantes devem zelar pela sua correta divulgação ao mercado. A Instrução 358 prevê que os administradores, dentre os quais se inclui naturalmente o diretor presidente, devem comunicar o ato ou fato de que tenham conhecimento ao diretor de RI para que esse promova sua divulgação”, determina a CVM.

A questão é controversa. Para Geraldo Soares, coordenador do Comitê de Orientação para Divulgação de Informações ao Mercado (Codim), a solução não está em uma “canetada” nos regulamentos. “Será que o problema não está dentro das companhias? Não precisa mudar as regras para resolver as falhas das empresas. Os RIs devem arregaçar as mangas”, argumenta Soares. O trabalho duro a que se refere consiste no esforço pela efetiva implementação da cultura de uma companhia aberta. “O RI tem que realizar palestras com funcionários, falar com todos os diretores e reclamar se os processos de comunicação interna não estiverem bons”, salienta.

Além do trabalho proativo do diretor de RI, Soares recomenda às companhias a adoção de comitês de divulgação. O órgão pode contar com membros da área jurídica, do marketing, da assessoria de imprensa e do departamento de RI. “Muitas vezes, é difícil definir o que é fato relevante, comunicado ao mercado ou release. Nessas horas, a visão multidisciplinar do comitê auxilia bastante”, garante.

“O Brasil vem de uma cultura empresarial em que não se cobra uma política de divulgação de fato relevante”

Marcelo Barbosa, sócio do escritório Vieira, Rezende, Barbosa e Guerreiro Advogados, aconselha os RIs a documentarem seu trabalho. “O rigor deve ser maior, especialmente em companhias que não oferecerem suporte adequado à função”, analisa. Para determinar se um diretor de RI está ou não cumprindo seus deveres, a CVM analisa alguns fatores, dentre eles se a companhia tem uma dinâmica que lhe permite cumprir sua atividade. E, se não tem, o que o diretor de RI faz a esse respeito. “Ele deve sempre registrar as tentativas de mudança, caso contrário sua omissão poderá levá-lo a uma condenação pela autarquia”, alerta Barbosa.

MUDANÇA LENTA — Apesar de reconhecer que o RI é um agente transformador e que pode, eventualmente, conseguir quebrar barreiras dentro das companhias, Barreto, da FGV, entende que deixar a cargo desse profissional a responsabilidade de resolver as falhas de comunicação da empresa é uma tarefa muito complexa. “O Brasil vem de uma cultura empresarial acostumada a tomar empréstimos nos bancos, onde não se cobra uma política de divulgação de fato relevante. Há, portanto, executivos que nos últimos 30 anos trabalharam num ambiente com essas características”, pondera. “Imaginar que ele vá fazer isso em pouco tempo é subestimar a complexidade do mercado de capitais.” Enquanto uma solução não chega, é preciso que os RIs mantenham os olhos e ouvidos bem abertos sobre todas as informações que circulam na companhia. A precaução será sempre uma boa pedida.


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