Espírito público e inovador
Marcos Barbosa Pinto

, Espírito público e inovador, Capital AbertoEm sua última viagem a Amambaí, no Mato Grosso do Sul, Marcos Barbosa Pinto se surpreendeu com as dimensões da cidade onde nasceu e morou metade de sua vida. “Parecia muito menor do que nas minhas lembranças”, diz ele. A sensação de que precisaria abaixar-se para entrar no antigo colégio poderia ter uma explicação prosaica: depois dos 15 anos, o rapaz que só tirava notas boas e jogava basquete espichou ainda mais, chegando ao 1,90 metro de altura. Mas não foi apenas fisicamente que Marcos encorpou. Profissionalmente, ele alcançou uma envergadura rara para os seus 30 anos, com um currículo que parece comprovar, a cada linha, a compatibilidade entre competência técnica e idealismo.

Marcos chegou, há um ano, na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) como o diretor mais novo já empossado pela autarquia. Para ele, uma situação comum. Quando ganhou uma bolsa integral para o mestrado em Direito na Universidade de Yale, por exemplo, também era o mais jovem da turma. Em um cargo público e técnico, era de se esperar que a suposta inexperiência pudesse pesar negativamente. Poucos meses bastaram, entretanto, para o advogado vencer desconfianças e conquistar, com seu jeito tranqüilo e firme, o respeito do mercado de capitais.

Se a jovialidade é outra marca sua, ela pode ser percebida na busca de inovação e nos questionamentos a tabus e visões tradicionais do mercado. Visto como moderado em relação a punições — “Prefiro dizer claramente o que a CVM espera do mercado do que punir com base em regras pouco claras” —, Marcos não mede esforços para encaminhar projetos que considera relevantes, nem se deixa intimidar por interesses contrariados. Foi assim, por exemplo, que elaborou um parecer de orientação sobre deveres dos administradores em operações de fusão e incorporação entre controladoras e controladas e liderou uma decisão do colegiado que estabeleceu um novo entendimento sobre o direito de minoritários com ações ordinárias indicarem um conselheiro fiscal próprio, sem a necessidade da presença de 10% deles em assembléia.


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Por trás de seu entusiasmo com o mercado de capitais, está uma paixão ainda maior, surgida nos tempos em que estudava na cidadezinha de 20 mil habitantes: o interesse público. Foi admirando a liderança do pai, então vereador e presidente da Câmara Municipal, e do avô, um gaúcho empolgado com o desenvolvimento do País, que Marcos, desde garoto, pensou em seguir uma carreira na qual pudesse servir aos interesses da sociedade. O caminho da política foi descartado durante suas incursões em movimentos estudantis e o da diplomacia, no início da faculdade de direito. Enquanto isso, a dedicação e a habilidade técnica levavam-no a obter bolsas de estudo e convites para trabalhar em grandes escritórios de advocacia – propostas que passaram a ser descartadas depois que o desejo de trabalhar no governo tornou-se uma convicção.

“Observo o Brasil com olhos de encanador”, compara o diretor da CVM. “Tentar resolver as grandes questões é para outras pessoas, com carisma e vocação para disputar eleições. O meu talento está em olhar um problema específico e perceber que dá para resolvê-lo, com um pouquinho de técnica.”

Com tanta motivação, não é de se estranhar que Marcos tenha por hábito varar a madrugada, em casa, debruçado sobre projetos e votos que exigem uma concentração difícil de conciliar com a atribulada agenda na CVM. Ele rejeita, porém, as insinuações de que seja um “workaholic” ou “nerd”, por vezes vindas de amigos e da namorada – uma brasileira que se prepara para voltar dos Estados Unidos. Prova disso, afirma, é a facilidade com que pode ser encontrado nos barzinhos do Leblon, bairro do Rio que escolheu para morar, ou correndo na praia, antes do expediente. Graças às poucas horas habituais de sono, sobra tempo até para os livros e para o cinema, além das eventuais visitas à família, que ainda mora no interior do Mato Grosso do Sul.

Olhando para trás, Marcos se surpreende com o ritmo que sua carreira ganhou depois do primeiro estágio, quando descobriu o mundo do direito empresarial. “Quando dei por mim, estava trabalhando horrores, assumindo funções de advogado formado.” A advocacia continuou a ser exercida, depois do mestrado, mas em pouco tempo Marcos assumia um papel de assessor informal do governo federal, que descobrira o seu projeto de Parcerias Público-Privadas (PPPs) para países africanos, elaborado para o Banco Mundial durante a sua temporada nos Estados Unidos. “Nas horas vagas”, como diz, acabou ajudando, a convite de Fernando Haddad, atual ministro da Educação, a elaborar o anteprojeto de lei das PPPs no Brasil e o Programa Universidade para Todos (ProUni). Marcos estava em Nova York, terminando sua tese de doutorado, quando foi chamado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, para o cargo na CVM. “Talvez eu tenha achado Amambaí tão pequena, quando voltei, porque estava morando em Nova York”, conclui Marcos, considerando mais as dimensões das duas cidades do que as suas próprias.


Uma ambição – “Sou ambicioso no sentido de saber o que quero, de buscar um sentido para cada passo. Não consigo entender pessoas que não sabem o que querem da vida.”

Um guru – Fábio Konder Comparato, pela capacidade intelectual, pela coerência de idéias e até por não ter passado pelo governo e guardar algum arrependimento disso. “Esse arrependimento eu não quero ter”.

Rotina – Acordar cedo (apesar de não gostar), correr na praia, trabalhar de dia no que é urgente, tomar chopinho com os amigos, trabalhar de madrugada no que é importante.

Horas de sono – Cinco ou seis, quando a insônia permite.

Livros na cabeceira – O apanhador no campo de centeio, de J.D. Salinger (“Já li umas cinco vezes”); Sobre heróis e tumbas, de Ernesto Sabato; O passado, de Alan Pauls. “Livro profissional ou técnico, só no trabalho.”

Motivo de orgulho – Ter ajudado a elaborar o Programa Universidade para Todos (ProUni), que permitiu a distribuição de 400 mil bolsas para estudantes carentes, graças a uma engenharia jurídica e financeira.

O projeto da vez – Parecer de orientação sobre incorporação de empresas controladas, que está em audiência pública. “Causou algum desconforto, mas foi bem recebido pelos investidores, por resolver uma questão que ameaça a credibilidade do mercado.”

Momento de estresse – Ter que lidar com o conservadorismo exagerado ou com a falta de objetividade, comuns no setor público. “Perco as estribeiras, porque não tenho tempo a perder com quem não quer mudanças.”

Para relaxar – Barzinho com os amigos (Jobi, Bracarense, ambos no Leblon) ou cinema (de Batman a Woody Allen).

Para se informar – Internet e jornais.

Internet – Só para se informar, nunca para lazer.

Conselho para quem está começando – “Não faça contatos apenas por fazer. Contatos na carreira são resultado do trabalho bem-feito e de tratar bem as pessoas. Não é preciso conhecer previamente ninguém e minha trajetória mostra isso.”

Serviço público é… – “Algo que vale a pena. Apesar dos salários, da dor de cabeça, da exposição e dos inimigos inevitáveis em algumas funções”.

Punição ou prevenção – Prevenção. “Quando são dadas regras claras ao mercado, o comportamento ilícito é reduzido e o trabalho de punição fica mais fácil.”

Saia-justa – Quando está aplicando uma punição grande e alguém insiste para que reconsidere, apresentando razões pessoais. “Não altera o meu comportamento, mas me sinto constrangido por a pessoa estar naquela situação.”

Sonho de consumo – Ter mais tempo para viajar, tirar férias. “Não tenho vontade de comprar nada”.

Investimento para o futuro – Desenvolver um lado acadêmico (atualmente dá aulas de direito societário na FGV-RJ). “Apesar do meu foco como profissional, me imagino, no longo prazo, com uma carreira acadêmica.”

Onde estava dez anos atrás – Cursando a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e trabalhando como estagiário em um escritório de advocacia.

Daqui a dez anos – “Se desconsiderar preocupações de natureza pessoal, me imagino ocupando um cargo técnico no governo.”


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