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Inversão de fluxo
Emergentes enfrentam fuga de capital externo e passam a competir por investimentos com Estados Unidos e Japão

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Os BRICs já não exercem mais o mesmo fascínio sobre os investidores estrangeiros. Brasil, Rússia, Índia e China estão abocanhando uma fatia cada vez menor dos investimentos globais. De acordo com a provedora de dados EPFR, os fundos de ações de mercados emergentes perderam US$ 529 milhões entre o início do ano e o dia 9 de julho. Os fundos de bonds têm exibido uma performance melhor: acumulam aportes de US$ 16,9 bilhões no período. Entretanto, na última semana de junho, os investidores retiraram US$ 5,6 bilhões desses veículos, o maior valor registrado em 2013 – sinalizando que os tempos de bonança dos fundos de dívida também podem estar no fim.

O relatório FDI Investments, produzido pelo grupo Financial Times, tampouco faz um retrato animador do quarteto. Conforme o documento, os BRICs estão atraindo menos projetos greenfield, aqueles em que uma empresa estrangeira investe diretamente num país, construindo suas operações do zero e gerando empregos. Juntos, os BRICs receberam, em média, 22% do total de projetos do tipo durante os últimos cinco anos. Em 2012, esse percentual caiu para 17,6% e, segundo a publicação, deve declinar mais ainda em 2013. “Os BRICs, apesar de receberem um quinto dos projetos greenfield, estão perdendo importância global devido ao crescimento econômico lento e à ascensão de outros mercados emergentes”, considera o relatório. Rússia, Índia e China receberam, em 2008, seu maior número de investimentos greenfield, mas, desde então, não superaram a marca. O Brasil bateu o recorde em 2011; no ano passado, porém, houve queda de 14%. Apesar de continuar sendo líder na América Latina, está perdendo atratividade para o Chile, cujos projetos cresceram 25%.

Os países emergentes que têm despertado a atenção dos estrangeiros estão, atualmente, fora dos BRICs. Dessa turma, fazem parte Bangladesh, Egito, Indonésia, Irã, México, Nigéria, Paquistão, Filipinas, Turquia, Coreia do Sul e Vietnã. O grupo recebe a alcunha de N11 (The Next Eleven), nome cravado por Jim O’Neill, ex-economista do Goldman Sachs e inventor do termo BRIC. Ainda assim, não se pode dizer que os 11 mercados estejam em ótimo momento. “Desde o começo do ano, os emergentes têm apresentado retorno menor que o dos países desenvolvidos”, afirma John Praveen, estrategista-chefe da Prudential International Investments Adivisers.

O último relatório do Institute of International Finance (IIF), publicado em junho, enfatiza o aumento da aversão ao risco entre investidores, o que reforça o fluxo de recursos dos mercados em desenvolvimento para os desenvolvidos. Diante disso, o IIF projeta investimentos estrangeiros de US$ 1,145 trilhão para os emergentes neste ano, US$ 36 bilhões a menos que no ano passado. Em 2014, o valor deve cair para US$ 1,112 trilhão. A gestora Invesco, uma das maiores do mundo, reduziu seus investimentos em títulos públicos brasileiros em 3% nos últimos meses.
DISPUTA INGRATA – A fuga de capital sofrida pelos emergentes é resultado do crescimento capenga de alguns
desses mercados – o Brasil, por exemplo, expandiu 0,9% em 2012, ante 2,7% em 2011 e 7,5% em 2010. Mas a ascensão de potências até então adormecidas também é um fator determinante. “O dinheiro aplicado nos emergentes está migrando para os Estados Unidos e o Japão, cujas economias estão se recuperando e oferecem potencial de ganho”, diz Jorge Mariscal, diretor de mercados emergentes do UBS.

A deterioração da economia brasileira levou a Standard & Poor’s a colocar o País em perspectiva negativa

No fim de junho, Ben Bernanke, presidente do banco central dos Estados Unidos, o Fed, anunciou mudanças na política monetária americana. Ao longo dos próximos meses, o Fed deve abandonar o chamado “quantitative easing” – estratégia na qual injeta recursos na economia via compra de títulos de dívida para baixar as taxas de juros e impulsionar o crescimento. Com isso, a expectativa do mercado é de elevação gradual na taxa de juros americana (atual-mente entre 0% e 0,25%), tornando os investimentos no país mais atraentes. “A economia dos Estados Unidos está indo bem, o banco central é confiável e o país está mais autossuficiente do ponto de vista energético”, avalia Mariscal, do UBS. O banco recomenda que os investidores não coloquem mais recursos no Brasil e passem a investir no mercado americano.

A consultoria de investimentos Prudential também sugere a retirada de recursos do País, mas, no lugar dos Estados Unidos, recomenda aplicações no Japão. Enquanto o Ibovespa caiu 27,3% entre o início do ano e 10 de julho, o índice Nikkei 225 subiu 33%. No mesmo período, o Dow Jones teve alta de cerca de 14%. “Não acredito que os Estados Unidos vão elevar seus juros até 2015. Logo o mercado vai perceber isso e se estabilizar”, observa Preveen. Estagnado há décadas e sofrendo com deflação, o Japão anunciou, em abril, uma política econômica radical. Apelidada de Abenomics, consiste em injetar, em menos de dois anos, 130 trilhões de ienes (cerca de US$ 1,4 trilhão) na economia por meio da compra de títulos públicos. Para isso, o país vai imprimir dinheiro, provocando aquilo que o Brasil tanto teme: inflação. A aposta do governo é que junto com ela venha também a dinamização da economia, com aumento de produção e consumo. Os investidores estão confiantes. “O Japão está fazendo o possível para acabar com a deflação e crescer mais. Vemos boas perspectivas no mercado de ações deles”, afirma o estrategista da Prudential.
DECEPCIONADOS – As recomendações do UBS e da Prudential evidenciam a frustração dos estrangeiros com a economia brasileira. “A inflação está alta e a taxa de juros tem subido; isso deve impactar negativamente o crescimento, que já está baixo”, observa Praveen. Em julho, o Copom elevou a Selic para 8,5%, a terceira alta depois de a taxa de juros básica ter chegado ao piso de 7,25% em outubro do ano passado. “O tempo passa e o Brasil continua perdendo produtividade, sem fazer os investimentos necessários em infraestrutura”, critica Claudia Calich, diretora de mercados emergentes da
Invesco. Há também receio em relação à condução política. “Os estrangeiros, em geral, percebem o governo brasileiro como intervencionista, com poder sobre o Banco Central e não muito amigável ao mercado”, acrescenta Preeven. A deterioração da economia brasileira levou a Standard & Poor’s a colocá-la, no início de junho, em perspectiva negativa. “O País não tem mais espaço para promover crescimento econômico por meio do aumento da dívida pública, que está suficientemente alta. Isso pode causar uma queda no rating brasileiro”, alerta Sebastian Briozzo, analista da S&P para o Brasil. Atualmente, o País tem grau de investimento e possui nota BBB.

Os investidores ouvidos pela reportagem também não creem que as manifestações populares de junho serão capazes de tirar o País do marasmo. Se a corrupção diminuir e a eficiência da educação e dos transportes públicos aumentar, como exige a população, o Brasil terá um ambiente de investimentos mais atraente. Porém, há uma descrença com relação à resposta do governo aos clamores populares. “Temo que a consequência seja aumento na quantidade de subsídios, no controle de preços e na intervenção do Estado na economia”, pondera Mariscal, do UBS.

PÉ NO FREIO – O pessimismo dos investidores jogou um balde de água fria sobre o mercado de capitais brasileiro. Depois de um início de ano promissor, com seis ofertas públicas iniciais (IPOs) que captaram R$ 14,7 bilhões nos primeiros quatro meses de 2013, o mercado atravessa um momento de incerteza, com suspensão e cancelamento de ofertas. Até o início de julho, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) registrava a desistência de duas companhias que pretendiam abrir o capital – a Vix Logística e a Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae). A Multiplus também desistiu da emissão follow-on programada para 2013. “No segundo semestre do ano passado, houve uma deterioração de mercado que acabou nos levando a cancelar a oferta. Insistir num cenário desses poderia prejudicar a precificação da companhia”, justifica André
Gaia, diretor financeiro e de relações com investidores da Vix. Segundo ele, a abertura de capital continua nos planos da empresa, mas as perspectivas do mercado a curto e médio prazos são muito difíceis de enxergar.

O ano de 2014 tende a combinar a volatilidade do período eleitoral com um mercado adormecido pela Copa

A Votorantim Cimentos, que pretendia captar pelo menos R$ 7 bilhões este ano, solicitou à CVM a interrupção, até 11 de setembro, de sua oferta pública. “A suspensão tem menos a ver com a Votorantim Cimentos e mais com o Brasil. Está atrelada ao momento do mercado”, declara William Castro Alves, analista-chefe da corretora XP Investimentos. O mau humor dos investidores estrangeiros com o Brasil explica o declínio dos IPOs. “Até 2012, 70% dos recursos captados por essas ofertas no Brasil vinham de fora e 30% de dentro do país”, ressalta André Ferreira, sócio-líder de mercados estratégicos da consultoria Ernst & Young. Para Bruce Mescher, sócio-líder de global IFRS and offering services (GIOS) da Delloite, a situação atual do mercado brasileiro de ações é uma repetição do que ocorreu no primeiro semestre de anos anteriores. “É mais do mesmo. Em 2011 e 2012, também começamos bem otimistas”, lembra.

Apesar das turbulências, a companhia aérea Azul mantém a intenção de abrir seu capital. “A situação da Azul é comparável com a da Gol. As duas são bem diferentes, mas têm em comum a exposição ao mercado interno. Basta ver o que aconteceu com as ações da Gol para saber que este é um momento difícil para a Azul fazer a oferta pública inicial”, reflete um analista de empresas aéreas que trabalha para um grande banco estrangeiro. As ações da Gol tiveram queda acumulada de 44,4% no primeiro semestre de 2013. No segmento de moda, a InBrands, holding que engloba marcas como Richards, Ellus e Salinas, pretendia realizar sua emissão inaugural ainda em 2013, mas agora aguarda melhores condições de mercado. A empresa informa que não há data ou prazo para retomar o IPO. Em maio de 2011, a companhia havia protocolado na CVM um pedido de análise de oferta de ações, do qual desistiu em setembro do mesmo ano.

Recuos e adiamentos de ofertas públicas iniciais, todavia, não impediram a BM&FBovespa de se firmar no segundo trimestre do ano como a segunda bolsa no mundo em volume de recursos captados por meio de IPOs, perdendo apenas para a de Nova York. Fernando dos Santos Zorzo, sócio da área de mercado de capitais do escritório Pinheiro Neto Advogados, acredita que pelo menos cinco empresas assessoradas pelo escritório podem abrir o capital no segundo semestre de 2013 se a situação melhorar. Isso vai depender, na avaliação do advogado, da capacidade do governo de rea-
gir à piora econômica registrada no primeiro semestre. Para 2014, as perspectivas também não são animadoras. Na visão de Mescher, da Deloitte, o ano que vem deve combinar a volatilidade característica do período eleitoral com o mercado “um pouco dormente” por causa da realização da Copa do Mundo no Brasil. A esperança é que os estrangeiros voltarem a olhar para cá com interesse, em mais uma reversão de expectativas – desta vez, entretanto, para melhor.


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