Pesquisar
Close this search box.
Instrução 531 cria dificuldades para o mercado de FIDC
José Alves Ribeiro Jr.*

José Alves Ribeiro Jr.*

Os fundos de investimento em direitos creditórios (FIDCs) são instrumentos juridicamente flexíveis para operações de securitização, dada a variedade da natureza dos créditos passíveis de aquisição. São, também, importante mecanismo de desintermediação financeira, por substituir a atuação de instituições financeiras na alocação de recursos e permitir o acesso de empresas ao mercado de capitais.

Apesar disso, as ofertas públicas de cotas de FIDCs declinaram nos últimos anos. Excluídas operações com esforços restritos, foram feitas 30 ofertas em 2010, número que recuou para sete em 2015. Nesse período, os volumes movimentados caíram em torno de 70%.

Os dados não são fruto do acaso. Pode-se apontar como hipótese de causa as intervenções regulatórias contidas na Instrução 531. A norma decorreu de casos de perdas expressivas de investidores de determinados FIDCs, inclusive por fraudes.

A reação do regulador se iniciou com parecer da Procuradoria Federal Especializada da CVM¹, que estabeleceu entendimento de que o custodiante de um FIDC poderia terceirizar apenas a instituições financeiras a guarda dos documentos comprobatórios da existência dos direitos creditórios. Isso fez cessar a prática, até então comum, de se contratar o próprio cedente dos créditos como fiel depositário dos documentos.

Com a edição da Instrução 531, em fevereiro de 2013, foi permitida a contratação de empresas não financeiras especializadas para essa guarda, mas vedada a delegação da atividade ao cedente ou originador dos recebíveis, ao gestor e ao consultor especializado dos fundos, ou a partes relacionadas a esses agentes. A CVM justificou que as alterações propostas pretendiam fortalecer o papel do administrador e custodiante como gatekeepers em relação aos FIDCs, reforçando a delegação de competência fiscalizatória que já constava da Instrução 356, de 2001.

A crítica às alterações das regras deve ser realizada à luz do mandato legal da CVM. Com efeito, houve retração do mercado de FIDCs desde que a autarquia começou a mudar as regras, movimento que se cristalizou na Instrução 531.

Ocorre que as finalidades legais da atuação da CVM incluem o estímulo à expansão do mercado de capitais. Sua atuação deve levar em conta não só a proteção ao investidor e a prevenção de fraudes, mas igualmente, e de modo harmônico, a expansão do mercado — sem que um dos objetivos inviabilize o outro.

Em relação ao problema da terceirização da guarda de documentos comprobatórios, o estabelecimento de obrigações adicionais ao custodiante que subcontratasse um terceiro já seria suficiente para coibir a prática de fraudes pelos cedentes. Essa previsão obriga os custodiantes a verificar a efetiva e adequada prestação dos serviços pelo terceiro contratado e seria eficaz, também, em relação aos cedentes.

Ainda: proibir que o cedente atue como depositário é incompatível com a faculdade do administrador de contratá-lo para cobrar os créditos inadimplidos. Essa cobrança demanda o acesso, pelo cedente, aos documentos que ele mesmo não pode guardar por força da norma, o que gera um óbvio ônus operacional ao FIDC e aos seus investidores.

Outra incompatibilidade com relação à vedação à guarda é a permissão, em certos casos, para que o custodiante verifique a existência dos recebíveis integrantes da carteira do fundo (do lastro) por amostragem estatística. Isso já seria suficiente para garantir, com segurança matemática, a efetiva existência dos créditos cedidos ao FIDC, sanando a preocupação do regulador em relação à custódia física dos documentos comprobatórios.

Há, contudo, acertos nas Instrução 531, como a eliminação do conflito de interesses nos casos em que os gatekeepers do FIDC (administrador, custodiante, gestor e outros prestadores de serviços) acumulam o papel de cedentes de direitos creditórios. Isso previne a criação de estruturas de securitização da espécie “originar para vender” — nelas, os incentivos para os agentes econômicos são distorcidos em virtude do prévio conhecimento de que o risco de crédito relativo aos direitos creditórios eventualmente originados e cedidos serão suportados por terceiros.

Por fim, nos parece que seria mais adequado a CVM coibir eventuais desvios em relação à guarda da documentação pelo exercício de sua competência fiscalizatória, punindo tanto eventuais cedentes que cometam fraudes quanto práticas negligentes adotadas por gatekeepers. O olhar atento do regulador e a existência de punições rigorosas em caso de desvios teriam o duplo efeito de desestimular práticas vedadas e de imprimir ainda mais segurança e credibilidade ao mercado de capitais em geral e aos FIDCs em particular.

¹ MEMO/PFE-CVM/GJU-1/Nº 129/11


*José Alves Ribeiro Jr. ([email protected]) é sócio de mercado de capitais em Vaz, Barreto, Shingaki & Oioli Advogados


Para continuar lendo, cadastre-se!
E ganhe acesso gratuito
a 3 conteúdos mensalmente.


Ou assine a partir de R$ 34,40/mês!
Você terá acesso permanente
e ilimitado ao portal, além de descontos
especiais em cursos e webinars.


Você está lendo {{count_online}} de {{limit_online}} matérias gratuitas por mês

Você atingiu o limite de {{limit_online}} matérias gratuitas por mês.

Faça agora uma assinatura e tenha acesso ao melhor conteúdo sobre mercado de capitais


Ja é assinante? Clique aqui

mais
conteúdos

APROVEITE!

Adquira a Assinatura Superior por apenas R$ 0,90 no primeiro mês e tenha acesso ilimitado aos conteúdos no portal e no App.

Use o cupom 90centavos no carrinho.

A partir do 2º mês a parcela será de R$ 48,00.
Você pode cancelar a sua assinatura a qualquer momento.