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Globalização Improvável
Experiências recentes indicam que a consolidação das bolsas de valores no mundo é um movimento bem mais intrincado do que parece
, Globalização Improvável, Capital Aberto

Em entrevista à CAPITAL ABERTO, no ano 2007, John Thain, então presidente executivo e conselheiro da Nyse, recém–unida à Euronext, discorreu sobre o futuro das bolsas de valores num planeta globalizado. Segundo ele, os movimentos de consolidação levariam a um cenário de poucos players: “Acredito que, no mundo todo, vão existir cerca de três ou quatro grandes bolsas multiproduto”, projetou. Desde então, algumas uniões referendaram essa visão. Nasdaq juntou–se à nórdica OMX, e a Bolsa de Londres assinou os papéis com a italiana. Mas a história mais recente mostra que esse futuro já não parece tão provável como há cinco anos. O freio nos negócios das bolsas de valores, prejudicadas pela crise bancária na Europa, e os sentimentos nacionalistas vêm atravancando — e até inviabilizando — as tentativas de união.

A mais recente negativa a uma fusão foi dada em junho pelos acionistas do TMX Group, operador das Bolsas de Valores de Toronto e Montreal, no Canadá. O grupo pretendia se unir à inglesa London Stock Exchange (LSE), empresa que controla a Bolsa de Valores de Londres e a Borsa Italiana, mas não conseguiu a aprovação de dois terços de seus investidores, o quórum mínimo necessário para prosseguir com o negócio, avaliado em US$ 3,7 bilhões. Na Austrália, a rejeição à fusão entre a Australian Stock Exchange (ASX) e a asiática Singapore Exchange partiu dos reguladores. O negócio havia sido anunciado em 2010 e chegou a receber o aval da Australian Competition and Consumer Commission (ACCC). Mas, em abril deste ano, o Australia’s Treasurer, regulador local, decidiu vetar a operação alegando a preservação do interesse nacional.

Há poucas evidências de que as fusões concretizadas fizeram bem ao bolso dos acionistas

As bolsas de valores são consideradas parte do patrimônio de uma nação. E o caso Austrália–Cingapura deixou claro quem nem sempre os países estão dispostos a pagar o preço da ingerência estrangeira. No Canadá, em julho, o TMX Group anunciou que seu conselho de administração havia liberado a diretoria da empresa para estudar a proposta hostil feita em maio pelo Maple Group Acquisition Corporation, grupo formado por 13 firmas do setor financeiro canadense. Apesar de não ter sido solicitada, a oferta foi vista com bons olhos por permitir o crescimento da bolsa nacional sem entregar o principal mercado de negociação de ações e derivativos a estrangeiros. “É uma forma de fomentar a economia local”, observa Gilberto Biojone, fundador e membro do comitê executivo do International Stock Exchange Executives Emeriti (ISEEE), grupo formado por executivos e ex–executivos de bolsas de valores ao redor do mundo.

A passos lentos — e muito aguardados — caminha a união entre a Deutsche Börse, da Alemanha, e a Bolsa de Nova York (Nyse). Se unidas, passarão a ser a maior plataforma de ações e derivativos do mundo. Os alemães ficarão com 60% da nova empresa. Não que os norte–americanos não tenham tentado ficar com a Nyse. A Nasdaq OMX e a Intercontinental Exchange (ICE), ambas dos Estados Unidos, chegaram a se unir para apresentar uma proposta pela Bolsa de Nova York, mas desistiram diante das evidências de que o órgão antitruste norte–americano não aprovaria a transação.

Agora, o caminho está novamente livre para os alemães. Tanto que a Deutsche Börse encomendou um estudo sobre o impacto da fusão entre as duas bolsas intitulado The Economic Impact of the Deutsche Börse–Nyse Euronext Merger on the European Financial Markets. Elaborado pela Hertie School of Governance, de Berlim, sob a autoria de Henrik Enderlein, ex–economista do Banco Central Europeu em Frankfurt, o estudo conclui que o negócio seria uma oportunidade para as partes fortalecerem seus mercados e respectivos ambientes regulatórios, especialmente após a crise financeira. Além disso, ajudaria a recuperar o terreno perdido tanto para outros centros financeiros quanto para ambientes alternativos de negociação, como as dark pools e os mercados de balcão (OTC, na sigla em inglês).

GANHOS MODESTOS — Além dos entraves gerados por questões de soberania, há poucas evidências de que as fusões entre bolsas já concretizadas fizeram bem ao bolso dos acionistas. Dentre as grandes, as primeiras a unir forças foram a Euronext (que, na ocasião, já englobava as Bolsas de Amsterdã, Bruxelas, Paris e Lisboa) e a Liffe, bolsa de origem londrina especializada em derivativos. No entanto, após quase dez anos de parceria, os benefícios parecem limitados. Em 2002, ano da fusão, a Euronext tinha sozinha 1.114 empresas listadas. No fechamento de 2010, segundo dados da World Federation of Exchanges (WFE), eram 1.135 companhias no segmento europeu da NyseEuronext — resultado da fusão com a Nyse, em 2007.

A junção com os norte–americanos também não rendeu frutos para os europeus. No encerramento de 2006, ano anterior à fusão com a Nyse, a Euronext registrou margem líquida de 32,82%. No ano seguinte, após a união, o indicador da nova companhia caiu para 16,32%. Já para a Nyse o resultado parece ter sido muito melhor. Em 2006, sua margem era de apenas 8,62%. Os números foram prejudicados também pela crise financeira que se instalou em 2008. Em 2007, ano da fusão com a Euronext, a Nyse movimentou quase US$ 30 trilhões com o segmento de ações, num total de 2.297 companhias listadas. No ano passado, o volume caiu para US$ 17,8 trilhões, e o número de empresas, para 2.238. O valor das ações da própria bolsa norte–americana também despencou. Em 2007, chegou a superar a casa dos US$ 100. Atualmente, está em US$ 24.

Outro exemplo é a fusão entre a LSE e a Borsa Italiana. No ano fiscal encerrado em 31 de março de 2007, a bolsa londrina registrou margem operacional de 31,63%. No período seguinte, já unida aos italianos, passou para 32,66%. No último exercício, finalizado em março deste ano, a margem caiu para 23,18%. Os acionistas da Nasdaq viram uma deterioração ainda maior nos resultados. Em 2007, sua margem foi de 21,22%. Em 2008, quando se juntou aos nórdicos da OMX, o indicador despencou para 8,73%.

DESAFIO TRANSCONTINENTAL — Segundo um ex–executivo do setor que pediu para não ser identificado, as fusões entre bolsas podem gerar lucros de curto prazo, oriundos dos ganhos em escala, mas nem sempre os indicadores de desempenho seguirão o mesmo caminho. “Nyse e Euronext é um exemplo de junção entre bolsas que não faz sentido”, diz. Para ele, o fato de estarem em países diferentes, sob sistemas regulatórios e de câmbio distintos, limita as possibilidades de ganho com sinergias no longo prazo.

Outro aspecto das fusões entre bolsas de localidades distintas é a dificuldade para aumentar os volumes negociados. O número de ordens não cresce somente porque duas grandes plataformas se uniram. “O dinheiro disponível continua sendo o mesmo”, constata Biojone. E por trás dos recursos estão os gestores, que continuam sendo locais, apesar da ideia de que o dinheiro está cada vez mais globalizado.

No Brasil, a união da BM&F, focada em derivativos, com a Bovespa, atuante na negociação de ações, trouxe benefícios com as sinergias obtidas. O dia a dia dos investidores foi facilitado, e hoje é possível negociar ativos diferentes em um único ambiente. A combinação também permitiu otimizar os recursos destinados aos investimentos em infraestrutura. “As fusões de bolsas locais são boas, porque esse tipo de negócio requer investimento elevado”, explica Rodolfo Amstalden, analista da Empiricus Research.

O próximo passo da BM&FBovespa pode ser o avanço para outros países. Mas alguns analistas preferem a estratégia de aumentar o volume de negociação da Bolsa através dos acordos em andamento, e não com a aquisição de concorrentes. “A parceria com bolsas como a de Hong Kong ou de Xangai pode ser vantajosa. Nossos investidores não comprariam tantas ações asiáticas, mas eles teriam interesse em negociar papéis listados aqui”, analisa Amstalden. “O Brasil está com um prato cheio nas mãos”, completa Carlos Macedo, analista de renda variável do Goldman Sachs. Ele acredita que não há, atualmente, uma janela de mercado que justifique movimento de fusão. O presidente da BM&FBovespa, Edemir Pinto, tem afirmado que sua intenção, por ora, é fortalecer parcerias em vez de partir para aquisições. Mais um indício de que as previsões de John Thain, se ainda forem válidas, estão longe de se concretizar.

Conteúdo extra

Clique e veja um estudo completo sobre a tentativa de fusão das bolsas de valores alemã e de Nova York


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