Crise boa para investir
Florian Bartunek, gestor da Constellation Asset, fala de oportunidades para investidores
, Crise boa para investir, Capital Aberto

Florian Bartunek*/ Arte: Julia Padula

Os proprietários dos 3,5 bilhões de reais confiados à gestão de Florian Bartunek estão felizes com o Brasil. Estrangeira em sua maioria, a clientela da Constellation Asset, fundada por Bartunek há 16 anos em parceria com o empresário Jorge Paulo Lemann, faz bom proveito das oportunidades deflagradas pela crise econômica. É em momentos difíceis, afinal, que o tipo de companhia adorada pela Constellation, com balanço forte e líder em seu segmento de atuação, tende a se dar bem — ela pode livrar-se do concorrente que a incomoda por meio de uma aquisição, por exemplo, ou simplesmente valer-se de sua robustez para baixar os preços dos produtos e arrebatar fatias de mercado. Tirado o saldo, a conclusão é clara. “Para o nosso tipo de cliente, que tem visão de longo prazo, a crise é quase uma dádiva”, resume Bartunek, que entregou uma rentabilidade de 63% a seus investidores entre 2014 e 2017, acima da alta de 48% do Ibovespa no mesmo intervalo. Investidora de ações clássica, dedicada a escrutinar os fundamentos das empresas e a descobrir aquelas com espaço para se valorizar, a Constellation não teme a incógnita das eleições. “O estrangeiro que investe com a gente vê os problemas políticos do Brasil com tranquilidade. As coisas não são tão ruins quanto parecem.”

A comparação com outros emergentes explica parte da tranquilidade. “Instabilidade política existe em vários países latino-americanos; além do mais, Rússia e China tampouco são um passeio”, diz Bartunek. A excelência de certas empresas brasileiras também conforta. “A Localiza é provavelmente uma das melhores locadoras de carros do mundo, a Ambev é de certo a melhor cervejaria, e o Itaú não perde em eficiência para um banco como o J.P.Morgan”, observa o gestor. Além de confiar nos predicados do Brasil e de seus empresários, Bartunek está otimista com a economia. Após uma recessão grave, o ciclo está virando. E, a seu favor, as empresas têm como trunfo o fato de terem se tornado mais eficientes durante a escassez — uma combinação oportuna que tende a gerar forte aceleração de lucros, conforme assinalou o gestor em sua carta aos investidores de dezembro de 2017. Para este ano, a Constellation estima um crescimento de 2,7% do PIB, além de uma elevação média de 26% nos lucros das companhias que compõem seu portfólio.

Para percorrer 2018 sem trepidações, apesar do nevoeiro político, existe apenas um caminho na visão de Bartunek: investir nas empresas certas. Isso significa manter-se fiel à estratégia que adotou, inspirada no pensamento do guru Warren Buffett: companhias boas para investir são aquelas com negócios de qualidade, não necessariamente com preço atrativo. Brasileiros, ele constata, têm mania de gostar de coisa barata. “Vão a um outlet e compram sapato de número menor porque está barato, ou uma roupa que não cai bem porque está em promoção. Em resumo, compram Magazine Luiza em vez de Lojas Renner”, brinca, deixando escapar a preferência. Alternativas mais emocionantes, ele afirma, não costumam ser a sua escolha. “Entre um Volkswagen e um carro de marca pouco conhecida que pode surpreender, prefiro pagar um pouco mais e levar o Volkswagen. Melhor não inventar moda”, assume. No portfólio da Constellation em 2017, a rede de laboratórios Fleury, a agência de turismo CVC, a bolsa de valores brasileira (B3) e a rede de farmácias Raia Drogasil geraram alegrias. No varejo, além de Lojas Renner, a gestora aposta na plataforma de e-commerce argentina Mercado Livre, a maior da América Latina, listada na Nasdaq.

As empresas de reduzida capitalização, conhecidas como small caps, não chegam a corresponder 1% do portfólio da Constellation. “Elas são como sereias: te encantam para depois ver o navio afundar.” Por causa das margens modestas, podem dobrar de tamanho com alguma facilidade ao se expandirem, o que seduz numerosos investidores. Se tudo o que é extravagante pode dar muito certo ou muito errado, Bartunek certamente prefere não correr o risco do “muito errado”. “Estamos numa maratona, não numa corrida de 100 metros”, afirma, referindo-se à sua abordagem de longo prazo. Como gestor de investimentos, ele acredita que o melhor não é chegar ao topo graças a investimentos fabulosos, mas manter-se apenas perto do topo. E num momento de indefinições como o vivido pelo Brasil, o cuidado deve ser redobrado: é bom deixar um pouco de dinheiro em caixa e focar nas companhias com as maiores chances de entregar o que prometem. “Prefiro ser a tartaruga em vez da lebre, a formiga em vez da cigarra”, diz. “Não quero ser o melhor dos melhores.” Quem investiu no fundo de ações da Constellation de 2007 até o fim do ano passado viu seu dinheiro render 363%, mais do que cinco vezes o retorno do Ibovespa.

Além de Buffett, uma forte inspiração para Bartunek é o investidor brasileiro e seu sócio Lemann — o célebre fundador do banco Garantia e da GP Investimentos e controlador de ícones como o conglomerado de bebidas AB Inbev, a rede de lanchonetes Burger King e a fabricante de alimentos Heinz. O encontro dos dois aconteceu no fim dos anos 1990. Lemann, que tinha acabado de vender o Garantia para o Credit Suisse e, por contrato, não podia abrir outro banco, queria montar uma gestora de recursos para cuidar dos investimentos dele e dos sócios Marcel Telles e Beto Sicupira, além do dinheiro de amigos. Bartunek, que ingressara no Pactual ainda na faculdade, tornara-se chefe geral de análise de investimentos e, aos 25 anos, já era sócio do banco, estava em busca de novos caminhos — a liga entre os donos do Pactual, na época liderado por Luiz Cezar Fernandes, havia se rompido.

Bartunek, que não conhecia Lemann pessoalmente, ligou para a secretária dele e pediu uma conversa. Em busca de um gestor para a sua nova empreitada, o executivo viu em Bartunek o cara certo. A passagem é descrita por Bartunek no livro Fora da curva (Editora Portfolio-Penguin), publicado em 2016. O escritório de investimentos de Lemann chamava-se Utor — termo que significa lucro, em latim. Era o embrião do que, quatro anos depois, seria transformado na Constellation.

Hoje Bartunek pilota a gestora em parceria com outros dez sócios. Mas atrair e reter talentos, ele admite, tem sido um ponto de atenção em sua jornada como empreendedor. “Meus maiores erros foram com pessoas, não com investimentos”, afirma em Fora da curva. “Em certos casos, acho que o erro começa logo na contratação.” Foi com o objetivo de virar esse placar a seu favor que Bartunek começou a promover, há três anos, o Constellation Challenge, uma competição de avaliação de empresas de que participam jovens universitários. Monitorados por profissionais da gestora, os candidatos aprendem os conceitos da análise fundamentalista ao elaborar um caso de investimento. Na última edição do desafio, em 2017, houve cerca de 700 inscritos.

Capital humano é, na opinião de Bartunek, um dos maiores desafios contemporâneos da gestão de recursos. Nos anos 1990, quando ele começou, havia uma fila de jovens talentosos que aceitavam trabalhar até tarde e serem destratados pelo chefe para, num futuro não muito distante, ficarem ricos com os elevados bônus que receberiam. Agora, a história é outra. “A maioria dos jovens que saem da faculdade quer começar seu próprio negócio, envolver-se com ONGs ou com a política”, afirma o gestor na carta aos investidores do fim do ano. Nesse contexto, Bartunek alerta os colegas à frente de gestoras para a importância de se desenvolverem como empresários. “Asset é como sapataria. O gestor trabalha como se sapateiro fosse, mas alguém precisa gerir o negócio.”

Outro desafio da atualidade, especialmente para os que trabalham com ações, é a escolha das empresas. Até pouco tempo atrás, ele lembra, não era preciso discutir se Ambev, Itaú ou Lojas Renner sofreriam alguma ruptura em seus negócios — bastava ser bom o suficiente para estimar o crescimento do lucro com acerto, calcular o preço exato do papel, e pronto. Na atual circunstância, o potencial de ruptura atinge todas as indústrias — “somente o tempo e a intensidade vão variar”, afirma Bartunek —, o que provoca enorme incerteza e riscos.

Para enfrentar a nova era, portanto, é preciso atentar para a governança dentro de casa. Atributos como a diversidade, por exemplo, podem ter impacto importante sobre os resultados. “Infelizmente, tendemos a contratar pessoas que pensam parecido com a gente. Mas os melhores insights surgem da contraposição de ideias, não da discussão entre iguais”, enfatiza. Em síntese, o futuro é desafiador e estimulante não só para as empresas, mas também para as assets. A gestão do negócio, alerta Bartunek, tornou-se tão importante quanto a gestão do portfolio.


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