Ações submersas
Um total de 114 empresas valem menos na BM&FBovespa que o registrado em seus livros. Dentre elas, figuram nomes de peso, cujas cotações sofrem com excesso de incertezas

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Na vida de uma companhia aberta, um cociente separa claramente o passado do futuro. Quando o preço da ação na bolsa de valores é superior ao contabilizado no patrimônio líquido, tem-se o bom sinal de que as perspectivas de futuro são mais valiosas que toda a riqueza gerada pela companhia até então. Já se o valor cotado no pregão é menor que o patrimonial, eis um mau presságio. O futuro da companhia não é brilhante o suficiente para superar o que dela já foi feito — ao menos não naquele momento. Investidores se recusam a pagar mais que o indicado nos livros da companhia, porque não veem perspectivas que justifiquem esse sobrepreço.

É curioso observar como essa relação entre futuro e passado, determinada por um múltiplo que o mercado gosta de chamar de P/VPA (preço/valor patrimonial da ação), é distinta entre as companhias. Os administradores da debutante Magazine Luiza provavelmente se orgulham do fato de suas ações valerem 37 vezes mais na Bolsa que nos livros, assim como os seus colegas de Cielo, Lojas Americanas e Souza Cruz. Em uma planilha de P/VPAs ordenados do maior para o menor, essas empresas destacam-se nos primeiríssimos lugares, com números superiores a 15 vezes — uma marca que certamente faz inveja ao restante da amostra, cuja mediana localiza-se na comedida e realista faixa de 1,4 vez.

Em 2011, devido ao mergulho da bolsa paulista — em 27 de julho, a queda acumulada era de 13% —, o cenário se tornou propício para certas companhias, especialmente aquelas para as quais os investidores torcem o nariz, assistirem a um enredo em que seus passados desafortunadamente passam a valer mais que seus futuros. Nesta reportagem, a CAPITAL ABERTO selecionou duas companhias e um banco de destaque e consultou analistas sobre as razões que explicariam o fato de suas cotações valerem menos que seus patrimônios.

No fim de julho, um total de 114 empresas tinham ações negociadas por valor inferior ao patrimonial na BM&FBovespa. No pano de fundo, prevalece a incerteza sobre a economia mundial, que arrefece o ânimo dos investidores. “De cinco pregões na semana, quatro têm sido de queda. Os sentimentos pesam mais que os fundamentos”, diz Leandro Martins, analista-chefe da corretora Walpires. Ao analisarmos os casos individualmente, contudo, enxergamos os temores que, além da volatilidade externa, justificam os P/VPAs submersos das três grandes empresas escolhidas. Confira a seguir.

USIMINAS: MAR DE DÚVIDAS NO CURTO PRAZO — Maior grupo siderúrgico do País em volume de produção, a companhia sofre com o preço das matérias-primas e a crescente concorrência com estrangeiros no mercado local. A analista Daniella Maia, da corretora Ativa, nota que a Usiminas depende de terceiros para obter 60% do minério de ferro que consome — ao contrário, por exemplo, da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), que chega a exportar excedentes da Casa de Pedra, sua mina própria. O recente acordo entre Usiminas e MBL em relação aos direitos minerários de Serra Azul só terá reflexos entre 2014 e 2015, o que parece um tanto tardio. “Os planos anunciados têm o objetivo de aumentar a produção de minério de 7 milhões para 10 milhões de toneladas em 2012, mas a autossuficiência só virá em 2014,” lamenta Daniella.

Devido à estratégia baseada em investimentos de médio prazo, a analista não arrisca um prognóstico sobre quando a ação voltará a ser negociada acima do valor patrimonial (o P/VPA caiu abaixo de 1,0 em abril, após dois anos flutuando acima dessa faixa). “Nosso preço-alvo foi fixado para junho de 2012 em R$ 18,60, portanto acima do VPA, mas é difícil dizer se antes disso haverá uma recuperação mais forte”, explica.

“De cinco pregões na semana, quatro têm sido de queda. Os sentimentos pesam mais que os fundamentos”

A estrutura de custos foi alvo de questionamentos ao presidente da companhia, Wilson Brumer, durante a teleconferência sobre o desempenho no primeiro trimestre deste ano. “Minério de ferro é, a nosso ver, um fator preponderante hoje no sentido de redução de custos. Alguns anos atrás, a siderurgia investia pouco nesse setor, até porque esse não era um componente tão fundamental na matriz”, explica Brumer, que chegou à Usiminas para substituir Marco Antônio Castelo Branco, o executivo que deixou arestas ao mudar o estilo de comando da companhia, abrir disputas com fornecedores e clientes e demitir três mil funcionários.

Em relatório de 25 de fevereiro, o analista Felipe Reis, do Santander, arrolou os planos promissores da siderúrgica, como a autossuficiência em energia para 2015, com economia anual de R$ 350 milhões, e a redução de custo por tonelada/caixa de produção. Mas descartou efeitos de curto prazo. Reis observou que reajustes de preços do aço serão improváveis e admitiu que os próximos resultados de Ebitda tendem a se mostrar inferiores às expectativas.

SANTANDER: POTENCIAL PARA FAZER MAIS — A dificuldade em avançar sobre o market share dos principais concorrentes (Itaú-Unibanco, Bradesco e Banco do Brasil) é o calcanhar de aquiles do Santander, cujo P/VPA registrava a marca de 0,8 em 27 de julho.
Os analistas do Banco Votorantim, Raquel Varela e Raphael Nascimento, consideram que Bradesco e Itaú-Unibanco estão mais bem posicionados para acessar a população brasileira, inclusive do ponto de vista geográfico. Fortemente concentrada no Sudeste, a rede do Santander limita as possibilidades do banco de aproveitar a ascensão do poder aquisitivo das classes populares, proporcionalmente mais numerosas em outras regiões do País.

A lentidão no crescimento do Santander, em especial se levada em conta a alavancagem superior à média do setor, é outro fator citado com frequência por analistas. Luciana Leocádio, da corretora Ativa, lembra que o banco é altamente capitalizado e tem um porte competitivo no País desde que incorporou o ABN-Amro/Real. “Para a estrutura de que dispõe, o Santander teria que apresentar um crescimento da carteira de crédito e da rentabilidade sobre o patrimônio líquido bem maior”, argumenta. “O discurso na oferta pública de ações em 2009 era de avanço rápido, e os minoritários incorporaram essa expectativa. Por isso houve uma certa decepção.”

O fato de a matriz do banco ser na Espanha — um atributo altamente positivo em termos de solidez e força até a crise de 2008 estourar — também gera receio, segundo Luciana. Teme-se uma contaminação pela crise europeia.

JBS: UMA DÍVIDA NO CAMINHO — O receio dos investidores em relação à JBS, que assumiu posições de destaque nos Estados Unidos e se tornou um dos principais players globais do setor de carnes, está ligado, em parte, a fatores que independem da empresa, como os efeitos do La Niña (resfriamento das águas do Pacífico) sobre a oferta de gado ou à alta do milho e da soja no Brasil e nos EUA. Mas também se deve a decisões estratégicas, como o interesse na norte-americana Sara Lee, uma das maiores do planeta no segmento.

Relatório de Pedro Herrera e Diego Maia, do HSBC, cita a oferta de US$ 17,50 por ação da Sara Lee em meados de dezembro. Por esse parâmetro, o valor de mercado da empresa pretendida alcançaria cerca de US$ 11 bilhões — um desafio e tanto para um grupo com uma dívida líquida de R$ 10,6 bilhões na virada do ano. “Acreditamos que os investidores podem reagir negativamente a outra aquisição grande e complexa pelo JBS, pois ainda estão consolidando a Bertin e a Pilgrim’s Pride”, afirmaram os dois analistas.

O fantasma da dívida prejudica a avaliação da companhia na Bolsa. Desde dezembro de 2009, o P/VPA da JBS gira em torno de 1,0, um cenário bem diferente do múltiplo de 4,5 vezes exibido em abril de 2007, quando as ações foram listadas no pregão. Na teleconferência de resultados do primeiro trimestre, o analista Carlos Albano, do Citibank, foi enfático: apesar do resultado muito bom, a empresa ainda não gerou caixa em 2011 e, para piorar, aumentou a dívida líquida.

Em resposta ao analista, o presidente da JBS, Wesley Batista, ressaltou que os preços subiram muito. O milho disparou de forma brusca, gerando o resultado desapontador na Pilgrim’s, uma de suas subsidiárias. A necessidade de capital de giro, diante desse cenário, aumentou de forma expressiva.
Batista prometeu melhoras, mas não definiu prazos.
“É clara para nós a necessidade de geração de caixa positiva, e temos confiança na redução da dívida. Estamos chegando a um patamar em que isso vai acontecer. Mas é preciso haver estabilização de preço.”


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