No meu primeiro artigo para a CAPITAL ABERTO, em janeiro de 2016, antes do impeachment de Dilma Rousseff, escrevi que as principais instituições brasileiras estavam preservadas, apesar das tentativas recentes de corroê-las. Afirmei também que o País precisava voltar a manter e a reformar os pilares da democracia e da economia. Depois de tantas colunas sobre conjuntura, acho que vale a pena voltar àquele texto e relembrar os avanços que o Brasil fez nas últimas décadas.
O Brasil é uma democracia em pleno funcionamento. A imprensa é livre e desde 1989 as eleições acontecem periodicamente. Houve alternância entre os principais partidos e a Constituição de 1988 foi o guia para o impeachment de dois presidentes eleitos. Os três poderes são independentes, apesar de nem sempre conviverem em harmonia. Como em quase todas as grandes democracias, as mudanças são lentas e exigem muita negociação e acordos, e isso é um problema quando a Constituição exige reformas constantes — pois a Carta de 1988 foi magnânima em seus objetivos e concisa nas fontes de recursos para obtê-los.
As políticas públicas carecem de melhor desenho e avaliação, mas garantiram avanços sociais importantes que devem ser celebrados, como na educação, com a universalização do ensino básico para crianças. Para tentar diminuir os efeitos da pobreza, o governo criou programas de distribuição direta de renda focados na população mais pobre. Na saúde, o Brasil é referência no tratamento e na prevenção de doenças infecciosas, mas ainda tem nível elevado de mortalidade infantil.
Na economia, as grandes conquistas foram a redução da inflação e da taxa de juros e o equilíbrio do balanço de pagamentos. A história da estabilização da inflação está bem contada, mas a taxa de juros demorou mais para cair. Só depois da consolidação do superávit primário no patamar de 3%, no começo da década passada, a taxa de juros entrou em trajetória descendente, junto com inflação sob controle e crescimento acelerado. Algo inimaginável para os economistas que dizem que a austeridade fiscal só atrapalha o crescimento. Por último, as crises de balanço de pagamentos que nos assombraram no passado hoje parecem distantes. O ambiente internacional favorável na década passada possibilitou acúmulo de reservas internacionais acima do que o País precisa com a entrada de recursos via investimentos diretos e financeiros e via superávits comerciais.
Obviamente ainda há muito o que fazer. Os dois pontos em que o Brasil não avançou tanto quanto poderia são as contas públicas e a abertura ao mundo. O primeiro problema foi parcialmente resolvido após a estabilização em 1994 e principalmente após 1998. O superávit primário de pelo menos 2% em média na década passada foi conquistado com aumentos sucessivos de impostos que compensaram crescimento de gastos, principalmente obrigatórios. O grande marco dessa época é a lei de responsabilidade fiscal, que até recentemente evitou problemas fiscais em estados e municípios ao controlar os gastos rígidos e o endividamento. A miríade de regras não impediu que o governo anterior retrocedesse 30 anos nesse tema. A redação da regra de ouro (dispositivo constitucional que impede que gasto com juros seja maior do que o investimento público) implica que só agora, quase cinco anos depois da piora do resultado fiscal, os políticos tenham que achar meios de enquadrar o orçamento na regra.
A abertura é ainda mais grave, pois nunca houve um esforço genuíno para inserir o País no mundo. As ideias de escassez de moeda forte e sua derivada, a substituição de importação, prevaleceram na mente da elite nacional. Depois que as vantagens da globalização ficaram claras e o Brasil ficou isolado com seus acordos comerciais com Egito, Israel e Palestina (fora das Américas), até mesmo a Fiesp, a maior defensora do protecionismo, começa a pedir uma abertura lenta, gradual e segura.
Os avanços institucionais do Brasil nas últimas décadas são inegáveis. Ficamos inundados de notícias de curto prazo e perdemos a visão de longo prazo. Muitas conquistas são parciais e a qualidade dos serviços oferecidos não estão à altura do que desejamos, mas ter em mente o que foi feito e para onde vamos é essencial para se dar um sentido maior para a necessidade de reformas.
*Evandro Buccini é economista-chefe da Rio Bravo Investimentos
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