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Luiz Orenstein advoga por um mundo mais coletivo
Co-fundador da Dynamo diz não acreditar que a meritocracia, fundamentalmente individual, seja o melhor modelo
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Luiz Orenstein | Foto: Régis Filho

Luiz Orenstein queria que o filho fosse surfista e que a filha trabalhasse com teatro. Paulo é doutor em data science por Stanford e Leila é gestora de investimentos em uma casa concorrente da lendária Dynamo, estabelecida nos anos 1990 por Orenstein e outros sócios. Mas ele aceita o destino — afinal, tampouco seguiu o script que havia traçado para si: uma confortável aposentadoria no BNDES.


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A escolha da instituição de fomento — cuja sigla naquele tempo terminava no “E” (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico) — foi embalada pelo idealismo do movimento estudantil dos anos 1960 e 1970 e pelo desejo de Orenstein de atuar na área social. “Fui para lá, em 1976, como um idealista. A instituição já tinha uma tradição intelectual progressista muito forte e eu gostava da ideia de trabalhar com desenvolvimento econômico”, relata.

A lógica ditaria que o lugar certo para Orenstein no banco seria o departamento de planejamento, palco de discussões e planos apaixonados influenciados pelo modelo de nacional desenvolvimentismo da Comissão Econômica para a América Latina (Cepal), da ONU — principalmente pela ênfase à substituição de importações. Só que, com o segundo Plano Nacional de Desenvolvimento do regime militar a todo vapor no governo do presidente general Ernesto Geisel (1974-1980), a instituição precisava mesmo era de cérebros e braços nas áreas industriais. Assim, Orenstein foi parar no departamento de indústria química — para ele “um lugar ácido”, mas para o governo um ingrediente estratégico na agenda de aumento da capacidade energética e da produção de insumos básicos.

Quando o BNDE ganhou o “S”, a inclinação de Orenstein para o social o levou à superintendência da área de saúde, alimentação e educação, em 1982. Segundo relatos que ele fez ao Museu da Pessoa, viu “coisas horrorosas” nas viagens a trabalho, como um manicômio no interior do Maranhão e a chocante miséria in loco. O contraste entre a excelência dos departamentos do BNDES que tratavam do desenvolvimento industrial e as dificuldades de entendimento, planejamento e execução da recém-criada área social o impressionaram. “Chegou uma hora em que eu não aguentava mais ver aquela coisa tão difícil e ao mesmo tempo tão necessitada. Me deu um estresse. Fui para a área de infraestrutura e fiquei um ano e pouco”, relatou ao Museu.


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Foi lá que Orenstein conheceu Dilson Funaro, o industrial paulista que ocupou brevemente a presidência do BNDES antes de assumir a pasta da Fazenda com a missão de engendrar e executar o primeiro plano de estabilização econômica dos vários que tentaram debelar a inflação: o Plano Cruzado, em 1986. “Dilson era uma pessoa que tinha visões muito generosas para o País”, recorda Orenstein, ressaltando à CAPITAL ABERTO como o período do Cruzado deixou marcas profundas na sua vida — como de resto em todos os brasileiros que eram adultos naquela época.

Se como “tecnocrata” Orenstein confiava que os grandes problemas do desenvolvimento econômico poderiam ser resolvidos tecnicamente, o colapso do Cruzado o fez ver que a política e a ação humana eram ingredientes fundamentais para fazer boas ideias funcionarem. Ou, como ensina o iluminismo escocês, citado por ele, “a História é o resultado da ação humana, mas não de seus desígnios”. Assim, o Cruzado, tecnicamente quase perfeito, segundo Orenstein, foi corrompido pela natureza humana, o egoísmo, a mesquinharia e a falta de patriotismo.

Essa desilusão criou uma inflexão na sua jornada. Orenstein tirou uma licença de quatro anos do banco para cursar um doutorado em Ciência Política — dois anos no Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj) e mais dois na Universidade da Califórnia, em San Diego. Sua tese estava calcada na teoria da ação coletiva, surgida nos anos 1960 a partir do movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos e que procurava entender o que leva um grupo de pessoas a trabalhar juntas por cooperação e não por competição e conflito. Rendeu o livro A Estratégia da Ação Coletiva, em que ele recorre à Teoria dos Jogos para apontar soluções a problemas de interação social.


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De volta ao Brasil, na virada da década de 1980 para 1990, Orenstein reintegrou-se ao BNDES, desta vez como diretor de crédito, ocasião em que conheceu Persio Arida, que mais tarde o levaria ao Banco Opportunity. Em quase 20 anos no banco de fomento, Orenstein ocupou numerosas funções e cargos diversos, com exceção da presidência. Àquela altura, diretores originários dos quadros técnicos do BNDES eram raros. “O horizonte pós-diretoria era muito enevoado”, descreve. “Isso foi o que me empurrou para fora do banco — junto com o nascimento dos meus filhos.”

Como o cenário ensejava uma mudança, veio a calhar o convite de Arida para que migrasse para o Opportunity, onde o ex-presidente do Banco Central chefiava a área de asset management. Ficou menos de dois anos, porque o banco de investimento não era exatamente uma instituição voltada para investimentos de longo prazo. A criação da Dynamo se encaixava muito mais no seu perfil “desenvolvimentista”.

A proposta inicial, incólume ainda hoje, era trabalhar no mercado de capitais seguindo à risca os preceitos da escola fundamentalista para análise de ações. Ao mesmo tempo, dar esse passo era um projeto de vida: fazer o que se gosta e de forma mais cooperativa do que competitiva ou conflitiva, uma concepção partilhada inicialmente por Pedro Eberle e Bruno Rocha, que foram apresentados um ao outro por um amigo comum, Rogério Castro Maia, que então trabalhava no Banco Garantia.

Eberle e Rocha foram os primeiros a conversar sobre a criação de uma gestora focada em value investment, uma novidade no mercado brasileiro de 1993. Em 1997, Orenstein juntou-se a eles, assim como Marcelo Stallone, o que compôs a geração dos fundadores da Dynamo. Anos mais tarde, Eberle e Stallone saíram, mas, segundo Orenstein, “estão sempre por aqui”. Rocha foi para Londres, em 2006, abrir uma sucursal da gestora. Depois vieram a segunda geração de sócios, integrada por Pedro Damasceno, cuja morte prematura, em 2017, chocou Orenstein profissional e pessoalmente (“tanto que prefiro não falar disso”), e a terceira, formada praticamente de crias da casa, como se orgulha em classificar.

A decisão da Dynamo de seguir a estratégia de value investment, completamente fora do mainstream dos mercados no início da década de 1990, não foi trivial. “Não tinha charme, não tinha glamour. Éramos nós, um grupo de garotos fracos, amedrontados, querendo fazer uma coisa com muito estudo, muita preparação e ética.” Depois disso veio uma fase razoavelmente longa em que amigos e familiares eram os principais clientes de uma asset sem área de vendas e marketing, que cresceu basicamente na base da propaganda boca a boca. Até que, na virada do milênio, a Dynamo passou a mirar os endowments de universidades americanas sem qualquer tradição de investimento no Brasil. “Por alguma razão, o que nós fazíamos era muito mais fácil de ser entendido lá do que aqui. No Brasil, éramos off Broadway; lá, éramos Broadway.”

O primeiro investidor cochichou para o segundo, o segundo para o terceiro, e os garotos assustados passaram a ser gestores desses investidores que hoje compõem uma parte importante dos recursos sob gestão da Dynamo. “Muitos são clientes há mais de dez anos, com todos os vaivéns da economia e da política brasileira”, sublinha Orenstein. O ingresso dos endowments foi grande o suficiente para fechar a captação dos fundos da gestora no Brasil.

Uma notável particularidade da Dynamo é a ausência de hierarquia de cargos. Quem está há mais tempo na gestora é ouvido com atenção, mas ninguém manda sozinho. “O mercado financeiro não é um setor que se caracterize por privilegiar ação coletiva; ao contrário, a meritocracia é fundamentalmente individual. Mas não acreditamos que esse seja o melhor modelo”, afirma Orenstein.

Na Dynamo, não há bônus atrelados a metas específicas. Os lucros são divididos entre todos, conforme a participação de cada um, reforçando a importância da coletividade, embora de forma escalonada: os mais velhos recebem mais, enquanto a remuneração dos mais novos vai subindo de forma lenta, gradual e segura. “Muita gente dizia que não se podia conjugar seriedade, ética e profissionalismo. Achavam que era ingenuidade. Ainda bem que nunca demos bola pra isso!”


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