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Hora do adeus
Momento econômico abre espaço para ofertas de aquisição complicadas

hora-do-adeusAs ofertas públicas de aquisição de ações (OPAs) estão em alta. Diante da perspectiva econômica desfavorável, os preços atraentes na bolsa de valores viraram chamarizes para grandes acionistas adquirirem os papéis em circulação, fechando o capital da companhia ou ao menos enxugando a liquidez. As características dessas ofertas chamam a atenção: elas carregam novidades que as tornam tão elaboradas quanto enigmáticas. Os complicadores são vários, e o objetivo do ofertante é um só: pagar o menor valor possível, a fim de maximizar o retorno do investimento. A movimentação teve início no começo do ano passado, com a oferta de aquisição das ações da Providência, e se aprofundou com as transações anunciadas por BHG e BR Properties. Nesta última, a ginástica do comprador para viabilizar a transação a um preço que lhe agrade impressiona.

Uma oferta peculiar
Especializada na exploração de imóveis comerciais, a BR Properties viu sua estratégia de negócio desmoronar diante do encolhimento do setor. Suas ações já não refletem o valor dos ativos, compostos de galpões e escritórios para aluguel nas principais regiões metropolitanas do País. De acordo com o balanço de 2014, os empreendimentos da imobiliária, contabilizados pelo preço de mercado, somavam R$ 10,5 bilhões, enquanto seu valor de mercado totalizava R$ 3,06 bilhões.

Por isso, no dia 26 de fevereiro, a empresa virou alvo de seu maior acionista. O banco BTG Pactual, dono de 32% do capital, juntou-se a dois parceiros para arrematar o controle. Estão na empreitada o BC Fund, maior fundo imobiliário listado na BM&FBovespa e sob gestão do próprio BTG; e a incorporadora Brookfield. Os ofertantes reuniram-se debaixo do chapéu do fundo de investimento em participações (FIP) Bridge para comprar, no mínimo, 85% do capital da BR Properties.

Os termos da oferta são incomuns. A começar pelo plano de, após a OPA, vender parte dos ativos da BR Properties para os próprios ofertantes. Dos 53 ativos que a companhia detém atualmente, 33 seguirão debaixo de seu chapéu e sob o comando do novo controlador, o BC Fund. Outros 20 empreendimentos, entre os quais torres do nobre Complexo JK, em São Paulo, serão vendidos ao BTG e à Brookfield. A falta de informações sobre o critério de escolha dos ativos-alvo da reorganização incomodou os minoritários. Eles enxergam o anúncio da cisão como uma forma de pressioná-los a aderir à oferta pública; os que restarem ficarão numa companhia mais enxuta e com bens menos atraentes (12 dos imóveis que permanecerão estão entre os que registram taxa de vacância superior a 40%, de acordo com a última divulgação de resultados).

Para os ofertantes, a reestruturação é um dos requisitos para viabilizar o negócio. Eles exigem a aprovação prévia da cisão dos ativos pelo atual conselho de administração como uma garantia para seguir com a oferta. Das sete cadeiras do board, três são de executivos do banco — entre elas a de chairman, que é do presidente da instituição, André Esteves. Ao comunicar a OPA, o BTG não disse se os administradores ligados à instituição vão votar.

A GP Investments, controladora da BHG, optou por uma estrutura de OPA um tanto diferente: não será ela própria a compradora das ações

Depois de saber da oferta, a BR Properties criou um comitê independente, composto pelos quatro conselheiros não ligados ao BTG. O grupo percebeu que a transação coloca o conselho diante de algumas encruzilhadas. A primeira refere-se à exigência de que a divisão do patrimônio seja previamente aprovada. Se concordar com ela, o conselho tomará uma decisão irreversível que praticamente impossibilitará aos acionistas recusar a proposta. Se negar o aval, os impedirá de decidir, dado que o BTG não aceita continuar sem essa garantia. Uma solução é submeter a cisão dos ativos a uma assembleia, mas ainda assim os problemas persistem. Como os ofertantes pedem exclusividade na aprovação da venda dos bens, uma eventual anuência impediria o surgimento de propostas concorrentes. O prazo até a oferta, em torno de 60 dias, tampouco permite que o conselho exerça seu dever de diligência: procurar uma oferta melhor para os ativos-alvo.

A reorganização provavelmente seria bem aceita pelos minoritários se o preço prometido para a OPA fosse satisfatório. Não é o caso. A oferta do fundo Bridge pagará R$ 12 por ação, valor que embute um prêmio de 35% em relação à média ponderada das cotações no fechamento dos 30 pregões anteriores à divulgação da operação e de 42% frente ao preço do IPO (ajustado por proventos), realizado em março de 2010. Entretanto, passa ao largo da máxima histórica, de R$ 18,78, e representa apenas metade do valor patrimonial da BR Properties.

Nesse ponto, a OPA tem mais uma característica singular: parte da recompra das ações será feita com a distribuição de dividendos. Dos R$ 12 ofertados, R$ 3,02 chegarão aos bolsos dos acionistas por meio de uma distribuição de lucros proposta pelos ofertantes. Feita a subtração, o fundo Bridge desembolsará apenas R$ 8,98 por ação. É verdade que descontar dividendos e juros sobre capital próprio eventualmente pagos no decorrer de uma OPA faz todo o sentido econômico; a retirada de lucros, afinal, diminui o valor da companhia. No caso da BR Properties, o estranho é a distribuição de dividendos ter sido apresentada previamente, como condição para a oferta. Na prática, é como se um dos acionistas da companhia estivesse propondo cotas de lucro extraordinárias, tarefa que cabe ao conselho de administração sugerir.

Ainda a respeito dos dividendos, um detalhe: os R$ 3,02 são muito mais que os R$ 0,22 já aprovados como proventos pelo conselho, na reunião de 11 de fevereiro. A BR Properties tampouco tem recursos em caixa para pagar esse valor por ação, que resulta num montante de aproximadamente R$ 900 milhões. Até o fim de 2014, possuía R$ 595 milhões disponíveis, ante uma dívida líquida de R$ 3,6 bilhões. Para o desembolso, terá de fazer caixa desfazendo-se de ativos — e aí reside a explicação para a proposta de pagar com dividendos. Como os imóveis valem mais do que as ações da companhia atualmente, faz mais sentido vendê-los e distribuir os lucros aos acionistas do que precificar a ação. Para o BTG, a ideia funciona perfeitamente bem: além de se capitalizar como acionista com os dividendos, ele pode economizar a diferença entre R$ 8,98 e R$ 12. Na visão dos minoritários descontentes, contudo, essa é só uma cenoura inteligente para seduzi-los a aceitar uma oferta que, no preço final, deprecia o valor de suas ações.

hora-do-adeus2Indignado, um dos acionistas estrangeiros da companhia resolveu bater de frente com o BTG Pactual. A gestora de recursos Eminence Capital, sediada em Nova York, com US$ 6,4 bilhões sob administração, anunciou em 26 de março o aumento de sua presença na BR Properties de 2,34% para 14,14% do capital, após sucessivas compras no mercado secundário. A Eminence informou ao mercado que passou a comprar ações após a OPA do Bridge ser noticiada, com o intuito de “proteger os interesses econômicos” de seus clientes. A alavancada da gestora complicou a vida dos ofertantes ao tornar praticamente improvável o alcance de 85% de participação. E pode ficar pior: ela afirmou que pode chegar a 19,5% do capital — faixa que não dispara a pílula de veneno —, aniquilando definitivamente o plano da oferta. Com a fatia de 14,14%, a Eminence já é a segunda maior acionista da companhia. Está logo à frente da Petros, fundo de pensão dos funcionários da Petrobras, que possui 10,48%.

A concentração das ações também aumenta as chances de veto à retirada da “poison pill” da BR Properties, outra condição imposta pela OPA. Para seguir adiante, os ofertantes exigem livrarem-se da cláusula que impõe ao acionista comprador de mais de 20% das ações a realização de uma oferta de compra por, no mínimo, 110% do valor econômico, apurado por meio de laudo de avaliação. Listada na BM&FBovespa desde 2010, a imobiliária tem apenas ações ordinárias em circulação e nenhum controlador. Além de impor a dissolução da pílula de veneno, o FIP Bridge requer que a exceção seja aberta apenas para ele.

O pedido da exclusividade tem uma justificativa: faz sentido que os acionistas votem a medida quando cientes de quem estarão beneficiando. No entanto, se a dispensa beneficiar apenas a OPA do Bridge, dificilmente surgirá uma oferta concorrente com preço mais atrativo — o mesmo problema da pré-aprovação do repartimento dos bens. Por isso, o comitê independente entendeu que a retirada do dispositivo deverá servir a qualquer oferta, sem exclusividade. E, assim, pediu que o ofertante manifestasse sua intenção de seguir adiante sem essa condição. Até o fechamento desta edição, o FIP não havia apresentado oficialmente sua resposta.

Terceiro elemento
Em agosto do ano passado, a BHG, operadora da terceira maior rede hoteleira do País, anunciou que deixará a bolsa de valores. A GP Investments, sua controladora, ofereceu R$ 19 por ação, o que representa uma perda de 12% em relação ao valor ajustado do IPO, de R$ 21,60. A companhia ingressou na BM&FBovespa em 2007 (na época, chamava-se Invest Tur Brasil) e especializou-se no turismo de negócios. Com o passar do tempo e a evolução do mercado, concluiu que o período de maturação dos empreendimentos, alguns deles adquiridos recentemente (como o Hotel Marina, no Rio de Janeiro), é incompatível com as altas e baixas da bolsa de valores. Somente sete meses depois de revelar a OPA, no último dia 27 de março, a companhia conseguiu registrá-la na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A demora se deveu a um desenho atípico para a oferta.
A GP, apesar de ser dona de pouco mais de 30% do capital, reconhece estar no comando da empresa (somou a maioria dos votos nas últimas assembleias e indicou a maior parte dos membros do conselho de administração). Apesar disso, optou por uma estrutura de OPA um tanto diferente: não será ela própria a compradora das ações. Uma das justificativas é o fato de a GP investir na BHG através de um fundo cujos recursos já estão investidos. Por isso, a gestora criou a Razuya Empreendimentos e Participações, sociedade de propósito específico que recomprará os papéis, e buscou um sócio que financiasse a empreitada.

O novo investidor é a GTIS, empresa global de empreendimentos imobiliários, com US$ 3 bilhões sob gestão. Após a OPA, a GP continuará com 30% e a GTIS, com os 70% restantes. Alguns investidores desconfiaram que a parceria pudesse esconder uma transferência do poder de comando; nesse caso, a OPA em questão deveria pagar o mesmo preço pelo qual o controle teria sido negociado. A GP negou ter havido qualquer transação com essa finalidade. Para assegurar que isso é verdade, a CVM exigiu da GP a comprovação de sua continuidade no comando da companhia. A determinação levou a gestora a celebrar um acordo com a GTIS: a firma internacional terá a maior fatia do capital da Razuya, mas o comando do negócio caberá à GP.

hora-do-adeus3Desconto à vista
A tática é habitual entre os consumidores: ao pagar à vista, o comprador merece um desconto. Numa OPA de fechamento de capital, o argumento parece não funcionar. Em janeiro do ano passado, 71,2% do capital da fabricante de não tecidos Providência foi vendido para a americana Polymer Group (PGI). Até então a companhia pertencia a um grupo de investidores vinculados por um acordo de acionistas, entre eles o FIP Volluto, da família Constantino. Em junho, a empresa anunciou que faria uma OPA com três finalidades: compartilhar o prêmio da alienação do controle, indenizar os investidores pela saída do Novo Mercado e fechar o capital.

A proposta foi de R$ 9,55 por ação. O correto, na visão dos acionistas, seria R$ 9,75, o mesmo valor pago pela PGI ao controlador. Acontece que o ofertante quis subtrair os R$ 0,20 correspondentes à remuneração do Lazard, assessor da transação. Para os minoritários, o desconto lhes repassaria uma despesa exclusiva dos controladores. A proposta de pagamento também causou celeuma: R$ 7,36 à vista e outros R$ 2,19 a prazo, mesmas condições da venda do controle. A fatia parcelada foi vinculada a uma contingência tributária que o balanço da companhia não havia provisionado. No final da OPA, a diferença poderia ser para mais ou para menos, dependendo do ajuste a ser realizado — o mercado chama essa condição de “escrow account”, ou conta caução.

Diante das reclamações dos acionistas, a companhia fez uma contraproposta: R$ 8,15 à vista, em parcela única, que também não agradou. Os investidores entenderam que, se aceitassem a conta caução, assumiriam um risco criado pelos estruturadores de um negócio no qual eles não tiveram nenhum poder de decisão. Em 22 de janeiro, um ano após o anúncio da compra do controle, a Providência informou a determinação da CVM de que a oferta fosse suspensa “até que estudos e análises adicionais” estivessem concluídos.

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Conforme a Economatica, no encerramento de março 128 companhias listadas na BM&FBovespa valiam, no pregão, menos que seus próprios ativos. Diversas delas têm programas de recompra de ações em andamento — a maioria com o objetivo de “maximizar a geração de valor para o acionista”. O anúncio mais recente foi feito pela Triunfo Participações, cujo preço em bolsa equivale a 40% do valor de seu patrimônio. A companhia, que atua no setor de infraestrutura, poderá retirar de circulação até 7 milhões de ações (de um total de 78,2 milhões). Com mais ou menos criatividade, a onda de ofertas de fechamento de capital pode estar apenas começando.

Ilustração: Marco Mancini/Grau180.com


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