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Covid-19 sugere novos caminhos para a governança corporativa
Conselheiros contam quais aprendizados as companhias devem levar da crise que paralisou os negócios
Covid-19 traça novos caminhos para a governança corporativa

Imagem: pch-vector/ Freepik

Gestão de risco, digitalização e cidadania corporativa. Esses são os maiores legados da quarentena para a governança corporativa, na opinião de dois dos colunistas da CAPITAL ABERTO, Henrique Luz, presidente do conselho de administração do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), e Ana Siqueira, sócia-fundadora da Artha Educação. Para discutir os novos rumos indicados pela pandemia de covid-19, eles participaram na semana passada do primeiro debate da Conexão Capital, seção de encontros online e ao vivo da CAPITAL ABERTO.

Quando a crise estourou, em março, havia preocupação em relação à possibilidade de esses preceitos de monitoramento e incentivo às companhias serem atropelados pela necessidade primordial de preservação de caixa. Felizmente, não foi o que aconteceu. “Fiquei impressionado com a maturidade demonstrada pelas empresas”, afirma Luz. O exemplo maior do fortalecimento da governança corporativa foi a aproximação de seu órgão máximo, o conselho de administração, da diretoria-executiva, responsável por ditar os rumos da empresa.

A percepção foi corroborada por pesquisa da consultoria KPMG, feita em três etapas entre março e maio deste ano. Na primeira coleta de dados sobre o tema, em 19 de março, apenas 22% dos boards haviam conversado com os administradores sobre o novo coronavírus. Na última fase do estudo, entre 19 e 26 de maio, a porcentagem saltou para 99,1%.

As reuniões entre conselho e diretoria se tornaram cada vez mais frequentes, como forma de dar vazão aos desafios impostos pela crise; encontros que antes eram mensais foram transformados em compromissos que se repetiam a cada semana. Já as discussões, concentradas na contenção de danos no início da pandemia, agora giram em torno de estratégias para o futuro da companhia. “O papel de guardião da visão de longo prazo da organização permanece nas mãos do board. A diferença é que os conselheiros agora atuam de maneira mais próxima da diretoria-executiva, sem interferir nas decisões, mas auxiliando na implementação da estratégia da empresa”, comenta o presidente do conselho do IBGC.

Desafio da digitalização

Como boa parte das atividades sociais e econômicas em meio à pandemia, a profusão de reuniões nas empresas migrou para o meio digital. As vantagens observadas foram muitas: disponibilidade de agenda, objetividade na condução das pautas, redução de custos com deslocamento, entre outras. “Perde-se, no entanto, parte da interação que é tão característica da nossa cultura. Isso é especialmente problemático para conselhos recém-formados, nos quais a unidade ainda não está posta”, avalia Siqueira. Na opinião dela, assim que possível os encontros presenciais serão retomados, mas não da mesma forma. “Não vamos voltar ao que éramos. O futuro terá um modelo híbrido das duas possibilidades.”

É possível que o mesmo se aplique ao home office, transformado em regra pela necessidade de isolamento social nos casos em que era possível. O levantamento conduzido pela KPMG mostrou que 84% das companhias abertas brasileiras pretendem rever suas políticas de trabalho remoto, seja para instaurar novas diretrizes (49%) ou para aprimorar as já existentes (34%). Muitas delas não estavam preparadas para a adoção de tecnologia com a rapidez exigida pela crise repentina e encararam a tarefa como um desafio de resiliência. “Várias empresas tiveram de inovar às pressas, e agora são convidadas a reorganizar a casa. Não basta permitir o home office: é necessário também garantir a segurança no acesso remoto”, destaca Siqueira.

A digitalização da rotina de trabalho tem um impacto direto não apenas nas companhias, mas em toda a cadeia econômica a elas interligada. Reuniões remotas afetam, por exemplo, a indústria do turismo de negócios, e o próprio home office, ainda que seja parcial, prejudica a demanda por transportes e o movimento nos estabelecimentos comerciais de regiões tradicionalmente ocupadas por escritórios, como a Avenida Faria Lima, em São Paulo. A fundadora da Artha Educação lembra ainda que a digitalização pressupõe demissões. “Muitas pessoas que naturalmente perderiam seus postos de trabalho para a automação no futuro podem ter que enfrentar esse problema muito mais cedo. É mais um efeito social poderoso acelerado pela pandemia”, acrescenta.

Cidadania corporativa

As empresas, a propósito, não podem mais fechar os olhos para suas responsabilidades sociais, cada vez mais reivindicadas por investidores e consumidores. Na fase pós-pandemia, vai ser cobrada uma visão mais ampla do papel das organizações, que devem implementar diversos aspectos da chamada cidadania corporativa. Entre eles, estão a valorização de todos os stakeholders — acionistas, funcionários, fornecedores, clientes — e a adoção de critérios e padrões ambientais, sociais e de governança (ESG, na siga em inglês).

O tema ainda é incipiente no Brasil, mas, na avaliação de Luz, os conselheiros estão preparados para lidar com o desafio. “É uma questão de foco. Quem não estava olhando para esses temas agora vai passar a enxergá-los com mais seriedade. O próximo desafio é estabelecer métricas para que as companhias possam validar o comprometimento”, afirma. Para Siqueira, o incentivo deve ser implementado pelo bolso. “Será difícil atingir metas de sustentabilidade enquanto a remuneração variável da cúpula da empresa não estiver alinhada a esses objetivos”, ressalta.

Isso vale também para metas internas, como o incentivo à diversidade de gênero dentro dos conselhos de administração. Enquanto na Europa a participação das mulheres nos boards está em torno de 30%, no Brasil a fatia acomoda-se em 9,5%, segundo o edição do Anuário de Governança Corporativa das Companhias Abertas 2018-2019, publicado pela CAPITAL ABERTO. Luz e Siqueira concordam que são necessárias ações efetivas para aumentar a porcentagem até um nível próximo dos 20%, mais condizente com a realidade fora do País. “A diversificação de vieses cognitivos — oriundos de diferenças de gênero, raça, idade, profissão — gera melhores resultados para a empresa. Mas a diversidade não acontece naturalmente, precisa ser incentivada”, pontua Siqueira.

Fato é que a crise do novo coronavírus obrigou os conselheiros a olhar para questões que já estavam na mesa havia algum tempo, mas sem o direcionamento necessário. Para o presidente do conselho de administração do IBGC, o momento é de separação entre as empresas que vão implementar as práticas exigidas de governança e as que vão escolher ficar no passado. “A pressão será feita por banqueiros e consumidores. As companhias com boa governança vão poder usufruir de juros mais baixos e da confiança do cliente. A conta será cobrada”, completa.


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