CVM abre audiência pública para regulamentar Lei 13.506/17
Autarquia apresenta parâmetros para cálculos de multas e acordos de leniência
, CVM abre audiência pública para regulamentar Lei 13.506/17, Capital Aberto

Ilustração: Rodrigo Auada

Já não era sem tempo: no último dia 18, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) iniciou uma audiência pública para avaliação do mercado sobre suas propostas de regulamentação para a Lei 13.506/17 no que se refere ao mercado de capitais. O diploma, em vigor há cerca de seis meses, aumentou significativamente as multas que a autarquia pode aplicar em processos administrativos e estabeleceu a possibilidade de firmar acordos de leniência com infratores (sem, no entanto, efeitos na esfera criminal). Os interessados podem enviar à CVM comentários e sugestões sobre a minuta da instrução até o próximo dia 17 de agosto.

O texto produzido pela CVM está alinhado às expectativas do mercado — provavelmente porque o regulador já há alguns meses se dispõe a ouvir informalmente as avaliações de diversos profissionais em relação à nova regulação. O Banco Central, outro órgão cuja munição ganhou reforço com a edição da lei, foi mais rápido, e ainda em 2017 publicou a Circular 3.857, com os parâmetros para punição das ilegalidades de instituições financeiras sob sua jurisdição.

Para evitar desproporção na aplicação das multas — já que a Lei 13.506/17 autoriza a CVM a fixar punições de até 50 milhões de reais, ante limite anterior de 500 mil reais —, a autarquia optou por criar cinco faixas com punições máximas para cada tipo de infração, considerando diferentes níveis de gravidade. Situações menos graves, como falta de divulgação de informações periódicas obrigatórias, terão multa máxima de 200 mil reais. No extremo oposto aparecem irregularidades como abuso do poder de controle e manipulação de mercado, que podem render aos infratores punição de até 20 milhões de reais. Esse valor pode aumentar para o teto de 50 milhões caso haja agravantes, como reincidência ou prática de fraude — 10% a 20% para cada um deles.  Cabe destacar que esse montante pode, em tese, até ser superado — afinal, o diploma prevê ainda outros três tipos de dosimetria para punições: o dobro do valor da emissão ou da operação irregular, três vezes o montante da vantagem econômica obtida ou da perda evitada em decorrência do ilícito ou o dobro do prejuízo causado aos investidores em decorrência do ilícito. “Esse limite de 50 milhões serve mais como um referencial para o mercado, já que as multas podem ser ainda maiores. Para o infrator, o dano não é só financeiro, mas também reputacional”, comenta o advogado Alexei Bonamin, sócio do Tozzini Freire Advogados.

Se a minuta fala em agravantes, ela menciona também atenuantes. Eles podem ser considerados, por exemplo, nos casos em que houver reparação de danos ao mercado e diante da existência prévia de políticas de compliance nas companhias. “Um dos principais objetivos da elevação da multa é justamente se evitar as más condutas. A ideia não é simplesmente punir”, afirma Augusto Coutinho Filho, coordenador de desenvolvimento de normas da CVM. Importante ainda observar que as mudanças determinadas pela Lei 13.506/17 não acabaram com as advertências, e a autarquia ainda pode somar multas com suspensão ou inabilitação caso julgue necessário.

 

Acordos de leniência

Mais uma parte importante da munição extra que a nova lei deu à CVM refere-se ao chamado acordo administrativo em processo de supervisão — vulgo acordo de leniência. De acordo com a minuta, esse instrumento prevê a extinção da punição se o infrator apresentar informação de que a CVM ainda não tinha conhecimento; se ela for parcialmente conhecida pelo regulador, pode haver redução de um a dois terços. Uma questão que se levantava à época da edição da Lei 13.506/17 era a caracterização desse conhecimento prévio. “A minuta endereça esse ponto, ao estabelecer critérios para que se configure e dimensione o ineditismo da informação. Uma das diretrizes é a existência de processo sancionador já aberto em relação à questão discutida na negociação de uma leniência”, destaca Larissa Arruy, sócia da área de bancos e serviços financeiros do Mattos Filho Advogados.

A minuta também propõe a criação do chamado comitê de acordo de supervisão (CAS), grupo responsável por analisar, negociar e celebrar os acordos de leniência — e sem a participação de profissionais que integram as áreas de supervisão e fiscalização da CVM. O intuito é evitar troca de informações, o que tende a garantir o sigilo do que negociam infrator e CAS. Atendendo a uma demanda do mercado, a minuta estabelece que nas situações em que a leniência não for fechada, a autarquia devolva ao infrator toda a documentação relacionada — ou a descarte.

Uma questão, entretanto, continua pendente e preocupando o mercado: como vai funcionar a cooperação entre a CVM e o Ministério Público (MP), órgão responsável pela esfera criminal. A minuta pontua que o acordo de supervisão celebrado pelo CVM não afeta a atuação do MP ou das demais instituições públicas, como Banco Central e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Quando detecta indícios de crime, a CVM oficia o MP, que pode dar prosseguimento às investigações e oferecer denúncia à Justiça. No caso dos acordos de leniência, a intenção da autarquia é que o MP já participe das negociações. “A ideia é que o MPF se sente junto à mesa para participar da discussão do acordo”, informa Antonio Berwanger, superintendente de desenvolvimento de mercado da CVM, admitindo que ainda falta clareza sobre o funcionamento dessa parceria. “Há o temor de que o proponente de um acordo obtenha redução ou mesmo nulidade de sua punição na CVM, mas venha a ser punido no âmbito penal, já que não há previsão de imunidade legal após os acordos. Isso poderia coibir a proposição de acordos”, diz Rogério Taffarello, sócio de direito penal empresarial do Mattos Filho Advogados. (Leia mais sobre a questão na reportagem Oportunidade perdida)

Até agosto o mercado também poderá opinar sobre outros detalhes da minuta, como a previsão de adoção do meio eletrônico como prioritário para comunicação dos atos processuais aos acusados e a publicação de documentos relacionados a atos processuais no site da CVM, em vez de saírem no Diário Oficial da União. “Esperamos ter mais celeridade e diminuir os custos com esses processos”, afirma Berwanger. Há, no entanto, quem esteja cauteloso. “Precisamos observar como a intimação eletrônica funcionará na prática, se os participantes do mercado ficarão rapidamente cientes de questões que os envolvem. Se isso não acontecer, pode haver cerceamento do direito de defesa”, ressalva Daniella Fragoso, sócia do BMA.

 


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