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“O governo tem que voltar a poupar”

o-governo-temDesde que começou a trabalhar no mercado financeiro, em 1967, Luiz Carlos Mendonça de Barros viu dez homens e uma mulher tomarem posse como presidentes do País. Fundou uma corretora, uma empresa de fomento cultural e dois bancos. Também foi presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) por três anos, ministro das Comunicações e gestor de recursos. Não teve uma trajetória livre de polêmicas: a acusação de favorecer empresas na época das privatizações lhe custou, em novembro de 1998, o ministério que havia assumido sete meses antes, logo após deixar o BNDES, onde estava desde 1995. Não foi provado o favorecimento, e a absolvição completa veio em 2011. Desde 2001, Mendonça de Barros é o principal nome da gestora Quest — hoje com oito fundos e R$ 2 bilhões em recursos sob gestão. Em quase 50 anos de atuação, ele aprendeu que não se muda um povo: os brasileiros vão continuar sendo consumidores, não poupadores.

Em termos macroeconômicos, qual é a principal medida que o governo deveria tomar para dinamizar o mercado de capitais?
O governo teria que gastar menos. Ao voltar a ter uma meta de poupança — o superávit primário — e cumpri-la, conseguiria tirar a pressão sobre os juros de títulos públicos. Atualmente, os títulos nacionais chegam a render 6% acima da inflação. O resultado disso é que fundos de pensão, investidores institucionais e os poucos brasileiros poupadores preferem esse investimento, sem risco. Com menos gasto governamental, o pequeno bolo de poupança privada do Brasil seria mais bem distribuído, assim como a poupança externa que entra no País e investe em títulos públicos.

E na arrecadação? Precisamos de uma reforma tributária?
No momento, a reforma tributária é um sonho de uma noite de verão. O governo arrecada o suficiente para cobrir as despesas dele. Não tem como diminuir os impostos se o Estado não passar a gastar menos antes.

O senhor acha que o governo deveria tomar atitudes para reduzir o consumo das famílias e aumentar, assim, a quantidade de dinheiro disponível para investimentos?
Não. O povo brasileiro é um povo consumidor. O mercado de capitais brasileiro acaba sofrendo as consequências dessa característica da sociedade — mas não dá para mudar um povo. Já estou velho o bastante para reconhecer isso. O consumo das famílias corresponde a dois terços do PIB. Na China e na Coréia do Sul, é menos de 40%. Contudo, o brasileiro não vai começar a poupar como eles. É cultural. Para economizar tanto quanto um coreano, o brasileiro teria que morar, por exemplo, num apartamento de 30 metros quadrados. Ninguém quer isso — queremos 70 metros quadrados. Somos uma sociedade de cigarras, não de formigas. Não é à toa que foram criados mecanismos de poupança compulsória, como o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). O governo deveria, no máximo, tornar mais difícil o saque desses recursos, para evitar que fossem usados para financiar o consumo.

Precisamos reformar a estrutura de nosso mercado de capitais para tornar os investimentos mais fáceis?
Não, o sapato não aperta aí. É evidente que as regras precisam estar em constante transformação, porque alguém sempre descobre uma maneira de burlá-las, mas a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Banco Central têm sido muito eficientes em se modernizar. Existem alguns setores na economia brasileira que possuem estrutura de primeiro mundo, e o mercado de capitais é um deles. Aqui, um caso como o de Bernard Madoff [gestor de recursos preso em dezembro de 2008 por fraude nos Estados Unidos] não aconteceria, porque tudo se registra eletronicamente. É extremamente fácil recompor o caminho de um ativo.

Em termos regulatórios, não temos com que nos preocupar?
Devemos observar, e talvez até antecipar, o que os Estados Unidos fazem com relação a certas novidades, como o high frequency trading (HFT), por exemplo. E, então, criar sistemas e estratégias para proteger os pequenos investidores de acidentes. As operações de alta frequência ainda são poucas [cerca de 13% do volume negociado no Brasil, contra mais de 50% nos Estados Unidos]. Se o volume aumentar muito, no entanto, podemos ter problemas. É um assunto em que a CVM deve prestar atenção.

Como as empresas brasileiras podem buscar financiamento, considerando que têm de competir com o governo, que toma emprestado a taxas altas?
As grandes empresas têm boas alternativas internas e externas, como financiamento bancário, investimento direto e bolsa de valores. Para as médias é mais difícil. Temos um sistema bancário oligopolizado, em que as taxas cobradas e as margens de lucro obtidas são muito altas. Essa concentração, entretanto, aconteceu no mundo todo após a crise de 2008.

O governo recentemente publicou a MP 651 para incentivar a listagem de PMEs. É uma boa solução?
Isso é uma bobagem. O melhor incentivo fiscal que o governo pode dar é gastar menos e aumentar a poupança dele, para assim conseguir diminuir a taxa de juros.

O BNDES é muito criticado por emprestar a juros subsidiados e travar o desenvolvimento do mercado de capitais. Qual deveria ser o papel dele?
Servir como âncora, referência e suplemento, comprando debêntures ou ações emitidas por empresas. Não é papel do BNDES distribuir empréstimos como vem fazendo.


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