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Ex-Banco Mundial, Otaviano Canuto está otimista com o futuro
Para que a empolgação dos investidores continue, ele vê como fundamental a reforma do sistema tributário

 

, Ex-Banco Mundial, Otaviano Canuto está otimista com o futuro, Capital Aberto

Ilustração: Julia Padula

“Por que vocês estão falando mal do Brasil? Nunca vendi tanto batom na vida!” O bom humor do CEO de uma multinacional de cosméticos contrastava com o azedume dos gestores de fundos que conversavam com Otaviano Canuto, então vice-presidente do Banco Mundial para combate à pobreza, num jantar de investidores, em Nova York. “Mas isso foi em 2012, antes de o Brasil entrar no buraco”, pondera o economista, que nos últimos 15 anos ocupou diversos postos no Banco Mundial, no BID e no FMI. “Para aquele executivo, o mercado brasileiro estava fantástico, mas gestores de fundos xingavam o governo [Dilma Rousseff] pelas perdas na área de energia e tudo o mais em que tinha metido o dedo.”

Essa memória ruim das intervenções é ainda viva, principalmente entre fundos de private equity, relata Canuto, que acaba de se retirar do FMI e abrir sua consultoria em Washington, quando indagado sobre as expectativas geradas pelo resultado das eleições no Brasil. Apesar disso, ele observa que há certo otimismo dos investidores com as declarações isoladas de membros da nova equipe econômica, em especial da parte de Paulo Guedes, no sentido de comprometimento com ajuste fiscal, lei do teto dos gastos, reforma da Previdência e flexibilização na indexação de despesas e receitas.

A reforma tributária é fundamental, na visão de Canuto, para que o otimismo continue. Afinal, é notório que um dos componentes “horrorosos” do ambiente de negócios brasileiro é o custo em recursos humanos e materiais desperdiçados com a tarefa de se cumprir a obrigação de pagar impostos. Também é inquestionável, afirma, que esse mesmo sistema tributário induz a formação de preços muito díspares em relação aos fundamentos da produção. E, ainda por cima, é maligno do ponto de vista da distribuição de renda.

Portanto, assevera Canuto, uma reforma tributária apropriada, com simplificação, harmonização de regras e fechamento das diversas janelas pelas quais o pessoal do andar de cima escapa de pagar imposto de renda, por exemplo, seria benéfica do ponto de vista de produtividade, distribuição de renda e apoio ao corte de gastos. Por outro lado, ninguém sabe ainda os detalhes da reforma tributária que será perseguida pelo novo governo, nem sua proposta de reforma previdenciária.

Canuto elogia a “excelente” equipe econômica e a “muito profícua unificação de ministérios da estrutura econômica”. Ele recorda sua própria experiência em Brasília. Foi secretário de assuntos internacionais da Fazenda no início do primeiro governo Lula, em 2003, e, ao lado de Marcos Lisboa, Joaquim Levy, Bernard Appy e Jorge Rachid, integrava também o time apartidário da Fazenda chamado para cumprir uma missão — “que acho que cumprimos bem” — de obter o grau de investimento para o Brasil.

Ele fazia a ligação da Fazenda com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), até porque o então ministro, Antonio Palocci, fugia das discussões sobre comércio internacional, mantendo distância da agenda potencialmente conflituosa com o Itamaraty do chanceler Celso Amorim. Assim, Canuto participou das reuniões da Câmara de Comércio Exterior (Camex), acompanhou as missões do Brasil na negociação da Organização Mundial do Comércio (OMC) em Cancún e foi a Miami na tentativa de salvar a Alca. Era ele quem representava a Fazenda nas tratativas sobre dumping, salvaguardas, negociações comerciais, além das relações com instituições multilaterais.

Com essas atribuições, mapeou, no MDIC, os interlocutores dos diversos interesses setoriais, e se tornou um advogado ferrenho da agenda Doing Business, do Banco Mundial. Foi por insistência de Canuto que o ex-ministro Henrique Meirelles deu prioridade a ela enquanto titular da Fazenda. Assim, retomou a agenda de reformas microeconômicas iniciada décadas antes.


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Canuto torce para que essa agenda tenha continuidade, dada a “dificuldade enorme” de implementá-la — afinal, não tem charme, não dá manchete de jornal, tem itens complexos, miúdos, dispersos e variados. E a cada um deles está associada a resistência de grupos de interesses. Isso não tira, na avaliação dele, o mérito da equipe de Meirelles: o Brasil deu um salto na classificação do Doing Business entre 2017 e 2018. Saiu da 123ª posição para a 109ª. Ainda assim, está longe de avanços consistentes em segmentos como o tributário, em que é o terceiro pior país do mundo.

“Há muito a se fazer, e essa agenda sofre uma resistência silenciosa”, sublinha Canuto, que lembra um caso emblemático do início do primeiro governo Lula. Ninguém havia contestado a proposta para uma nova Lei de Falências, mas só até o projeto chegar à Câmara: da noite para o dia, pipocaram pelo menos 100 emendas. Outro exemplo? O cadastro positivo, que não sai do lugar desde aquele tempo — e que logo será superado por tecnologias como as de inteligência artificial.

Rótulos à parte, que segundo Canuto mais confundem do que explicam qualquer coisa, a nova equipe tem uma visão “liberal” em tudo parecida à de sua turma de Brasília. A diferença mais saliente é o pretendido programa de privatizações. Até porque muitas das vendas esperadas por Paulo Guedes visam corrigir distorções criadas no investimento público durante os governos petistas, que Canuto ilustra com outra história, de quando era vice-presidente do BID. Lula lhe pediu para redigir uma nota sobre a evolução da Petrobras, que detinha excelência mundial em exploração marítima de petróleo. Canuto traçou um paralelo com a Embraer e sua liberdade para comprar equipamentos e contratar serviços de terceiros para poder se concentrar no negócio principal: projetar e montar aviões. Ocorre que logo a Petrobras foi submetida à política de conteúdo nacional, usada para recriar a indústria naval brasileira, estender suas atividades para o refino de petróleo, para o biodiesel — enfim, perder o foco.

“E o interessante, não por causa dessa nota, mas por outros fatores, é que a Colômbia mudou o regime da sua indústria de petróleo para um modelo muito parecido com o que o Brasil tinha na época”, comenta. Não muito tempo depois, a Ecopetrol tinha um valor de mercado maior que o da Petrobras. “Os colombianos adaptaram nosso modelo e aprenderam com o sucesso do Brasil”, ironiza.

Essa história puxa outra: a de um jantar com um investidor que em 30 anos jamais aplicara nada em nenhum país da América Latina, mas passara a se interessar pelo Brasil por causa da crise — não a da recessão, a das empreiteiras envolvidas na Operação Lava Jato. “A leitura dele é que ocorria uma ruptura de um quadro muito estável e controlado por algumas poucas grandes empresas”, afirma. Ele vislumbrava como resultado dessa crise de governança uma possibilidade de mudança e de emergência de outros atores”, recorda Canuto. Atores estrangeiros ou locais que, conhecedores da situação pós-acordos de leniência, poderiam encontrar maneiras de projetar o futuro dessas empresas e — quem sabe? — nelas investir quando a demanda do poder público voltar ao normal.

Não é por acaso que os organizadores de eventos mundo afora já tratam de convidar Canuto para conversar sobre o novo governo. Agora, em carreira solo, ele pode falar mais livremente com investidores interessados no Brasil e na América Latina.


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