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Como funciona a fiscalização de fundos de investimento
Entenda o Regulamento dos fundos de investimento e como eles são supervisionados pela CVM
Fiscalização de fundos de investimento
Ilustração: Rodrigo Auada
Texto atualizado em 18 de março de 2022

A indústria de fundos de investimento tem crescido em tamanho e importância e hoje representa um dos principais meios de captação de recursos junto ao público investidor. Segundo dados da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o setor de fundos possuía, em junho de 2018, um patrimônio de quase R$ 4,5 trilhões, distribuídos em mais de 16 mil fundos, que tinham aproximadamente 13 milhões de cotistas. Como consequência da evolução da indústria, foram realizadas reformas regulatórias visando ao aprimoramento da fiscalização de fundos de investimento.

Exemplos relevantes dessas reformas são a edição da Instrução CVM 555, que substituiu a regra geral de fundos para fundos de investimento, e da Instrução CVM 558,que dispõe sobre o exercício da atividade de administração fiduciária e gestão de carteira de fundos de investimento.

O que são e como funcionam os fundos de investimento

Os fundos de investimentos são comunhões de recursos organizados sob a forma jurídica de um condomínio. Embora criados originalmente para captação de poupança popular e aplicação coletiva dos recursos de seus participantes — os cotistas —, os fundos de investimento são veículos usados também na estruturação de operações e para a organização patrimonial de pessoas e entidades.

Os fundos de investimento podem ser classificados em dois grandes conjuntos. De um lado, há os fundos não-estruturados, chamados fundos 555, regulados somente pela Instrução 555. De outro, há os fundos estruturados, regulados não apenas pela Instrução 555, mas também por Instruções específicas.

A grande distinção entre esses dois tipos de fundos é que os fundos 555 aplicam seus recursos exclusivamente em ativos financeiros e, por isso, as estruturas e estratégias de investimento costumam ser menos complexas. Tais fundos dividem-se em quatro classes distintas de acordo com o principal fator de risco dos ativos que compõem suas carteiras: fundos de renda fixa; fundos de ações; fundos multimercados; ou fundos cambiais.

Já os fundos estruturados têm por finalidade investir em ativos com características mais peculiares, o que, em geral, torna a estratégia de investimento mais complexa e o risco maior. Os principais fundos estruturados são: Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC), regulados pela Instrução 356; Fundos de Investimento Imobiliários (FII), regulados pela Instrução 472; Fundos de Investimento em Participações (FIP), regulados pela Instrução 578; e Fundos de Índice (ETF), regulados pela Instrução 359.

O atual sucesso da indústria de fundos se deve, entre outros fatores, ao fato de que os fundos são veículos que permitem aos investidores, inclusive os pequenos, a oportunidade de diversificação de investimentos e exposição a ativos e estratégias desenhadas por gestores profissionais. O surgimento de casas não ligadas a conglomerados financeiros, a criação de plataformas eletrônicas, e a distribuição de cotas de fundos por instituições não ligadas à sua gestão ou administração são outros fatores que impulsionaram a evolução da indústria no Brasil.


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Como os fundos de investimento são regulados

A história da regulação dos fundos de investimento no Brasil pode ser dividida em antes e depois da edição da Lei 10.303/01, que trouxe para a CVM a competência de regular todos os fundos de investimento.

Antes, a competência para regulamentar os fundos de investimentos era compartilhada entre a CVM e o Banco Central do Brasil (Bacen). O que determinava se um fundo estava sob o amparo das regras de uma ou outra instituição eram os seus objetivos de investimento: se o fundo investisse em valores mobiliários, ele estaria sob a jurisdição da CVM; mas, se o fundo se dispusesse a investir em outros ativos financeiros, ele estaria sob a competência do Bacen.

A Lei 10.303/01 transformou as cotas de fundos de investimento em valores mobiliários, independentemente dos ativos que esses fundos se destinem a investir, migrando toda a indústria para a jurisdição da CVM.

Tendo em vista essa nova competência, a CVM editou, em 2004, a Instrução 409 que consolidou a regulação dos fundos de investimento em geral, notadamente aqueles que originalmente eram regulados pelo Bacen, e os fundos de investimento em valores mobiliários que tradicionalmente foram regulados pela CVM. A Instrução 409 foi substituída pela Instrução 555, que entrou em vigor em 2015.

Além da regulação expedida pela CVM, a indústria de fundos conta ainda com a autorregulação realizada pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).

Além de emitir códigos de autorregulação, a Anbima formula orientações sobre princípios e regras de adoção voluntária relacionadas às atividades de administração e gestão de recursos de terceiros, sendo o principal exemplo o Código Anbima de Regulação e Melhores Práticas para Administração de Recursos de Terceiros.

Como é feita a fiscalização dos fundos de investimento

Além de fiscalizar os fundos de investimento e seus prestadores de serviço, a CVM possui uma área específica para cuidar desse mercado, a Superintendência de Relações com Investidores Institucionais (SIN).

Desde 2009, o órgão adota um modelo de Supervisão Baseada em Risco (SBR) para fiscalizar os seus regulados, inclusive os fundos de investimento e os prestadores de serviços dessa indústria, conforme estabelecido na Resolução 3427. Por meio desse modelo de supervisão, cada área técnica da CVM identifica, mensura e classifica, em termos de probabilidade de ocorrência e potencial de dano, os riscos relacionados ao segmento em questão.

Os eventos de riscos identificados por cada área técnica são, então, detalhados em um plano bienal que descreve cada risco e as ações específicas de supervisão que serão adotadas pela CVM no decorrer de dois anos. O objetivo é que a atuação da CVM junto a seus regulados antecipe a correção do mercado e minimize a probabilidade de concretização do risco identificado.

Os participantes do mercado regulados pela CVM são também classificados em função do potencial de risco que oferecem para o cumprimento dos mandatos legais da CVM. Desse modo, a intensidade e profundidade das ações de supervisão variam para cada grupo de regulados. Essa matriz, no entanto, é de uso interno da CVM.

O SBR oferece a dose de transparência sempre esperada dos agentes estatais, tendo em vista não apenas a publicidade dos planos bienais, mas também de um relatório semestral por meio do qual a CVM divide com os participantes do mercado os principais resultados alcançados.

Mas não é somente a CVM que supervisiona os fundos de investimento. A Anbima, na qualidade de entidade autorreguladora do setor de fundos, também atua na fiscalização desses veículos de investimento. A Anbima supervisiona as entidades que aderem voluntariamente aos seus códigos por meio de cinco formas distintas:

  • indireta, que consiste no monitoramento contínuo realizado pela análise de documentos, filtros estatísticos e banco de dados;
  • periódica, que consiste na atuação preventiva feita por meio de questionários e visitas in loco com o objetivo de entender os processos e ambiente de controle das instituições;
  • episódica, que é realizada por meio do acompanhamento de notícias divulgadas na mídia envolvendo os participantes de mercado conveniados à Anbima;
  • temática que são aquelas feitas de acordo com os temas relevantes para o mercado de fundos definidos por comissões de acompanhamento ou por estudos técnicos da entidade autorreguladora;
  • originada por denúncia, que decorrem de investigações motivadas por denúncias e reclamações.

A CVM e a Anbima firmaram dois convênios. Esses convênios, embora preservem as competências do regulador e da entidade autorreguladora, servem, principalmente, para racionalizar as atividades das instituições e mitigar a sobreposição de atividades, com a finalidade de robustecer a fiscalização da indústria de fundos de investimento.

O primeiro desses convênios, celebrado em agosto de 2008, prevê a possibilidade de aproveitamento, seja pela CVM, seja pela Anbima, das penalidades aplicadas ou termos de compromisso celebrados pela outra instituição. Assim, no caso, por exemplo, de a Anbima aplicar uma penalidade a determinado prestador de serviço da indústria de fundos, a CVM, ao avaliar o mesmo caso, pode levar em conta a pena já aplicada no momento da fixação da dosimetria de sua própria sanção – e vice-versa.

Já o segundo convênio, firmado em junho de 2018, estabelece uma linha de atuação conjunta entre o regulador e a entidade autorreguladora na supervisão da indústria de fundos. Esse convênio está assentado nos seguintes pilares:

  • Regulação: alinhamento estratégico entre a CVM e a Anbima para o aprimoramento das regras aplicáveis ao mercado de fundos de investimento;
  • Supervisão e enforcement: busca pela otimização da supervisão sobre a indústria de fundos realizada pela CVM e pela Anbima, com o objetivo de reduzir sobreposições;
  • Intercâmbio de informações: troca de informações sobre a indústria de fundos entre regulador e autorreguladora, incluindo dados sobre supervisão e enforcement, informações periódicas, cadastrais e de performance dos fundos de investimento.

No âmbito desse segundo convênio, os temas específicos que serão objeto de cooperação entre a CVM e a Anbima são detalhados em anexos, que, neste momento, preveem a colaboração entre regulador e entidade autorreguladora nas seguintes frentes: fornecimento de dados à análise da CVM sobre pedidos de registro para o exercício da atividade de administração de carteiras; supervisão da precificação de ativos financeiros pelos administradores de fundos 555; e supervisão da atividade de distribuição de cotas de fundos pelos intermediários de valores mobiliários.


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A supervisão dos fundos de investimento no próximo biênio

O Plano Bienal de Supervisão Baseado em Risco (SBR) da CVM para os anos de 2019 e 2020 identifica onze riscos relacionados aos fundos de investimento e estabelece em relação a esses riscos 34 ações específicas de supervisão. A execução dessas ações é de responsabilidade da Superintendência de Relações com Investidores Institucionais (SIN).

Embora a maior parte das ações de fiscalização indicadas no novo plano bianual englobe temas que vêm sendo recorrentemente objeto de supervisão pela CVM, elas aumentaram significativamente desde o último plano bianual que previa cerca de 20 ações específicas, contra as atuais 34.

Além de temas como desenquadramento das carteiras em relação aos limites estabelecidos no regulamento e na regulamentação; falhas na precificação dos ativos; e desconformidades das demonstrações financeiras de fundos estruturados às normas contábeis aplicáveis que continuarão a ser observadas pelo regulador no próximo biênio; há algumas novidades, a maioria delas ligadas a assuntos que vem sendo objeto de debates no âmbito internacional.

Novidades do SBR

Primeiro, a SIN passará a supervisionar como os administradores de carteira e consultores monitoram e mitigam os riscos relacionados à segurança cibernética, principalmente aqueles cujos modelos de negócio sejam intensivos em tecnologia.  Como destacado em outra oportunidade, a cibersegurança tem sido objeto de debates intensos em entidades multilaterais, como o Financial Stability Board (FSB) e a International Organization of Securities Commissions (Iosco), que enxergam nos ciberataques um dos maiores riscos atualmente existentes para a estabilidade financeira, eficiência do mercado de capitais e proteção do investidor.

Outro assunto tratado no Plano Bienal 2019-2020 que vem sendo amplamente discutido no âmbito internacional é a alavancagem dos fundos de investimento – a SIN passará a avaliar a existência de estratégias de alavancagem irregulares ou pouco diligentes bem como falhas no processo de divulgação dessas operações em fundos 555. A alavancagem dos fundos, segundo relatório do FSB, constitui hoje uma das grandes vulnerabilidades estruturais da indústria de administração de recursos de terceiros,  tanto porque, em geral, não são impostos limites ao seu uso, como porque não existem dados consistentes e acessíveis sobre o grau de alavancagem da indústria.

A adequação da estrutura operacional dos administradores fiduciários e gestores de recursos ao disposto na Instrução 558 e a avaliação de eventuais acumulações indevidas de atividades por diretores-responsáveis dessas instituições estarão igualmente na mira do regulador no próximo biênio. Embora essas questões tenham sido tratadas no Plano Bienal referente aos anos de 2017-2018, uma novidade importante é a edição de ofício-circular, em novembro do ano passado, no qual a SIN expõe sua visão sobre a segregação de atividades exercidas por um mesmo prestador de serviço. A fiscalização da área técnica da CVM deverá, portanto, passar a ser guiada por essas novas orientações.

As ações de supervisão da CVM nos anos de 2019 e 2020 também analisarão a robustez e suficiência das políticas, controles e rotinas voltados à identificação de operações suspeitas de lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo no âmbito da atividade de administração de carteira.

A área técnica da CVM, pela primeira vez, verificará a robustez e suficiência dos controles, rotinas e sistemas dedicados à identificação dos beneficiários finais no âmbito da atividade de administração de carteiras, principalmente em relação àqueles casos de supervisão em curso que demonstraram que referida identificação seria útil para apuração de fatos e responsabilidades.  É provável que essa ação de supervisão tenha origem em casos de recentes de manipulação de mercado e ocultação de patrimônio, com consequente sonegação fiscal, amplamente divulgados pela imprensa.


Luciana Dias sócia do L. Dias Advogados

*Luciana Dias ([email protected]) é sócia do L. Dias Advogados, professora na FGV Direito-SP e ex-diretora da CVM


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