O último dia 26 de junho marcou os 75 anos da assinatura da Carta das Nações Unidas, o tratado internacional que estabeleceu a Organização das Nações Unidas (ONU). O preâmbulo da certidão de nascimento prevê os objetivos de “preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra (…) e reafirmar a fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor do ser humano, na igualdade de direito dos homens e das mulheres, assim como das nações grandes e pequenas, e a estabelecer condições sob as quais a justiça e respeito às obrigações decorrentes de tratados e de outras fontes de direito internacional possam ser mantidos, e a promover o progresso social e melhores condições de vida dentro de uma liberdade ampla”.
Inegável a importância do trabalho da ONU e de suas agências nessas mais de sete décadas — aí incluídas as frentes de proteção de refugiados de guerra, o trabalho da Corte Internacional de Justiça, as intervenções para manutenção de paz, a promoção da proteção e da sustentabilidade ambiental, as atuações de observadores para assegurar eleições livres e justas, os programas de redução da fome e das desigualdades sociais, o controle da produção de armas nucleares e, mais recentemente, o lançamento dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, agenda a ser implementada até 2030 visando a sustentabilidade social e econômica para todos.
Mas, como diria Brás Cubas: é bela, porém coxa. O Conselho de Segurança, seu principal e mais poderoso órgão (por poder adotar resoluções obrigatórias para todos os 193 países membros da ONU) é formado por 15 nações, das quais cinco são membros permanentes com poder de veto: Estados Unidos, França, Reino Unido, Rússia e China. Ocorre que essa estrutura de integrantes permanentes criada em 1945, além de não refletir a geopolítica do mundo atual, muitas vezes na história gerou braços de ferro e chuvas de vetos que resultaram em engessamento da atuação do Conselho de Segurança e da própria ONU.
Como parte das comemorações de seu aniversário, a ONU acaba de lançar uma pesquisa mundial perguntado quais são as prioridades das pessoas para o futuro. De fato, neste momento em que movimentos nacionalistas estão crescendo em contraposição à integração promovida pela globalização, é fundamental que se reveja o papel da ONU daqui para a frente. Porém, para assegurar a relevância e a efetividade do organismo, é também fundamental que essa revisão seja concentrada nas estruturas de poder e de financiamento.
Pior do que não ter o poder para agir, é poder agir e não ter os recursos necessários para isso. Bom exemplo é a recente decisão dos Estados Unidos de cortar laços com a Organização Mundial da Saúde (OMS), agência da ONU que sobrevive com contribuições voluntárias de seus membros, sob a acusação de que o órgão tem atuado com muita benevolência para com a China durante a pandemia. Caso esse movimento seja seguido por outros membros da OMS e/ou de outras agências, a capacidade de atuação desses órgãos restará amplamente limitada.
A nova ordem mundial pós-covid-19 revela-se o cenário ideal para se repensar a ONU e suas agências, assegurar suas existências e trazê-las à modernidade. Precisamos, mais do que nunca, de fóruns com representatividade mundial e munidos dos instrumentos necessários para promover a estabilidade política, o crescimento econômico sustentável e o desenvolvimento social para todos. Resta saber se nesse aniversário de 75 anos querem que a ONU apague as velinhas ou se querem apagar a velhinha.
*Walter Pellecchia, advogado especialista em mercado financeiro, integrante do escritório Reed Smith LLP em Londres ([email protected]). O texto reflete opiniões do autor e não deve ser considerado como consultoria de qualquer natureza.
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