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Juros sobre capital próprio e tributação de dividendos
Por que ser a favor de um e contra o outro? Ou vice-versa?
Eliseu Martins em ilustração

Eliseu Martins*/ Ilustração: Julia Padula

O lucro corresponde à contraposição entre o dinheiro que entra e o que saiu para se obter essa entrada. Só que, como ocorrem a entrada e a saída em datas diferentes, aparece um bicho terrível a perturbar esse cálculo: havendo inflação entre a data da entrada e a da saída, deve ela ser computada ou não?

Se você, como pessoa física, adquiriu um bem por R$ 1 milhão há exatamente dez anos e o vende agora por R$ 1.780.000, vai reconhecer um lucro e pagará tributo sobre esse excedente. Se for a uma alíquota de 20%, vai pagar R$ 156 mil e sobrarão R$ 1.624.000. Investimento razoável para dez anos? Depende. Caso lembre-se de verificar de quanto foi a inflação durante esse período, encontrará como resposta 78%! Ou seja: deveria ter agora R$ 1.780.000 para ter a mesma riqueza que dez anos atrás. Logo, no caso concreto, não terá tido lucro algum. Mas vai ter que pagar o tributo. Fica visível que nesse caso você pagará tributo sobre o capital, como já discutimos aqui em texto anterior, e não genuinamente sobre o lucro.

Se você tivesse feito a venda por R$ 2 milhões, pagaria imposto de R$ 200.000, que corresponderia a R$ 44 mil sobre o lucro verdadeiro (R$ 220.000) e mais R$ 156 mil sobre seu patrimônio. Agora, se você pudesse aplicar a correção monetária de 78% sobre seu capital inicial, obviamente não teria lucro algum com a venda por R$ 1.780.000, ou pagaria 20% sobre R$ 220.000 se vendesse por R$ 2 milhões. Não seria muito mais justo? E não funcionaria como forte instrumento para se coibir as forçadas de barra em que as pessoas querem passar escrituras por valor abaixo do valor efetivo da venda?

Indo à pessoa jurídica: por causa dessa tributação sobre lucro fictício, foi criada a figura do “juro sobre o capital próprio” — para abater do lucro nominal um “juro”, como se fosse uma atualização monetária do capital próprio investido. Mas como o índice de “juro” (TJLP) tende a ser superior à inflação, criou-se um tributo fixo de 15% sobre esse valor. De qualquer forma, esse “juro” não é uma  “benesse”, mas sim um antídoto à tributação injusta sobre o capital próprio da empresa (ao qual a pessoa física não tem direito). É bom lembrar disso nestes momentos em que se discute o tributo sobre os dividendos e muitas vezes incautamente se inclui na discussão a extinção dessa figura do “juro do capital próprio”. Ao invés de eliminá-lo para a pessoa jurídica, deveria é ser criado o modelo de atualização monetária para a pessoa física, como existe em países diversos.

Quanto ao dividendo em si, é algo interessante notar como variam no mundo os modelos. Em alguns lugares (partnerships americanas, por exemplo) não se tributa a pessoa jurídica; tributa-se apenas a pessoa física quando recebe os dividendos ou vende o investimento. E, no outro extremo, no Brasil tributa-se só a pessoa jurídica e nada na pessoa física que recebe a distribuição do dividendo (mas paga sobre o ganho de capital quando vender as ações ou cotas e com base num lucro fictício).

Mas esse modelo brasileiro realmente tem inconvenientes: por exemplo, se na pessoa jurídica se conseguir uma redução significativa do tributo, isso se estende total e automaticamente aos sócios (como na Lei do Bem).

E outro ponto importante: quando distribuído o dividendo, sem tributo, a alíquota somada de pessoa jurídica e pessoa física será a mesma tanto para o sócio rico quanto para o sócio não rico. É justo isso?

Daí um dos modelos alternativos ser tributar-se a pessoa jurídica, não pelos 34% de hoje, mas por uma alíquota bem inferior (inclusive para ficar mais perto da média mundial), mas tributando-se na pessoa física o dividendo — e conforme a faixa de renda do investidor. Não parece mais justo?

Pelo menos para mim ficou claro que se deve trabalhar a favor do “juro sobre o capital próprio”, bem como para a mudança na tributação sobre distribuição de lucros. A não ser que me convençam diferentemente.

O único risco é o de País não sério: aumenta a tributação da pessoa física, reduz, mas de forma não devidamente proporcional, a da pessoa jurídica e, “de passagem”, aproveita-se para retirar a dedutibilidade do juro sobre o capital próprio. Mas no nosso não existe esse risco.


*Eliseu Martins ([email protected]) é professor emérito da FEA-USP e da FEA/RP-USP, consultor e parecerista na área contábil


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