Transição para a economia de baixo carbono é urgente 
Mudanças climáticas evidenciam riscos relevantes para a estabilidade financeira
Ilustração de Caroline Dihl Prolo

Caroline Dihl Prolo*/ Ilustração: Rodrigo Auada

Em dezembro de 2015, a comunidade internacional aclamou um tratado com abrangência universal para o combate ao aquecimento global: o Acordo de Paris da ONU sobre mudanças climáticas. Hoje 182 países têm o compromisso de promover esforços internos para limitar suas emissões de gases de efeito estufa a fim de evitar que o aumento de temperatura da Terra chegue a 2°C — compromissos chamados contribuições nacionalmente determinadas (NDCs, na sigla em inglês).  

No entanto, segundo o Climate Action Tracker1, esses esforços não são suficientes: se cumpridas todas as NDCs, a temperatura deve aumentar 3,2°C. No início de outubro, o painel de cientistas da ONU para mudanças climáticas, o IPCC2, emitiu um alarmante relatório que conclui que é preciso se esforçar ainda mais: o aumento de temperatura não pode exceder 1,5°C.  

Esse cenário requer mudanças rápidas e amplas na transição para a economia de baixo carbono, e os atores do mercado financeiro estão cada vez mais conscientes dessa urgência.  

Para o Financial Stability Board (FSB), criado em 2009 pelo G20, as mudanças climáticas representam riscos relevantes para a estabilidade do mercado financeiro. Os motivos parecem óbvios: a mudança do clima afeta a viabilidade dos negócios e a movimentação do capital financeiro na medida em que prejudica as disponibilidades hídrica e de recursos naturais, a resiliência da infraestrutura, a fertilidade do solo, a saúde humana, além de contribuir para a ocorrência de fenômenos extremos como ciclones e tufões.  

Diante disso, em 2015, o FSB criou uma força-tarefa encarregada de desenvolver guidelines para a divulgação voluntária e consistente de informações financeiras relativas a mudanças climáticas, para que investidores, bancos e seguradoras possam melhor entender os riscos. A Task-Force on Climate-Related Financial Disclosures (TCFD) lançou suas recomendações em junho de 2017.  

Dos bancos mundiais, 11 — incluindo os brasileiros Bradesco e Itaú —anunciaram compromisso de desenvolver ferramentas para avaliar e divulgar riscos e oportunidades relacionados à mudança do clima. O holandês ING foi o primeiro a anunciar que vai passar a analisar seu portfólio, de 600 bilhões de dólares, considerando riscos e oportunidades do clima. 

A TCFD trata por exemplo de “riscos de transição”, que são aqueles inerentes à transição para a economia de baixo carbono, inclusive os riscos legais de taxação, precificação do carbono e litígios, que causam impactos financeiros aos negócios.  

Por outro lado, recomenda avaliar as oportunidades que podem ser criadas com a transição para a economia de baixo carbono. Segundo estudo recente da Global Commission on the Economy and Climate, o desenvolvimento de baixo carbono pode gerar em torno de 26 trilhões de dólares em benefícios econômicos até 2030.  

No plano internacional, as companhias que captam recursos no mercado de capitais estão sendo chamadas a divulgar riscos relacionados às mudanças climáticas. Desde que o Bank of England endossou o relatório Unburnable Carbon, em 2014, cresceu a preocupação do mercado para a possibilidade de combustíveis fósseis se tornarem ativos “encalhados”, cuja utilização será progressivamente limitada pelas políticas de mudanças climáticas. Na Califórnia, em setembro deste ano foi aprovada uma lei para que grandes fundos de pensão divulguem os riscos de mudanças climáticas relacionados a seus portfólios. No Reino Unido, o Bank of England determinou que conselhos de bancos e seguradoras designem um executivo sênior para gerenciar e reportar riscos de mudanças climáticas. Além disso, fundos de pensão foram notificados pela Client Earth para prestar esclarecimentos sobre divulgação de riscos de mudanças climáticas em suas demonstrações financeiras sob pena de violação do seu dever fiduciário. 

Um exemplo de repercussão litigiosa pode ser visto nos EUA com a recente ação judicial proposta pelo estado de Nova York contra a Exxon Mobil, acusada de promover um esquema para enganar investidores, analistas e underwriters sobre a gestão da companhia quanto aos riscos da regulação de mudanças climáticas. A empresa teria omitido informações sobre os impactos financeiros em um cenário de precificação de carbono em seus negócios. 

No Brasil, a Instrução 586/17 da CVM passou a exigir das companhias informações mais detalhadas a respeito da consideração, em sua estratégia de negócio dos “impactos das atividades da companhia na sociedade e no meio ambiente, visando a perenidade da companhia e a criação de valor de longo prazo”, no modelo “comply or explain”. Mais recentemente, a Resolução CMN 4.661/2018 foi também um passo interessante no caminho da divulgação desses riscos. Embora não incorpore explicitamente a análise de riscos de mudanças climáticas, a norma prevê que as entidades fechadas de previdência complementar (EFPCs) devem, na aplicação dos recursos que administram, considerar a análise de riscos “dos aspectos relacionados à sustentabilidade econômica, ambiental, social e de governança dos investimentos”.  

Nota-se que a incorporação das recomendações da TCFD e das considerações de mudanças climáticas pelos agentes de mercado em geral é tendência inevitável e já vem acontecendo em um ritmo acelerado. Se, de um lado, existem efetivamente riscos relacionados à transição para a economia de baixo carbono que devem ser divulgados ao mercado, por outro há um universo imenso de oportunidades de negócios relacionados à economia de baixo carbono também a serem identificados e mais bem capitalizados, para benefício de toda a sociedade. 


*Caroline Dihl Prolo ([email protected]) é advogada head da área ambiental do Stocche Forbes. Colaborou Julia Franco ([email protected]), advogada da área de mercado de capitais do mesmo escritório. 

novembro 2017 

Intergovernmental Panel on Climate Change 


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