Há mais de uma década, Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e Banco Central (BC) reivindicam para si a competência de analisar implicações concorrenciais de fusões e aquisições entre instituições financeiras. O Cade argumenta que os processos em seu domínio alcançam todas “as pessoas físicas e jurídicas, de direito público ou privado, bem como […] quaisquer associações de entidades ou pessoas, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente, com ou sem personalidade jurídica, mesmo que exerçam atividade sob regime de monopólio legal”. A regra estava no artigo 15 da revogada Lei 8.884, de 1994, e foi reproduzida no artigo 31 da 12.529, que a sucedeu em 2011. Ambas dispõem sobre prevenção e repressão aos delitos contra a ordem econômica.
Já o BC escora-se na tese de que a Lei 4.595, publicada em 1964 para estruturar e disciplinar o Sistema Financeiro Nacional, teria sido recepcionada pela Constituição Federal de 1988 como lei complementar. Com isso, seu artigo 18 — segundo o qual cabe ao BC regular “as condições de concorrência entre instituições financeiras, coibindo-lhes os abusos com a aplicação de pena” — prevaleceria sobre a legislação concorrencial ordinária.
O imbróglio até hoje não foi resolvido, embora tenha mobilizado instâncias de todos os poderes da República: a própria Presidência, a Advocacia-Geral da União, o Supremo Tribunal Federal, o Supremo Tribunal de Justiça e o Congresso Nacional. Neste último, tramita projeto de lei (PL) complementar que, salomonicamente, confere ao BC a prerrogativa de analisar as operações entre bancos sob a perspectiva da saúde e da segurança do Sistema Financeiro Nacional. Ao Cade, o PL reserva o poder de examinar as respectivas implicações concorrenciais propriamente ditas.
Três fatos são relevantes, nesse contexto. As instituições financeiras estão sujeitas ao escrutínio das autoridades de defesa da concorrência na imensa maioria das economias desenvolvidas. Em discurso proferido em 6 de fevereiro na University College London, Joaquín Almunía, vice-presidente da Comissão Europeia, afirmou que a política de defesa da concorrência é ferramenta indispensável para manter a credibilidade do sistema financeiro.
Por outro lado, não existem dados públicos a respeito de análises realizadas pelo BC sobre efeitos concorrenciais de fusões e aquisições no setor financeiro. Esse obscurantismo permite supor que a instituição não vem exercendo a competência pela qual luta com tanto apego.
Já o Cade é considerado uma das melhores agências de defesa da concorrência do mundo, conforme a revista especializada Global Competition Review. As mudanças legislativas recentemente implementadas no Brasil, entre as quais a instituição de um regime de análise prévia de atos de concentração, conferiram à autarquia quatro estrelas, entre cinco possíveis, no ranking do periódico. No mundo, somente as agências dos Estados Unidos, da França, da Alemanha, da União Europeia, do Japão e da Inglaterra receberam nota melhor.
Diante dessas considerações, a pergunta que não pode deixar de ser formulada é: a quem interessa impedir que o Cade examine fusões e aquisições no setor financeiro? Certamente não à sociedade brasileira.
Para continuar lendo, cadastre-se!
E ganhe acesso gratuito
a 3 conteúdos mensalmente.
Ou assine a partir de R$ 34,40/mês!
Você terá acesso permanente
e ilimitado ao portal, além de descontos
especiais em cursos e webinars.
User Login!
Você atingiu o limite de {{limit_online}} matérias gratuitas por mês.
Faça agora uma assinatura e tenha acesso ao melhor conteúdo sobre mercado de capitais
Ja é assinante? Clique aqui