A sociedade brasileira ainda não se deu conta da transcendental importância da autonomia do Banco Central (BC). Cogita-se, normalmente, que esse órgão é parte do Poder Executivo. Inexiste raciocínio mais indigente.
Desde a Revolução Industrial, as nações do hemisfério norte construíram um novo poder — além de Executivo, Legislativo e Judiciário — em suas estruturas: o Poder Monetário, baseado na liberdade dada aos bancos centrais por meio da outorga de mandatos fixos aos dirigentes. Essas casas se tornaram independentes dos governos de ocasião.
A moeda é o único traço de união material entre os habitantes de um país. Todos carregam no bolso a mesma unidade monetária. O Poder Monetário é parte das instituições pétreas de um Estado democrático de direito, tanto quanto o Legislativo e o Judiciário.
Essa foi a concepção original do Banco Central do Brasil, criado em 1964 pela Lei 4.595. O presidente e os diretores tinham mandatos de sete anos, para ultrapassar os quatro da temporada do primeiro mandatário da República. Na “campanha presidencial” para a eleição indireta de Costa e Silva, em 1967, o “candidato” manteve “escritório eleitoral” em Copacabana, onde recebia visitantes e assistia conferências, para melhor se instruir sobre o País. Numa delas, o então presidente da instituição, Dênio Nogueira, fez uma apresentação a respeito da casa que dirigia, ressaltando os mandatos fixos e a autonomia da entidade com relação ao governo. Num regime fortemente autoritário, saiu de lá defenestrado — e a independência do BC também foi jogada pela janela.
A partir de então, o BC foi submetido a uma total subordinação ao Executivo, representado pelo ministro da Fazenda, que indicava seus presidentes. A emissão de moeda passou a ser controlada pelo governo federal. O fim da independência foi determinante para as tristes quadras inflacionárias de 1970 e 1980.
O presidente Fernando Henrique outorgou vasta independência operacional ao BC. À exceção da queda de Gustavo Franco, o órgão permaneceu, durante seus mandatos, apartado de injunções políticas do Executivo. Mas a autonomia não estava alicerçada em princípios de direito ou inscrita na Constituição.
O Brasil viveu dois períodos de sucesso no combate à inflação. O primeiro entre 1964 e 1967, quando foi vencida a espiral deixada pelo governo João Goulart. O segundo, a partir do Plano Real, de 1994. Duas etapas em que o BC teve sua autonomia preservada. Seja de direito, na fase anterior ao desmando de Costa e Silva, seja concedida de fato, nos governos de FHC e Lula. Já na fase Rousseff o desmando é conhecido.
No Brasil há agências federais para regulação de várias atividades econômicas. As diretorias têm mandatos fixos e alternados, o que serve para lhes garantir autonomia. Não faz sentido que a principal delas, justamente a fiadora da estabilidade da moeda brasileira não ostente essas características. Para a consolidação da democracia no País é fundamental blindar juridicamente a independência do BC.
Ney Carvalho é historiador e ex-corretor de valores mobiliários
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