É atribuída a Mário Henrique Simonsen a seguinte tirada sutil: o que só existe no Brasil e não é jabuticaba é besteira.
A doutrina positivista foi uma excrescência política que criou sólidas raízes só em nossa terra. Basta dizer que o positivismo esteve por trás da proclamação da República, dos tempos de Getúlio Vargas e dos governos militares. Todos movimentos vinculados às ideias autoritárias de Auguste Comte (1798-1857), pensador francês criador do positivismo e notório desequilibrado mental.
Ludwig Von Mises, em seu tratado Ação Humana, dizia que Comte se considerava o supremo legislador universal, mas podia ser desculpado, já que era louco, no sentido mesmo com que a patologia emprega esse vocábulo. Mas como desculpar seus seguidores? E eles foram muitos no Brasil.
Dogmático e tirânico em matéria de governo e política, pois pregava uma ditadura esclarecida, por incrível que pareça o positivismo era de corte razoavelmente liberal em economia, pela simples razão que não admitia a regulamentação de qualquer negócio ou profissão — o exercício de todas as atividades devia ser absolutamente livre. Nem mesmo as profissões de caráter científico, ou das quais dependesse a vida humana, podiam ser regulamentadas. O positivismo era de cunho anticorporativo, e isso lhe deve ser creditado.
Para tanto basta examinar o §17 do artigo 71 da Constituição estadual do Rio Grande do Sul, única carta do gênero em todo o mundo, fundada nas ideias de Comte:
“§17 – Nenhuma espécie de trabalho, indústria ou comércio poderá ser proibida pelas autoridades do Estado, não sendo permitido estabelecer leis que regulamentem qualquer profissão ou que obriguem a qualquer trabalho ou indústria…”
Isso valeu severas contendas da classe médica com os governos gaúchos conduzidos pelo positivismo local, até a Revolução de 1930, quando passou a dominar o Brasil, com Getúlio Vargas. No Rio Grande do Sul, qualquer um podia exercer a medicina, mesmo sem nenhuma qualificação, apenas se inscrevendo em uma repartição pública estadual, um “departamento de higiene”, o que era um evidente exagero de interpretação doutrinária.
O dicionário Houaiss define esdrúxulo como “fora dos padrões comuns e que causa espanto ou riso; esquisito, extravagante, excêntrico”. Assim foi o positivismo: esdrúxulo, mas ao mesmo tempo intolerante, tirânico, antinatural e antidemocrático. E só vingou no Brasil, dominando-o por quase todo o século 20. Legou-nos ainda seu modo de pensar autoritário, difuso, muito sutil e pouco visível que permeia, até hoje, toda a ação do poder público no País.
*Ney Carvalho é escritor e historiador
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