Existem hoje no Brasil dois principais mecanismos de financiamento imobiliário: o Sistema Financeiro de Habitação (SFH), criado pela Lei 4.380/64, e o Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), criado pela Lei 9.514/97. Enquanto o SFH se debruça sobre a tarefa de superar o déficit habitacional latente no País, estimulando a produção de moradias destinadas à população de baixa renda, o SFI está voltado para a expansão dos financiamentos por meio do mercado de capitais, e sua principal fonte de captação de recursos é a emissão de certificados de recebíveis imobiliários (CRIs).
As operações no SFH estão limitadas a certos valores de avaliação individual dos imóveis. Por exemplo, o teto é de 950 mil reais em Minas Gerais, no Rio de Janeiro e em São Paulo — estados para os quais as entidades do setor já reivindicam um aumento para 1,5 milhão de reais. Ao seu turno, como é da natureza do mercado de capitais, não há qualquer limitação de valor para os CRIs e, portanto, para o SFI. Esse tipo de diferença notadamente acentua a complementariedade desses sistemas, uma vez que têm óticas distintas. Entretanto, o fato de tanto SFH quanto SFI usarem as mesmas fontes de recursos tem, de certa forma, desvirtuado seus caminhos.
No caso do SFH, a dinâmica passa diretamente pela implementação de políticas econômicas, instrumentalizadas pelo Banco Central (BC), em especial por intermédio do chamado “depósito compulsório” imposto às instituições financeiras. O depósito compulsório caracteriza-se por alocações obrigatórias em conformidade com as regras estabelecidas pelo BC, as quais, além de promoverem a manutenção de uma reserva bancária que assegura a solvabilidade das instituições financeiras, têm efeitos no quantum de recursos disponíveis para concessão de crédito à sociedade em geral ou para um setor específico.
No universo dessas alocações obrigatórias, 65% dos recursos depositados em cadernetas de poupança devem ser destinados às operações no âmbito do SFH. Nesse contexto, em que pese o fato de esse mecanismo representar a maior fonte de recursos disponíveis para esse sistema, nota-se a iminência de seu esgotamento, em vista da atual e crescente balança negativa entre os depósito e saques da poupança, o que limita sua utilização à luz da necessidade do setor imobiliário.
A resposta natural para essa encruzilhada estaria, em tese, no SFI, que conta com acesso direto e “desbancarizado” à economia popular via mercado de capitais.
No entanto, há uma confusão regulatória entre o SFH e o SFI, uma vez que existe a possibilidade de vinculação dos CRIs para cômputo de 80% dos 65% objetos de direcionamento mandatório da poupança para o SFH. Ou seja, os recursos da própria poupança alimentam os CRIs.
Se, por um lado, essa previsão seria interessante na medida em que ajuda a impulsionar esse segmento do mercado de capitais brasileiro, por outro a aquisição de CRIs por instituições financeiras e sua manutenção nas respectivas carteiras para garantir conformidade com as regras de depósito compulsório do BC inibem a evolução do mercado secundário de venda desses papéis.
Finalmente, considerando as nuances que o mercado de capitais pode oferecer, com livres acordos entre as partes em condições de mercado (taxas, índices e prazos, por exemplo), uma fonte de recursos independente da ingerência governamental direta e, de certa forma, infinita, é evidente que a consolidação do SFI é fundamental para a indústria imobiliária. Para tanto, é premente a necessidade de ajustes regulatórios que possam destravar o impasse narrado neste artigo, para que se estabeleçam os fundamentos da retomada econômica do mercado e seu desenvolvimento sustentável no médio e no longo prazos.
A boa notícia é que a debatida confusão entre os recursos do SFH e SFI possui prazo para terminar. A partir de janeiro de 2019, em razão da edição da Resolução 4.676 do Conselho Monetário Nacional, os recursos da poupança investidos em CRI não mais servirão para o cumprimento da exigibilidade de 65% do depósito compulsório.
*Por Bruno Gagliardi ([email protected]), sócio de NFA Advogados, e Eduardo Solamone ([email protected]), associado do escritório
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