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Sonhando com o concorrente
Para não ficar para trás, empresas da economia tradicional se aproximam dos negócios disruptivos

Muito em breve, quem acessar o site da CVC à procura de hospedagem vai ter, além das ofertas de hotéis convencionais, a opção de escolher o apartamento ou a casa de alguém disposto a alugar o próprio imóvel por temporada. Uma empresa rival do Airbnb, cujo nome ainda não pode ser revelado, vai ajudar a operadora de turismo nessa empreitada. Com isso, a CVC espera não só incrementar seu faturamento com vendas on-line, abalado pela crise, mas também ingressar no seleto grupo dos chamados negócios disruptivos. A companhia está tão confiante na aposta que, no futuro, espera que 50% das ofertas de hospedagem em seu site sejam de imóveis para temporada.

Ilustração: Marco Mancini / Grau 180

Ilustração: Marco Mancini / Grau 180

A novidade está sendo capitaneada pelo diretor de canais on-line da CVC, Alipio Camanzano. Cria do turismo na internet, o executivo ocupava o cargo de diretor-presidente da Decolar no Brasil e há cerca de um ano foi contratado pela CVC com a missão de turbinar as vendas por canais não presenciais. À época, os sites Submarino Viagens e Rextur Advance (de turismo corporativo) tinham sido recém-adquiridos pela operadora. A CVC, que fez seu nome com a venda de pacotes de viagem em lojas físicas, ambicionava ampliar a representatividade dos seus negócios virtuais. A estratégia também se baseava numa demanda dos investidores. Listada na bolsa desde dezembro de 2013, a CVC tem acionistas “antenados e up to date”, na definição de Camanzano. “Alguns acessam nossas plataformas todos os dias para conferir se está tudo em ordem e nos cobram quando há lentidão ou alguma página fora do ar”, relata.

A onda dos negócios disruptivos não passa despercebida pelo investidor — afinal, quando desembarcaram no Brasil, Airbnb e Uber criaram ruidosa concorrência para os negócios tradicionais, nos quais os gestores de recursos estão acostumados a investir. “É obrigação do gestor entender se as companhias investidas estão negligenciando as ameaças dos negócios disruptivos ou acompanhando suas tendências”, destaca Fabio Alperowitch, sócio da Fama Investimentos.

Por enquanto, não há empresas de perfil disruptivo com ações negociadas na bolsa brasileira, e as companhias listadas hoje sofrem mais impacto da crise econômica e dos episódios de corrupção do que da competição gerada pela economia compartilhada. Ainda assim, a decisão de ignorar esse movimento pode ser arriscada. “O maior inimigo do retorno é a concorrência. No Brasil, as empresas têm um alívio nesse sentido, mas até quando?”, pondera Pedro Damasceno, sócio da gestora de recursos Dynamo.

CEO da Movida, braço de aluguel de automóveis da JSL, Renato Franklin não demonstra qualquer sinal de preocupação com o rápido avanço dos negócios disruptivos — e, particularmente, com o fato de que hoje qualquer pessoa pode alugar o próprio automóvel por meio de sites de car sharing. Além de ver com naturalidade a onda da economia compartilhada e até se sentir parte dela — “uma empresa que aluga carros estimula o compartilhamento” —, o executivo confia no diferencial da Movida em relação a esse tipo de serviço: a profissionalização. “Temos o conforto, a comodidade e a segurança que nem sempre esses serviços oferecem”, argumenta.

Melhor unir-se a eles

Mesmo empresas cujos negócios ainda não são diretamente ameaçados pelas tecnologias disruptivas buscam estreitar relacionamento com esse universo. É o caso da Cyrela. Em março deste ano, a construtora firmou uma parceria com a startup Quinto Andar, apelidada de “Uber das imobiliárias”. O site funciona como uma espécie de corretor de imóveis virtual, conectando proprietários e locatários para negociarem diretamente o valor do aluguel. Na parceria, clientes da Cyrela que compraram um imóvel para alugar recebem assistência personalizada da Quinto Andar.

As grandes instituições financeiras brasileiras estão igualmente de olho nas novidades gestadas pelas empresas disruptivas. O Itaú e o Bradesco, por exemplo, têm aceleradoras próprias — Cubo e InovaBra, respectivamente — voltadas ao fomento e à evolução de startups de serviços financeiros, as chamadas fintechs. A aproximação com esse ecossistema tem uma razão. “Os bancos perderam de 15% a 30% de mercado em outros lugares do mundo em razão dos meios digitais”, relata Fernando Freitas, gerente do departamento de inovação do Bradesco. O fato é que, para alguns setores, abraçar ou não as tecnologias disruptivas já não é opcional.

Rupturas enfrentam desafios tributários

As companhias tradicionais interessadas em ter um braço disruptivo precisam estar atentas a alguns complicadores que rondam o universo das empresas da nova economia. Um deles diz respeito à cobrança de impostos. O aplicativo 99 (antes chamado de 99 Táxis), por exemplo, está no Brasil desde 2012, mas até hoje enfrenta uma crise de identidade a respeito de seu objeto social para fins tributários. Embora a companhia se defina como uma intermediadora de serviços, que conecta taxistas e motoristas de carros aos seus clientes, a 99 é obrigada a pagar imposto de operadora de transporte. Além disso, precisa repassar à prefeitura de São Paulo o valor, cobrado na fatura do cliente, de R$ 0,10 por quilômetro rodado — regra válida para qualquer aplicativo de táxi e transporte compartilhado.

A grande inquietação da empresa no momento, contudo, é a possibilidade de precisar recolher ISS (imposto sobre serviços) em cada uma das 300 cidades em que o aplicativo é utilizado. A 99 recolhe o imposto no município em que tem sede física, mas algumas prefeituras também pressionam pelo pagamento do tributo. “Pagamos tributos sobre os serviços que prestamos com alíquota máxima. A questão é como poderíamos emitir nota fiscal em mais de 200 municípios. Nem todas as cidades são relevantes, do ponto de vista do mercado, para tamanho esforço de recolhimento de ISS”, observa Matheus Moraes, diretor jurídico da 99.

Os dilemas são os mesmos da recém-chegada Cabify, outro aplicativo de transporte compartilhado, que por ora opera em três cidades do País (São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre). Cada uma delas possui uma regulamentação própria para os aplicativos de transporte. “Buscamos atuar em mercados já regulados, nos quais temos certeza de que seremos bem-vindos”, afirma Rogério Guimarães, head of excelence da Cabify no Brasil. A falta de uma regulação única, entretanto, dificulta o planejamento para novos investimentos e, do ponto de vista tributário, deixa essas empresas em situação de grande insegurança jurídica. “Não saber qual tributo pagar e para quem pagar é correr o risco de receber uma multa milionária lá na frente e colocar todo o negócio em risco”, observa Jerry Levers, sócio do escritório Tozzini Freire Advogados, especialista em direito tributário.

Aplicativos como Spotify e Netflix também podem vir a ter que pagar ISS. Um projeto de lei, já aprovado na Câmara, mas que ainda precisa receber aval no Senado, propõe a cobrança de ISS de plataformas que disponibilizam conteúdo por streaming. Para a advogada especialista em direito digital Renata Ciampi, sócia do escritório Motta Fernandes Rocha, a proposta, contida no PL 366/13, é inconstitucional. “Esses aplicativos não oferecem um serviço. Eles apenas disponibilizam um conteúdo”, afirma. Sócia da área de tributação internacional da PwC, Michela Chin resume o problema: na esfera digital, há a dificuldade em se identificar o fato gerador do imposto. “A economia digital cresce tão rápido que os governos ainda estão tentando analisar os seus impactos”, afirma.

(M.D.)


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