Rumo à governança
Novo Código Brasileiro completa o direito societário

Em 1962, decretou-se que as normas do direito societário resultavam tão somente numa “companhia vazia”, uma forma jurídica carente de conteúdo adequado para organização dos diversos interesses potencialmente conflitantes no seio das sociedades¹. Anos depois, estudiosos de finanças sustentaram a tese de que a sociedade anônima, conforme desenhada pelo direito societário, não passava de uma “caixa vazia”, uma “ficção jurídica que serve como um nexo para relações contratuais”².

Nessa época começa a generalizar-se o emprego da locução corporate governance como designação para “o sistema operacional da companhia”3. Governança corporativa surge como o complexo processo de fluxo de informações, de tomada de decisão, de efetivação das decisões e de seu monitoramento pelos diversos interessados na sociedade.

Assim, teve início a marcha de transformação do direito societário em direção à governança corporativa. Normas jurídicas societárias são apenas a moldura a ser preenchida com o conteúdo do sistema de tomada de decisão de cada organização, com inputs das diversas instituições e dos vários agentes de mercado externos à companhia.

O advento do Código Brasileiro de Governança Corporativa – Companhias Abertas, iniciativa do Grupo de Trabalho Interagentes (GT Interagentes) — formado por diversas entidades de mercado, com participação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) — é um importante passo nesse processo de migração para um sistema de governança corporativa no País.

Pautado no modelo internacional de “aplique ou explique”, no qual as companhias incorporam a prática de governança recomendada ou explicam as razões para não a adotar, o Código é dividido em cinco capítulos — cada um composto de “princípios”, “fundamentos” e “práticas recomendadas”. Os princípios estabelecem condutas que traduzem a essência dos valores refletidos no Código; os fundamentos embasam e explicam os princípios; as práticas recomendadas são as regras de conduta derivadas dos princípios.

Dentre as práticas recomendadas destacam-se a necessidade de tratamento equitativo dos acionistas em caso de mudança de controle, pelo menos um terço de membros independentes no conselho de administração e adoção de política de indicação com o perfil exigido para os administradores. Também são recomendadas emissão apenas de ações ordinárias, proibição de vinculação dos administradores aos acordos de acionistas, instalação de comitê de auditoria estatutário, implantação de auditoria interna vinculada diretamente ao conselho de administração, avaliação anual dos administradores e adoção de política de gerenciamento de riscos adequada.

Espera-se que o Código seja um catalisador da migração do direito societário para um sistema mais complexo e dinâmico. Contudo, ressalte-se que a governança corporativa é uma via dependente (path dependent) das decisões passadas e das condições econômicas, culturais, sociais, políticas e geográficas. Por isso, as potenciais mudanças propostas pelo Código podem ser difíceis e custosas, descoordenando momentaneamente a dinâmica do sistema.

Ainda que as coisas pareçam piorar de imediato, espera-se que, no longo prazo, o Código gere valor para os acionistas e stakeholders por meio do aprimoramento das práticas decisórias das companhias.


¹ MANNING, Bayless. The Shareholders’ Appraisal Remedy: An Essay for Frank Coker, Yale Law Journal, v. 72, n. 37, 1962.
² JENSEN, Michael C.; MECKLING, William H. Theory of the Firm: Managerial Behavior, Agency Costs and Ownership Structure, Journal of Financial Economics (JFE), v. 3, n. 4, 1976.
³ GILSON, Ronald J. From Corporate Law to Corporate Governance, 2016. Disponível em: https://ssrn.com/abstract=2819128.


*Fabiano Marques Milani ([email protected]), Alessandra Zequi ([email protected]) e Ricardo Peres Freoa ([email protected]) são advogados de Stocche Forbes Advogados

 

, Rumo à governança, Capital Aberto

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