No último dia 20 de fevereiro, o colegiado da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) analisou um recurso apresentado pela Usiminas contra decisão proferida pela Superintendência de Relações com Empresas (SEP). O processo¹ teve início a partir de uma reclamação apresentada por um acionista relevante de uma companhia aberta que discutia a possibilidade de substituição de conselheiro eleito por voto múltiplo por suplentes em caso de vacância do cargo.
Os membros do conselho de administração da companhia foram eleitos por voto múltiplo na assembleia geral ordinária (AGO) de 2016. Depois da eleição, no entanto, dois assentos ficaram vagos em decorrência do falecimento de um conselheiro e da renúncia de outro. Como o estatuto social da companhia não previa a possibilidade de substituição de membros titulares por suplentes em caso de vacância — mas apenas nas situações de ausência temporária ou impedimento —, o conselho de administração elegeu membros substitutos temporários e estabeleceu que o mandato de todos os conselheiros eleitos por voto múltiplo se encerraria na assembleia geral seguinte, nos termos dos artigos 141, §3º e 150 da Lei das S.As.
Com efeito, na convocação da AGO de 2017 — a primeira assembleia após a vacância dos cargos —, a companhia incluiu na pauta a eleição de novos membros do conselho de administração para substituir todos os conselheiros eleitos por voto múltiplo.
Em reclamação à CVM, o acionista pediu a suspensão dessa segunda eleição, alegando, em resumo, que: apenas vacâncias decorrentes de destituição pela assembleia geral ou ausência de suplentes ensejariam a substituição de todos os conselheiros eleitos por voto múltiplo; e nenhuma eleição deveria ser feita caso houvesse suplentes para substituir os membros titulares em caso de vacância.
Às vésperas da data da AGO de 2017, a SEP acolheu os argumentos do acionista, afirmando que os cargos vagos no conselho de administração deveriam ter sido preenchidos pelos respectivos suplentes e que não deveria haver nova eleição para todos os assentos oriundos do voto múltiplo.
Em recurso ao colegiado, a companhia defendeu que, embora considere a possibilidade, a Lei das S.As. não exige que as companhias tenham membros suplentes no conselho de administração nem regula os casos em que os membros suplentes podem substituir membros titulares — assim, caberia unicamente ao estatuto social de cada companhia estabelecer regras para substituição de membros titulares por suplentes. Como o estatuto previa a atuação dos suplentes apenas nas situações de ausência temporária ou impedimento do titular (não para vacância), não seria possível que suplentes assumissem cargos vagos nessas hipóteses, devendo ser convocada assembleia para se eleger novos conselheiros.
O diretor relator Pablo Renteria destacou que o procedimento correto para a substituição de conselheiros em casos similares deve ter duas etapas. Primeiramente, mediante a vacância do cargo, vale a regra geral do artigo 150 da Lei das S.As., que estabelece a norma transitória de que o próprio conselho deverá eleger um membro substituto, com mandato até a assembleia geral seguinte. Essa regra se aplica inclusive no caso de eleição por voto múltiplo, pois o artigo 141 da Lei das S.As., que trata da eleição e substituição de conselheiros por esse mecanismo, não disciplina como se dará a substituição temporária; aplica-se, portanto, a regra geral do artigo 150.
A segunda etapa é a substituição definitiva. Embora possa haver um aparente conflito entre artigos, o artigo 141, § 3º da lei societária, por ser norma específica, deve ser aplicado em vez da regra geral do artigo 150. Logo, na primeira assembleia geral após a vacância, os acionistas devem eleger novos conselheiros para substituir todos os conselheiros previamente eleitos por voto múltiplo (a não apenas para os cargos vagos).
Segundo Renteria, a única situação que dispensaria a realização de novas eleições no caso de vacância estaria configurada se, cumulativamente, o estatuto social da companhia permitisse a substituição do membro efetivo pelo suplente em caso de vacância (que não era o caso) e o suplente tivesse sido indicado em voto múltiplo pelo mesmo grupo de acionistas que indicou o conselheiro titular.
Renteria, então, concluiu que o procedimento adotado pela companhia era adequado, e foi acompanhado pelos demais membros do colegiado.
Podem-se extrair do caso as seguintes observações:
— É facultada às companhias a previsão de suplentes para o conselho de administração. Mas, mas se o fizerem, deverão determinar com precisão suas atribuições.
— Em qualquer caso de vacância, mesmo que a eleição tenha ocorrido por voto múltiplo, cabe ao conselho nomear um substituto, que permanecerá até a assembleia geral subsequente, a não ser que exista regra específica no estatuto.
— Na hipótese de eleição por voto múltiplo, havendo vacância de um cargo, todos os conselheiros eleitos dessa forma terão mandato apenas até a próxima assembleia geral, que nomeará novos membros — salvo se houver suplente eleito pelo mesmo grupo que elegeu o titular e com atribuição clara de assumir o cargo na situação de vacância.
*Por João Marcelo G. Pacheco ([email protected]), sócio de Pinheiro Neto Advogados; Cauê Rezende Myanaki ([email protected]) e Antonio Siqueira Filho ([email protected]), respectivamente associado sênior e associado júnior do escritório.
¹nº 19957.03252/2017-76
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