A paranoia do compliance
Multinacionais têm preocupação kafkiana com possíveis fraudes na filial brasileira

Barry WolfeHá algo em comum, hoje em dia, nos desejos de certos grupos que formam a comunidade de negócios. Gestores corporativos, investidores e acionistas, representantes governamentais, mídia, consumidores, sindicatos e Justiça, entre outras tribos tantas, querem controle. Controle sobre tudo o que se refere à vida de uma empresa. Eis aí uma boa explicação de por que os agentes do mercado tanto pedem por compliance: é que ele se tornou sinônimos de controle.

Medidas de compliance são de fato fundamentais. Boa parte de minha atividade nas empresas é ajudar a levá-las o mais próximo possível do nirvana do compliance, aquele local ideal onde os malfeitos corporativos (roubos, suborno, quadrilhas internas e outros desvios éticos) inexistem por terem sido antecipados e evitados.

Mas há uma grande diferença entre compliance e a paranoia do compliance. Essa doença psicocorporativa tem contaminado, com certa predileção, multinacionais do exterior com braços aqui. Para mostrar como isso se dá, vou inventar uma empresa imaginária cujo diretor financeiro, de seu escritório em algum país da Europa, tenta entender o que se passa na operação Brasil.

Esse sério homem é bombardeado com informações e mitos, em proporções variadas, todo santo dia ao acompanhar com a pressa habitual as notícias da subsidiária brasileira. O que ele lê, ouve ou percebe é que o País é “corrupto como sempre”. Para não correr riscos, ele aperta os parafusos de controle que tem sobre a turma de gestão local.

Mas, como se sabe, a paranoia é autoalimentada: mesmo que desvios ou subornos não se verifiquem nos cada vez mais detalhados relatórios, crê-se razoável que algo possa estar ocorrendo. Afinal, se o ambiente é tão ruim e nada ruim há nos informes, isso só pode ser mau sinal. Assim, nosso amigo busca mais dados sobre o Brasil (“corrupt as usual”), aperta o apertado controle e talvez leve a “iminente crise” ao board — justo no dia em que um concorrente foi flagrado em ilícito dos grandes. Pronto, diz o agora aterrorizado CFO, temos o que temer. É preciso mais controle, mais compliance, é preciso pegar os culpados — do que mesmo? — e corrigir a situação. Que situação? Aquela que não está nos relatórios, que devem estar errados.

Soa como Franz Kafka? Pois, não duvide, algo similar vem ocorrendo em mais empresas do que sonha nossa vã imaginação. Talvez não com tintas tão fortes, mas de alguma maneira igualmente paralisante e sem sentido.

Um problema “inexplicável” na filial brasileira pode gerar verdadeiro pânico lá fora. Não é difícil haver esse tipo de problema por aqui. Corrupção endêmica, autoridades contrárias aos interesses de empresas vitimadas por falcatruas, Lei de Gerson, crime organizado… Pior: e quando de fato a diretoria no Brasil está envolvida em fraude? São coisas realmente difíceis de explicar. Sem explicação, o que era convite à paranoia nela se transforma. Tenho agido para ajudar empresas em circunstâncias embaraçosas frente a suas matrizes a partir de três pontos básicos que podem ser um bom início a quem anda envolvido nesse tipo de situação surreal.

O primeiro é uma investigação exaustiva da real situação da subsidiária, o que de imediato tranquiliza as diretorias no exterior. O segundo é usar as informações coletadas na investigação para suportar as atividades de compliance até o nível mais alto possível — sim, do chão de fábrica até o CEO. Por fim, criar políticas reais de controle de condutas impróprias. Por que falo em “reais”? Porque na maior parte das vezes as políticas se baseiam em modelos ideais e importados, impraticáveis segundo a lógica e a cultura brasileiras. E, no que tange a medidas anticorrupção, o que vale é a prática. Sempre.


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