Não – Números nebulosos
Investidor perde a capacidade de entender o que acontece com a empresa em termos econômicos

O advento dos IFRS foi visto nos últimos anos como verdadeira panaceia para melhorar a transparência das nossas empresas. A convergência com parâmetros globais asseguraria a comparabilidade dos balanços aos de suas congêneres estrangeiras, aumentando a atratividade para os investidores e reduzindo o custo de capital para todos. Como benefício adicional, a adoção de práticas nas quais a essência deva prevalecer sobre a forma teria de alguma maneira o condão de tornar os balanços mais próximos da realidade.

O processo de criação dos IFRS foi absolutamente transparente, com longos períodos de consulta pública e maturação. Mas, por uma razão ou por outra, temos hoje a impressão de que os investidores não participaram do processo como poderiam (deveriam?). Agora, ao defrontar-se com balanços fundamentalmente diferentes, começam a se perguntar se foi criado um monstro.

As novas normas de consolidação talvez ofereçam o mais claro exemplo disso. Os usuários das demonstrações financeiras acostumaram-se, no Brasil, ao princípio da consolidação proporcional, pelo qual os demonstrativos consolidados permitiam ver a real exposição econômica da companhia a um grupo de subsidiárias.

A partir da adoção dos pronunciamentos IFRS 10, 11 e 12, em 2013, as empresas passaram a consolidar somente 100% ou 0% de suas coligadas — seguindo o conceito de controle. Em tese, o parâmetro parece plenamente justificável. Mas, de uma hora para outra, retira dos investidores a possibilidade de entender realmente o que está acontecendo com a empresa em termos econômicos. Em outras palavras, em sua essência. As diferenças são registradas em linhas como equivalência patrimonial e participações de acionistas minoritários, as quais são destituídas de informações qualitativas que permitam mensurar, por exemplo, a geração de caixa efetiva.

As empresas de construção civil, e algumas do setor elétrico, sofreram alterações profundas em suas demonstrações — desde o resultado até o nível de endividamento. Em resposta, muitas delas passaram a anunciar números pró-forma, não auditados, tanto para os investidores externos como em suas análises internas. Sem dúvida, um passo atrás.

Um sinal de que a norma tem problemas são as transações societárias, como fusões e aquisições, estruturadas de determinada maneira em função do seu tratamento contábil. Recentemente, o novo controlador de uma empresa de energia fez questão de manter sua participação abaixo do que poderia ser chamado de “controle”, para que não precisasse consolidar as dívidas da nova subsidiária.

As normas de consolidação não estão sozinhas nos desafios surgidos com os IFRS. Veja-se a adoção da contabilidade de hedge. Empresas endividadas em moeda estrangeira julgaram-se no direito de “compensar” a dívida com as exportações, ignorando as importações. A perda dupla com a desvalorização, na dívida e nas importações líquidas, não sai no resultado. E a leitura fria do CPC 38 chega a permitir uma manobra como essa. Onde está o princípio da essência?

Outro problema dos IFRS é o enorme poder discricionário dado às administrações para fazer julgamentos. Em muitos casos, premissas podem ser “calibradas” para atender a objetivos específicos da gestão. Os investidores passam a enxergar números que não necessariamente espelham a realidade.

As normas de consolidação pioraram a transparência das empresas com muitas controladas. Mas o debate não deve se restringir a elas, e sim aos impactos de todo o arcabouço dos IFRS.


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